Policiais militares se contradizem em depoimentos e acusado de tráfico é absolvido
Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 24/01/2025 às 05:00
Os depoimentos de policiais são aptos para validar uma condenação, desde que eles sejam “coerentes” entre si. Com essa ressalva, a juíza Silvana Amneris Rôlo Pereira Borges, da 1ª Vara Criminal de Santos, no litoral de São Paulo, absolveu por insuficiência de prova um entregador por aplicativo acusado de tráfico de drogas.
“Não havendo harmonia entre esses depoimentos, e sendo estes os únicos elementos de prova, não há como subsistir o decreto condenatório”, fundamentou a magistrada. Em alegações finais, o Ministério Público (MP) havia requerido a condenação do réu, sem a aplicação da minorante relativa ao tráfico privilegiado.
Essa causa de diminuição da pena está prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas. Segundo o MP, o acusado não faria jus a ela “pois a qualidade e quantidade do entorpecente, aliadas à apreensão de elevada quantia em dinheiro, fruto da traficância, evidenciam que o acusado se dedica a atividade criminosa”.
Segundo a denúncia, o entregador de aplicativo pilotava uma moto e, ao pressentir que dois policiais militares o abordariam, dispensou uma “sacola” contendo cinco porções de haxixe e uma de maconha, pesando 200 e 2 gramas, respectivamente. Além disso, o acusado portava a quantia R$ 2,8 mil.
A prisão ocorreu no dia 10 de julho de 2024, na Rua Alexandre Martins, em frente a uma praça do conjunto BNH-Aparecida, apontada pelos PMs como ponto de tráfico. Autuado em flagrante, o entregador teve a preventiva decretada na audiência de custódia, mas a sua defesa conseguiu soltá-lo por meio de habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O alvará de soltura foi expedido no dia 26 de agosto. Com a concessão da liberdade provisória, foram impostas ao réu duas medidas cautelares: comparecimento mensal em juízo para informar o exercício de atividades lícitas e proibição de frequentar o local do crime e as suas proximidades.
Negativa e divergências
O acusado se manteve em silêncio na delegacia, mas em juízo negou portar a sacola com drogas que os PMs afirmaram ser sua. Disse não conhecer os policiais, ignorando o porquê deles o incriminarem. Admitiu apenas a posse do dinheiro, alegando ser ele fruto de trabalho na loja de uma tia e também como entregador.
A advogada Isamara Freitas Oliveira destacou em suas alegações finais as “inconsistências substanciais” das versões dos policiais, acrescentando que elas foram conflitantes, inclusive, nas justificativas dadas para a abordagem do seu cliente. “As provas colhidas no inquérito policial, que deram base à denúncia, não foram reproduzidas em juízo”.
A defensora apontou que os PMs, sob o crivo do contraditório, relataram estarem as drogas na “bag” trazida pelo acusado nas costas, sem fazer qualquer menção ao arremesso de sacola narrado no auto de prisão em flagrante. Outra divergência diz respeito à condução da moto. Um PM disse que o réu trafegava em alta velocidade e o outro, em baixa.
Em sentença prolatada na terça-feira (21), a magistrada acolheu a tese defensiva de insuficiência de prova e absolveu o réu. “Não bastasse a negativa de autoria, é certo que a prova não se revela coerente e firme, hábil a sustentar a convicção condenatória”. Segundo a juíza, os depoimentos dos PMs não ofereceram certeza sobre a dinâmica dos fatos.
“Forçoso reconhecer que circunstâncias relevantes para a convicção judicial a respeito da autoria do crime que ao réu se imputou não foram adequadamente esclarecidas, sendo imperioso ressaltar, mais uma vez, que não há prova segura que indique a prática do crime de tráfico de drogas que ao réu foi imputado”, concluiu Silvana Borges.
Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News