The Town vira cidade do trap com público renovado no seu primeiro dia de shows em SP
Por Felipe Maia/Folha Press em 07/09/2025 às 16:36
Na sua abertura, o The Town virou Trap Town – a cidade do trap. O festival começou com um lineup formado por grandes estrelas do gênero mais popular do hip-hop, reunindo artistas como Travis Scott e Don Toliver a nomes consolidados no país, como Matuê e MC Cabelinho.
O resultado foi uma das plateias mais jovens já vistas pelo festival, com predominância de roupas pretas e rodas de mosh (bate-cabeça). A descrição, que poderia servir a um show de metal, reflete referências como o próprio Scott: os óculos escuros em formato de máscara popularizados por ele eram encontrados em rostos jovens a todo lado no festival.
Tampouco era incomum ver na pista adolescentes acompanhados de seus pais. “A mistura de gerações é legal, é isso que faz o festival”, diz André, que trouxe o filho, Pedro, de 13 anos, ao festival – o garoto veio ao evento para ver Travis Scott e Matuê.
“Eu implorei muito para meu pai vir, e pedi para o Chat GPT fazer uma música para ele me trazer, e assim o convenci”, disse Julia, de 15 anos, que viajou de Guaratinguetá com o pai, Junior, para o festival. “Eu vim para ver o Matuê e o Travis Scott”.
Ao contrário de seu público, contudo, tanto o norte-americano como o brasileiro já não são mais tão jovens. Há cerca de vinte anos que o trap vem ganhando espaço como formato mais popular de se fazer rap no mundo, e sua atual geração vem tentando explorar diferentes estilos, com prosódia e bases que vão além de nomes como Migos e Future.
Ao vivo, é uma conta difícil de fechar para Travis Scott. Seu último álbum, “Jackboys 2”, uma mixtape pouco inspirada com artistas de seu selo, não é a vedete do show. O público no The Town ansiava por ouvir seus já clássicos em sua performance ensandecida – capaz de criar pequenos tremores de terra, como noticiado em alguns de seus shows.
Não houve terremotos dessa vez. Embora tenha entregado seus hits e levado a plateia jovens ao delírio com rodas e sinalizadores, o rapper também se mostrou menos inflamado do que em outras de suas apresentações recentes. Don Toliver, que havia tocado antes, não ficou para trás: o artista teve de interromper seu show por alguns minutos devido à multidão que se apertava frente ao palco.
Já Matuê conseguiu entregar um show arejado explorando sucessos como “É sal”, numa versão reggae que já tinha apresentado no The Town 2023, e novidades de seu último álbum. Cantando para uma plateia lotada no palco The One, ele engajou até o público mais distante – a área ao fundo sofria com som de baixa pressão e atraso.
Mais cedo, MC Cabelinho havia estreado as grandes plateias naquele palco, assim como Felipe Ret no palco Skyline. O carioca, veterano do trap do Rio, pediu liberdade para o cantor Oruam: “MC não é bandido”, disse ao microfone. Ambos investiram em cenografia e bandas, adicionando camadas cada vez mais exploradas por artistas de trap ao vivo.
O palco Quebrada, novidade no festival, recebeu apenas os paulistas MC Hariel e a dupla Tasha & Tracie. Hariel, que vem de lançamento recente e chamou MC Marks ao palco, foi o único representante do funk de São Paulo no festival, uma escolha aquém da produção local, mas justificada pela engenhosidade que o artista dá ao funk ao vivo.
A rapper Budah também se destacou ao trazer sua proposta de rap com R&B com performance de qualidade, ainda que a plateia fosse diminuta. O público também era pouco numeroso no SP Square, o palco de jazz, que recebeu a pianista canadense Stacey Ryan e o trombonista brasileiro Joabe Reis.
O artista sofreu com a concorrência do palco The One durante seu show. Por ali se apresentava Lauryn Hill. Um dos pontos fora da curva do dia do trap, a artista entregou uma dose de sucessos dos anos 90 para o público – talvez um alento para pais que foram jovens naquela década.
Outra exceção foi o Burna Boy. O nigeriano, um dos principais nomes da música moderna africana, trouxe banda e balé para o palco e apresentou seu afrobeats de arena para um público difícil – a maioria esperava o principal nome da noite. Se não dobrou a plateia, o artista tampouco se deixou intimidar e entregou um dos melhores shows da noite.
Prejudicados pelo palco escondido e horário ingrato – ao fim do show de Travis Scott – os DJs GBR e Victor Lou conseguiram levar uma boa amostra da sua mescla de funk de arena e desande, cujas batidas graves ganhavam destaque num autódromo que se esvaziava aos poucos ao fim do dia.
Na saída, o trânsito de pessoas pelo espaço do Autódromo era tão complicado quanto o que foi observado em 2023. A falta de sinalização travava a locomoção. O encerramento contrastou com a maior parte do evento. “Esse ano me surpreendeu porque o banheiro é acessível, tem várias plataformas de visualização do palco, enfim, acho que eles acertaram na acessibilidade”, diz Frederico, jovem cadeirante e fã de Travis Scott.
Os estandes publicitários ainda ocupam parte considerável da área hábil para o público, assim como no primeiro The Town, mas o dia da estreia da segunda edição do festival será mais lembrado pelas performances de grandes nomes do trap – certamente uma memória marcante para muitos de seus jovens fãs.