Temporal na Baixada mata ao menos 18 e deixa 30 desaparecidos; Saiba quem são as vítimas

Por #Santaportal e Estadão Conteúdo em 03/03/2020 às 11:24

TRAGÉDIA – Os números não param de subir. A Defesa Civil do Estado e o Corpo de Bombeiros informam que as fortes chuvas que incidiram sobre a região da Baixada Santista nesta madrugada provocaram, até o momento, 18 óbitos e 30 desaparecidos, nos seguintes municípios: Guarujá (15 óbitos e 22 desaparecidos), Santos (2 óbitos e 6 desaparecidos) e São Vicente (1 óbito e 2 desaparecidos). O número de desabrigados é 156 no Guarujá e 7 em São Vicente; já os desalojados computados são 11, em São Vicente.

Os bombeiros encerram as buscas por volta das 19h30 nesta terça-feira (3). Segundo a corporação, as condições de segurança e visibilidade não eran as ideais para a continuação dos trabalhos. As buscas serão retomadas a partir das 7h desta quarta-feira (4).

Ainda de acordo com os bombeiros, o número de desaparecidos não indica necessariamente que estas pessoas estejam nos escombros.
Já foram disponibilizadas 12,5 toneladas de materiais de ajuda humanitária (colchões, cobertores, cestas básicas, água sanitária e água potável) aos municípios afetados. Tais materiais permanecerão armazenados no depósito do Fundo Social de Santos e serão distribuídos mediante solicitação das defesas civis municipais.

O Coordenador Estadual de Proteção e Defesa Civil, Coronel PM Walter Nyakas Junior, permanece na região, em reuniões com o Gabinete de Crise, avaliando as necessidades e a atuação das equipes de salvamento.

Dados do Núcleo de Gerenciamento de Emergência da Defesa Civil do Estado indicam que, até as 4h da manhã dessa terça (3), o acumulado nas últimas 12 horas de chuvas no Guarujá foi de 282 mm, em Santos de 218 mm, em Praia Grande 170 mm, São Vicente 169 mm, Mongaguá 160 mm, Cubatão 132 mm e tanto Itanhaém como Bertioga o acumulado foi de 110 mm.

Ao longo da quarta-feira (4), mesmo a frente fria já estando bem afastada do Estado de São Paulo, um sistema de baixa pressão no oceano lançará umidade em direção ao continente que, somada com a umidade da Amazônia, provocará chuva fraca até moderada em pontos isolados da Baixada Santista. Essa precipitação será em forma de pancadas com momentos mais persistentes, que elevarão ainda mais os acumulados de chuva na região. Por causa do solo já estar completamente encharcado, o risco de transtornos continua elevado.

Saiba quem são as vítimas  
Em entrevista à Rádio Eldorado, o coronel Endel Ricardo Pereira, diretor de operações da Defesa Civil estadual, confirmou que entre as vítimas estão dois agentes do Corpo de Bombeiros. Eles participavam de uma operação de resgate no Morro do Macaco Molhado, no Guarujá, e foram atingidos por um novo deslizamento, que deixou um deles morto, enquanto o outro continua soterrado.

Os cabos Rogério de Moraes Santos (primeira foto abaixo) e Marciel de Souza Batalha (segunda foto abaixo) são os dois oficiais mortos. Durante o resgate, a equipe foi surpreendida por outro desabamento. Eles tentavam encontrar uma mãe com o bebê. Tathiana Lopes de Lima Gomes, de 25 anos, e o seu filho Arthur Rafael de Lima, de apenas 10 meses, também foram encontrados mortos.

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Divulgação/Corpo dos Bombeiros

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Reprodução

Além disso, um idoso morreu após o chão de um cômodo ceder em uma clínica de repouso  na Vila Valença, em São Vicente. Moisés Elias Neto, de 86 anos, veio a óbito durante o temporal que atingiu a Baixada Santista na última noite.

As outras vítimas fatais dos deslizamentos são: Aliffer Adailton Granero da Silva (6 anos), Allana Granero de Oliveira (3 anos), Edvaldo José Deolindo (43 anos), Elisandra de Souza Santana Cândido (28 anos), Esther Gabrielly Sousa da Silva (11 anos), Jhenifer Maria de Souza Nunes (25 anos), Kátia de Oliveira Paulo (37 anos), Laudemir Cilas Tiburcio (60 anos) e Samuel Alves do Santos (32 anos).

Depoimentos 
O ajudante de pedreiro Luciano Martins de Oliveira, conhecido como Aranha, de 59 anos, estava dormindo em casa no momento do deslizamento, por volta da 1h30, no Morro do Macaco Molhado. Ele chegou a ficar soterrado até o umbigo e foi resgatado por vizinhos e bombeiros. “Achei que iria perder metade do corpo. Me ajudaram a sair pela janela”.

No início da tarde, mesmo com a chuva, ele estava nas proximidades da casa, preocupado em conseguir os documentos, mas a habitação de madeira, em que vivia há 6 anos, desmoronou. “Não tenho lugar para ir. Perdi tudo, estou só com a roupa do corpo mesmo.” Luciano não quer mais ficar no Morro do Macaco Molhado. “Dá medo, essa chuva não para”, diz. “Mas o importante é estar vivo”, acrescenta.

“Veio aquela água, aquela lama correndo um monte, parecia aquilo que teve em Minas. Como era o nome mesmo daquele lugar?”, disse, referindo-se a Brumadinho, onde o rompimento de uma barragem deixou ao menos 270 mortos. Como ainda chove na região, o Corpo de Bombeiros pediu para moradores e jornalistas se afastarem do local de um dos desmoronamentos. Nas ruas da parte mais baixa, a população usa enxadas, carrinhos de mão e outros equipamentos para retirar a lama avermelhada.

Os moradores estão tentando ajudar os bombeiros na retirada de escombros e localização de desaparecidos. “Não estava em casa, cheguei depois. Estava feio, uma escuridão, não tinha o que fazer. Todo mundo conhece o outro aqui. Foi difícil, porque perdemos uma amiga, seu filho e o bombeiro que estava tentando ajudar. Tem gente aqui desde ontem (segunda-feira) ajudando. É muito triste”, disse Fabiano Barbosa, vizinho das vítimas e voluntário.

O cenário no Morro do Macaco é de devastação. Barracos vieram abaixo, móveis e eletrodomésticos estão destruídos, além de muita lama e dificuldade para retirar os escombros na procura por sobreviventes. No alto do morro, os voluntários, enfileirados, ajudam na retirada da lama. Um balde passa de mão em mão até ser despejado em um área isolada. Os bombeiros realizam movimentos minuciosos na tentativa de evitar outros deslizamentos e são avisados pelo som de um apito quando algo de pior pode acontecer.

“Fiquei muito triste quando cheguei lá em cima, porque são pessoas que conheço há muito tempo. Moro aqui há 50 anos. Eu gostaria de ajudar, mas não posso porque sou operado da coluna. Fiquei muito feliz em ver as pessoas ajudando”, ressaltou Gilvan Nunes, morador do Morro do Macaco.

“Tudo tremia na casa”, lembra a dona de casa Bruna da Rocha, de 27 anos, que mora nas proximidades de um dos deslizamentos. “Começou todo mundo a gritar, chorando, pedindo ajuda para eles”, relata. “Moro aqui há 27 anos e nunca vi algo assim na minha vida. É a primeira vê que acontece uma coisa dessas.”

A controladora de acesso Letícia de Carvalho, de 40 anos, teve de deixar a casa com as duas filhas, de 9 e 15 anos. “Vamos para a casa de um amigo que ofereceu moradia. O prefeito não vem ver a situação, só vem para pedir voto.”

Ele mora a poucos metros dos locais de deslizamento. “Escutei gritos do pessoal pedindo socorro. A gente saiu batendo em tudo que é lugar, ligando para resgate, ambulância, polícia, Deus e o mundo.”

Com ajuda de amigos e das filhas, Letícia tirou grande parte dos pertences de casa. “Estamos tirando tudo, roupa, documentos, eletrodoméstico, infelizmente bens materiais que a gente conquistou com tanto suor.”

Desaparecidos no Guarujá
Entre os desaparecidos no Morro do Macaco Molhado está Rafael Rodrigues, de 35 anos, liderança de projetos de capoeira e dança folclórica, que hoje atende cerca de 120 crianças e adolescentes O projeto existe há mais de 20 anos. Segundo amigos, ele mora em um bairro próximo e, ao saber que o deslizamento havia vitimado crianças, resolveu ajudar ainda na madrugada.

“A gente estava se comunicando, eu e o meu irmão. Ficou complicado porque não tinha mais eletricidade”, conta o contramestre do Afroketu, projeto de Rafael, Yago Gonçalves, de 27 anos. “A gente se conhece desde pequeno, treina capoeira desde novo.”

Yago está ajudando na retirada dos escombros e da lama junto com outros integrantes do Afroketu. “Desci pela lama, achei um dos bombeiros (o corpo). Mas o meu irmão, eu tenho fé que vai ficar bem.”

“Tinha muitos alunos nossos que moram por aqui”, explica. “A comunidade é bem unidade nessa parte (de ajudar).”

“A esperança é a última que morre importante, tenho fé sempre. Ele é um cara resistente.”

O ajudante de pedreiro desempregado Felipe Oliveira, de 22 anos, morava em um barraco atingido, junto da esposa, grávida, e da filha de 4 anos. Após perder a moradia, para qual se mudou havia três meses, ele deixou a família com a irmã e voltou ao local dos deslizamentos. “Consegui pegar só umas roupinhas. Desmoronou, caiu tudo em cima de mim. Minha filha ficou presa debaixo da madeira. Um amigo veio e ajudou. Senão, a gente não iria conseguir sair. Depois fomos à luta ajudar todo mundo.”

Ele conhecia pessoas soterradas. “O Rafael era amigo da gente, gente boa. Tão gente boa que foi ajudar quem estava precisando. Ele estava ajudando todos. Era trabalhador.”

Felipe está ajudando a retirar escombros desde a madrugada. “Até terminar tudo, até a hora de parar, vamos dar uma força aí. Faz pensar (estar em área de risco), mas pessoas estão precisando, vamos contar com Deus e com a sorte para continuar os trabalhos”.

Um que voltou para ajudar nos resgates e encontrou familiares mortos foi Luiz Vitor Feitoza. E ele tem parentes também entre os desaparecidos. “Não moro aqui. Vim para ajudar. Já encontraram um tio e uma tia minha mortos. E ainda estão procurando outra tia e mais três primos que estão desaparecidos. Acordei com meu pai me chamando para virmos ajudar.”

Trabalho dos bombeiros
De acordo com o porta-voz do Corpo de Bombeiros, capitão Marcos Palumbo, 15 bombeiros trabalham nos resgates no Guarujá. Todo o trabalho de resgate é feito de forma manual, pois não há condições de utilizar máquinas. Segundo o capitão, há chances de novos deslizamentos.

“O corpo de bombeiros atua principalmente no Guarujá, onde temos 32 pessoas desaparecidas, sendo quatro no Morro do Macaco e 28 na Barreira do João Guarda. As equipes estão fazendo buscas em um terreno muito complicado e com chance de novos deslizamentos”, explicou Palumbo.

As equipes chegaram ainda durante a noite de segunda no Morro do Macaco. A chuva encharcou e desestabilizou o solo, provocando o “escorregamento da encosta, de quase todo o morro”. Bombeiros estimam que cerca de 30 residências foram atingidas. O local ainda representa muito perigo, segundo avaliação do capitão Palumbo.

A operação também usa cães para tentar encontrar pessoas soterradas.

O secretário adjunto de Defesa Civil do Guarujá, Carlos Eduardo Smicelato, estima que o número de vítimas possa chegar a 50 ou, até mesmo, 80 mortos. “Como algumas (moradias) não estão cadastradas, é difícil fazer uma estimativa mais próxima da realidade. Estamos estimando a partir de relatos de moradores próximos, das famílias.”

A Prefeitura está preparando um espaço para receber 200 desabrigados, o que pode ser ampliado para até 400 pessoas se a chuva persistir. “O Guarujá foi a cidade mais impactada, com 280 mm de chuva em 24 horas. Foi uma catástrofe, é imprevisível a gente evitar uma tragédia nessa circunstância.”

Segundo ele, as comunidades mais afetadas são os Morros do Macaco Molhado, do João Guarda, do Engenho e da Baiana. O secretário diz que o Guarujá tinha moradias em área de risco de nível 3, em uma escala que vai até 4.

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Carlos Lopez/Santa Cecília TV

Aluguel Social
O governador João Doria anunciou que irá disponibilizar aluguel social para as pessoas que ficaram desalojadas após fortes chuvas que atingiram a região da Baixada Santista nesta madrugada.

Após sobrevoar as áreas afetadas pelos temporais, ele concedeu entrevista coletiva aos jornalistas no Paço Municipal de Santos, no litoral paulista.

O governador afirmou que as famílias ficarão em abrigos municipais e depois vão receber recursos para o programa aluguel social compartilhado com as prefeituras.

“O Governo participa com 50% do valor e as prefeituras que têm destinação de recursos com os outros 50% para tantos quantos forem necessários para terem acolhimento de abrigo, enquanto recuperam suas casas ou terão outros destinos já que muitas casas são irrecuperáveis”, disse Doria.

Com o risco de novos deslizamentos nos próximos dias, ele afirma que é preciso retirar a população que estão em áreas de risco identificadas. “Orientamos a Defesa Civil, a Polícia Civil, o Corpo de Bombeiros, o Estado e também as forças da Defesa Civil da Baixada Santista para que atuem juntos para a imediata retirada das pessoas que ainda estão sob riscos”.

O governador também pediu a doação de água mineral, colchões novos e itens de higiene pessoal para as famílias afetadas. “A solidariedade daqueles que puderem cooperar. Empresários, comerciantes e pessoas físicas que queiram ajudar”.

Segundo Doria, o levantamento de pessoas desalojadas e desabrigadas está sendo feito gradualmente pela Defesa Civil estadual e municípios afetados.

Em sua conta oficial no Twitter, o governador do Estado de São Paulo, João Doria (PSDB), prestou sua solidariedade às vítimas do temporal. Doria chegou no fim da manhã a Santos para uma reunião de emergência com os prefeitos das cidades atingidas pelas chuvas e sobrevoou a região.

Veja imagens aéreas dos alagamentos na Cidade de Santos, feitas hoje pela manhã:

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