M2000 Summer Concerts: 27 anos de um marco na praia do Boqueirão
Por #Santaportal em 04/02/2021 às 20:26
TBT Santa Cecília – Nesta sexta-feira (5), completam-se 27 anos da segunda noite do M2000 Summer Concerts, um festival musical histórico que rolou na praia do Boqueirão, em Santos. Na soma das datas, 300 mil pessoas acompanharam as apresentações nas areias.
Em 8 de janeiro de 1994, Cidade Negra, Gabriel O Pensador, Three Walls Down, Chaka Demus and Pliers, Shabba Ranks, Fito Paez, Chico Science e Inner Circle foram as atrações. A segunda noite, em 5 de fevereiro de 1994, foi mais pesada. Reuniu Mr Big, Lemonheads, Rollins Band, Dr Sin, Raimundos e Deborah Blando.
Relembre abaixo alguns dos motivos que tornaram o M2000 Summer Concerts em um marco na história cultural da Baixada Santista.
1. Estreia do Raimundos
Muito antes de virar o sucesso que se transformou a partir dos anos 1990, a banda Raimundos fez o primeiro grande show da carreira por aqui. O baixista do Raimundos, Canisso, recorda do show com muito carinho: ?Antes de lançarmos nosso álbum de estreia (homônimo, saiu em 2 de abril) fizemos o nosso primeiro grande show. Praia do Boqueirão, em Santos, lotada, vários leões (Mr Big, Lemonheads, Henry Rollins) em cena e uma apresentação histórica. Lembro que anunciaram o Raimundos como uma banda que misturava rock com forró. Éramos uma banda de hardcore. Entramos com um set bem pesado?. Logo depois do M2000, veio esse incrível show do Raimundos.
2. Henry Rollins sem Black Flag
No próximo dia 8, o Black Flag fará sua estreia no Brasil, com uma apresentação em São Paulo. Mas em 1994, o público já queria ouvir as faixas mais marcantes do grupo na Praia do Boqueirão. No entanto, Henry Rollins veio com outra proposta. Focou apenas nas canções do Rollins Band.
Sempre muito enérgico no palco, o vocalista ainda quebrou o nariz com uma auto joelhada no rosto. Sua foto com o rosto ensanguentado foi emblemática. O incidente aconteceu logo na primeira música do set, Low Self Opinion .
?Acho que tocamos bem naquele show. Mas para a nossa carreira não foi um grande acontecimento. A banda nunca teve um grande público no Brasil e percebemos isso em Santos. Encontramos um público que não se interessava pelo o que estávamos fazendo. Justo!?, comentou Henry Rollins, em entrevista concedida por e-mail. No mesmo ano, o Rollins Band se apresentou no segundo Woodstock.
3. Deborah Blando vaiada
Filha de pai italiano, com mãe brasileira. Deborah Blando até tentou agradar os roqueiros com as covers de Decadence Avec Elegance (Lobão) e You Really Got Me (The Kinks), logo na abertura de sua apresentação. Mas parou por aí. Garrafas de água, latinhas de cerveja e refrigerante e tudo mais que estivesse por perto foram arremessados para o palco. O repertório convencional da cantora destoava completamente da noite e o público santista não teve perdão. Deborah Blando sofreu na mão do público santista.
4. Lemonheads no auge
De Boston para Santos, o Lemonheads passou bem por aqui. Não enfrentou apuros e conseguiu mostrar alguns hits de MTV como Into Your Arms (canção de Robyn St Clare, gravada primeiro pelo duo de indie pop australiano Love Positions) e Mrs Robinson (cover de Paul Simon). Na bagagem de Evan Dando, vocal do Lemonheads, tinha o recém-lançado Come on Feel the Lemonheads , sexto de estúdio da banda e o que teve maior alcance comercial.
Anos depois, Evan Dando aproveitou uma passagem pelo Brasil e deu as caras em um show no Chopp Chopp, casa que ficava em frente à Ilha de Conveniência, no Boqueirão. Certamente não se lembra desse dia. Se a Rollins Band foi para Woodstock, o Lemonheads foi para o Glastonbury.
5. Mr Big emocionando público
Quem não enfrentou apuros com a plateia foi o Mr Big. Em entrevista ao site Território da Música, em 2014, o guitarrista Paul Gilbert relembrou a participação no festival.
?Eu nunca vou esquecer a primeira vez no Brasil. Foi um show enorme em Santos, num festival ao ar livre. Foi o maior show que já toquei, a maior quantidade de pessoas. Foi muito divertido?.
Com cerca de 1h30m de show, os californianos fizeram um show que soube equilibrar o repertório existente até aquele momento. Foram três faixas do álbum homônimo (1989), cinco do Lean Into It (1991), incluindo o mega hit To be With You , além de seis canções do recém-lançado Bump Ahead (1993).
Entre solos de guitarra, bateria e baixo, o Mr Big ainda encaixou dois covers: Wild World (Cat Stevens) e Baba O?Riley (The Who), que encerrou o show. Talentoso, mas afiado nas respostas. À época da apresentação, o vocalista Eric Martin concedeu entrevista exclusiva para o jornal Folha de S. Paulo e mostrou deslumbramento com o título de headliner do M2000.
?A gente já abriu para bandas como Aerosmith, Scorpions e Rush, tocando em lugares gigantes, mas nunca foi o headliner num show gigante. Então, faça chuva ou 40 graus, não vejo a hora de tocar?.
E sobre as bandas que dividiriam o palco naquela noite, Martin mostrou um pouco do seu humor para comentar Henry Rollins e Lemonheads.
?Por algumas entrevistas que li, Henry Rollins parece ser um cara legal. Acho que ele era o cantor do Black Flag, não? Quando ele diz que um show de Ted Nugent o impressionou, eu penso que, ainda que faça um tipo de música um pouco diferente da minha, esse cara ainda é um grande fã de rock?n?roll. O mesmo vale para o Lemonheads, que me lembra o Jefferson Airplane. Acho engraçado a gente ser o headliner, mas não sei se o Lemonheads tem meia hora de material. Talvez tenha. Não sei droga nenhuma sobre eles. Mas deve ser uma banda legal de ver?.
De Santos para a Rússia, olha o Mr Big fazendo bonito por lá no mesmo ano.
6. Shabba Ranks, o homem-sexo
Antes de iniciar o circuito nacional do M2000, em janeiro de 1994, as atrações da primeira etapa do festival concederam uma entrevista coletiva no Hotel Transamérica, em São Paulo. Empolgados pela estreia no Brasil, os artistas deram declarações divertidas e de positive vibrations. A jornalista Fernanda Trigueiros, à época em A Tribuna, publicou muitas delas.
Primeiro artista de dancehall a conquistar um Grammy, o jamaicano Shabba Ranks, por exemplo, declarou: ?Eu amo sexo, minha mãe e meu pai amam sexo. Por causa do sexo estou aqui, é parte da vida. Sem ele ninguém existiria nem seria feliz. Esse é o meu jeito de falar da vida?.
O bom humor de Shabba Ranks, então com 27 anos, não durou muito após a passagem pelo Brasil. Antes de voltar para a Jamaica, ele ainda participou como convidado especial do álbum Sobre Todas as Forças , da banda Cidade Negra, que também tocou no M2000. Mas parou por aí. Na sequência, colecionou críticas por conta de suas letras homofóbicas. Perdeu espaço no mercado fonográfico e viu Shaggy assumir a posição de grande nome do ragga jamaicano.
7. Inner Circle com dois hits de peso
Embalada pelos mega sucessos de Sweat (A La La La La Long) e Bad Boys , a veterana Inner Circle, que iniciou as atividades no fim dos anos 1960, mostrou conhecimento da música brasileira. Citou Skank, Tom Jobim, Milton Nascimento e Gilberto Gil.
?Cantamos o amor que percebemos no mundo todo. Um exemplo é quando as pessoas escutam nossa música no rádio e nos querem ao vivo. Foi o caso do Brasil, uma resposta imediata”, declararam os músicos em coletiva de imprensa.
No palco do Boqueirão, os veteranos não decepcionaram. Ainda se apresentaram em outra oportunidade na Reggae Night. Apropriado! Era impossível passar 1994 sem ouvir esse megahit do Inner Circle.
8. Chico Science novato
No meio da gringaiada, surgiu um pernambucano bem desconhecido para a coletiva de imprensa. Na época, claro. Chico Science, que trouxe boa parte do repertório de Da Lama ao Caos , disco de estreia da sua carreira, lançado três meses depois, mostrou muita simpatia com os jornalistas.
?Faço as músicas em linguagem bem simples para que todas as pessoas possam entender?, declarou em um momento. Em outro, disse algo que continua bem atual: ?É necessário reciclar, diversificar e misturar ritmos como o maracatu, coco, samba de roda, ciranda, embolada, funk?. A energia do Chico Science e Nação Zumbi já era assim em 1994.