'Podia ter uma eleição a cada 15 dias', diz vendedor de toalhas de Lula e Bolsonaro

Por Leonardo Vieceli e Douglas Gavras/Folha Press em 23/10/2022 às 08:00

Eduardo Anizelli/Folha Press
Eduardo Anizelli/Folha Press

Passava das 10h30 de quarta-feira (19) quando um homem vestido com terno e gravata se aproximou do ponto de venda do ambulante Lucas Bandeira, 28, em uma calçada no centro do Rio de Janeiro.


No local, o pedestre mirava toalhas com as estampas dos rostos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), que disputam o segundo turno das eleições presidenciais.


“Quanto custam?”, perguntou o homem. “R$ 30”, respondeu Bandeira. “Tem sacola?”, emendou o pedestre. “Tem”, disse o vendedor.


A conversa logo evoluiu para um negócio concretizado: o freguês decidiu comprar uma toalha do ex-presidente Lula. “Por mim, podia ter uma eleição a cada 15 dias”, brinca Bandeira, que está vendendo os produtos desde julho.


Na avaliação do trabalhador informal, a disputa vem gerando um bônus -ou uma espécie de “13º, 14º ou 15º salário”. É que a renda obtida com os produtos que remetem a Lula e Bolsonaro complementa as vendas de itens como mantas e redes para descanso.


Em seu ponto de venda, o trabalhador montou um placar em uma lousa de giz, apelidado de “Data Toalha”, em uma brincadeira que faz referência ao Datafolha. A cada peça negociada, a contagem é atualizada.


Até a manhã de quarta, o placar do segundo turno das toalhas indicava 76 para Lula e 42 para Bolsonaro. Desde o início da corrida eleitoral, o número do petista passou de 480, enquanto o de Bolsonaro superou 120.


Bandeira afirma respeitar as preferências políticas de cada comprador. “Eu quero é vender a minha toalha. O cliente sempre tem razão”, relata o trabalhador.

Uma das preocupações dele é com os ânimos exaltados na corrida eleitoral. Para evitar contratempos, Bandeira pendurou junto ao placar das vendas uma mensagem que pede tranquilidade aos pedestres.


“Não se revolte com o placar. Ajude a melhorar! Continuem comprando!”, aponta o cartaz.


A preocupação com os ânimos exaltados não é exclusiva de Bandeira. Há aqueles que evitam dar detalhes sobre a venda de toalhas de Lula e Bolsonaro devido ao receio de perder clientes.


Nascido na Paraíba, Bandeira atua como vendedor há uma década. Com ensino médio completo, ele relata que até procura emprego com carteira assinada, mas enfrenta uma desilusão com as oportunidades disponíveis.


“Isso aqui [trabalho na rua] é um estresse diário. Mas, para sair e pegar um salário mínimo, não vou. Prefiro ficar aqui.”
Ao longo da campanha, além das toalhas, itens como camisetas, bandeiras e bonés dos adversários políticos também ganharam espaço no comércio.


Milena Damasceno, 23, trabalha há quatro anos em uma barraca na rua 25 de Março, em São Paulo. A depender do mês, os destaques no ponto podem ser produtos de Natal, fantasias de Carnaval ou biquínis e sungas.


Desde setembro, as camisetas de seriados de TV e as roupas de frio dividem espaço com produtos mais inusitados, de temática eleitoral.


“Acho que vai dar Lula, viu? Querendo ou não, a nossa clientela é de renda mais baixa, então, para cada 5 bandeiras do Lula, sai 1 do Bolsonaro.”


Na barraca, a toalha custa R$ 25 –ou R$ 20 cada uma, a partir de oito peças– e as vendas se mantiveram aquecidas após a passagem para o segundo turno.


“Alguns bolsonaristas são difíceis de atender –batem na mercadoria [do Lula], soltam um palavrão, falam para queimar–, mas não tenho preferência por nenhum dos dois, só quero vender mesmo.”


Trabalhando na região do Brás, também famosa pelo comércio popular, o vendedor Alejandro Martínez, 23, relata que a procura por lá é invertida: a venda de camisetas de Bolsonaro supera a de Lula.


“A proximidade da Copa com as eleições não atrapalhou, acabamos vendendo de tudo. É como se parte dos clientes tivesse um segundo motivo para comprar uma bandeira do Brasil”, diz.


O proprietário de uma outra barraca, que não quis se identificar, garante que todos são atendidos com respeito. Ele sorri ao oferecer uma bandeira do Brasil a uma cliente, enquanto tira o celular para mostrar à reportagem fotos em manifestações em apoio a Bolsonaro na avenida Paulista. “Nosso presidente.”


“Tem gente que leva para dar de presente ao avô ou para provocar um parente que vota no outro candidato”, diz Gildo Legging, 44, vendedor há 15 anos na 25 de Março. “Para cada 10 camisetas do Lula, vendo 1 do Bolsonaro. Geralmente, as pessoas vêm comprar em grande quantidade.”


A procura por produtos ligados aos políticos ficou forte a partir das eleições de 2018, quando a barraca de Legging passou a ofertar mais opções dessa temática.


Após ter de fechar o ponto por quatro meses, para se preservar e proteger os funcionários durante a pandemia, enquanto esperavam pela vacina, ele se diz otimista com a volta do consumidor ao comércio de rua.

“Além da barraca, consegui montar uma loja aqui na rua. Espero ainda fazer esse trabalho por muito tempo.”
Depois das eleições, com as atenções voltadas para a Copa do Mundo, as bandeiras dos presidenciáveis devem perder espaço para produtos que remetem ao torneio, atraindo uma clientela menos polarizada.


Normalmente, os produtos da Copa seriam vendidos no meio do ano, mas como tudo ficou misturado no fim de 2022, os clientes estão concentrando as compras nesses três meses finais, conta Legging.

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