Recorde do café faz agro de MG superar exportações da mineração pela primeira vez
Por Artur Búrigo/ Folha Press em 03/02/2025 às 17:02
A alta dos preços do café contribuiu para um nível recorde de exportações do agronegócio de Minas Gerais em 2024, quando atingiram US$ 17,1 bilhões (R$ 99,7 bilhões na cotação atual)
O valor fez o setor superar pela primeira vez os embarques da mineração, tradicional segmento do estado e que registrou US$ 15,7 bilhões (R$ 91,5 bilhões) no último ano.
Do total exportado pelo agro mineiro, 46,1% (US$ 7,9 bilhões ou R$ 46 bilhões) veio do café, que registrou uma alta de 45% ante 2023.
Com demanda aquecida e oferta restrita nos principais mercados produtores -Brasil, Colômbia e Taiwan-, a commodity viu os preços dispararem em 2024.
De acordo com dados da Cooxupé, cooperativa mineira que é a maior do país do setor, a saca foi comercializada em dezembro a US$ 339 (R$ 1,9 mil na cotação atual), quase o dobro do preço do mesmo mês de 2023, de US$ 188 (R$ 1,1 mil em preços correntes).
Os 31 milhões de sacas exportados por Minas responderam por dois terços dos embarques nacionais no ano passado e foram superiores inclusive aos do Vietnã, o segundo maior vendedor global.
O resultado positivo anima o secretário de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas, Thales Fernandes, que vai além e prevê que o café pode superar nos próximos anos o total exportado pelo minério de ferro.
Hoje ainda o carro-chefe dos embarques mineiros, a matéria-prima vem perdendo força em um cenário de maiores investimentos da Vale no Pará, estado que concentra produto com qualidade superior.
“Hoje o café só perde para o minério, mas daqui um tempo vai superar porque o minério é finito e o café está em crescimento. No último relatório da Conab [Companhia Nacional de Abastecimento], a área plantada em Minas cresceu praticamente 18%”, diz o secretário.
Em 2024, as exportações de minério de ferro no estado somaram US$ 12,5 bilhões (R$ 73 bilhões), US$ 4,7 bilhões (R$ 27 bilhões) a mais que as do café.
Para Eduardo Menicucci, professor associado da Fundação Dom Cabral, o bom desempenho do agro mineiro no último ano está diretamente relacionado ao café, que, por sua vez, aproveitou os altos preços internacionais e a cotação do dólar.
“Já o minério de ferro depende muito da China. Diferentemente do café, que é estocado, a produção do minério é de fluxo contínuo. Se a China diminuir a demanda, também caem o preço da commodity e o saldo da exportação”, afirma o professor.
Em 2024, o preço da tonelada do minério comercializado na China caiu cerca de 25%, e a cotação deve continuar nesse patamar neste ano.
O cenário positivo para o café fez a exportação de Minas superar o volume produzido em 2024 (28,1 milhões de sacas), ou seja, houve venda de estoques.
Ricardo Schneider, presidente do Centro do Comércio de Café de Minas, entidade que conecta vários atores da indústria, acha cedo para afirmar que o desempenho de 2024 do setor se consolidará nos próximos anos.
O clima, ele diz, é sempre um fator de risco a ser considerado, ao lembrar que ondas de calor de dois anos atrás prejudicaram o processo de enchimento do grão -e a produtividade- da atual safra.
Em relação ao consumo do estoque no ano passado, ele cita além do preço, as novas políticas da União Europeia para a importação de produtos provenientes de áreas desmatadas.
A Europa responde por cerca de metade das exportações do café mineiro, e os importadores aumentaram a compra do produto em meio à incerteza sobre como será feita a fiscalização do bloco, cujo início foi adiado para o fim de 2025.
Schneider afirma, porém, que o Brasil é um dos países mais preparados para as novas regras, e, entre as commodities, o café tem a melhor estrutura para atender às novas exigências.
“Inclusive foram feitos vários embarques de teste no ano passado dentro das novas exigências. Eles comprovaram que, se a legislação estivesse implementada, essas exportações já estariam dentro da norma”, diz o executivo da entidade do setor.
O secretário de Agricultura de Minas destaca o programa SeloVerde, do governo estadual, que adota georreferenciamento para rastreabilizar a produção.
“Nós temos 99,4% do parque cafeeiro de Minas Gerais, com 120 mil propriedades produtoras, que não desmata. Esse selo é como se fosse um ‘nada consta’ dos produtores”, afirma Thales Fernandes.
Para 2025, a opinião dos envolvidos no setor não difere: o cenário de oferta pressionada e alta demanda deve manter os preços em patamar semelhante ao deste ano.