Juiz nega HC a investigado por compra de votos em Cubatão após denúncia anônima à PF

Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 22/12/2025 às 10:00

Reprodução/Vade News
Reprodução/Vade News

Não há constrangimento ilegal na instauração de inquérito policial baseada em denúncia anônima, se antes houver apuração prévia. O juiz Rodrigo Pinati da Silva, da 119ª Zona Eleitoral de Cubatão, na Baixada Santista, fez essa observação ao negar habeas corpus impetrado pela defesa de um homem investigado pela Polícia Federal (PF) por suposta compra de votos. Para o pretenso esquema foram criados grupos de WhatsApp.

“É admissível que denúncias anônimas possam servir como notícia-crime válida, desde que submetidas a verificação preliminar pela autoridade policial, o que, no caso, ocorreu”, avaliou o julgador. Ele enfatizou que a concessão de habeas corpus para evitar o indiciamento ou trancar o inquérito policial é medida excepcional, porque exige “evidente equívoco”.

De acordo com a defesa do averiguado, que é servidor público concursado de Cubatão, não haveria justa causa para o inquérito policial, pois ele foi aberto exclusivamente com base em informação apócrifa e em vídeo sem prova de sua integridade e integralidade, caracterizando quebra da cadeia de custódia do material digital.

Pinati afastou os argumentos defensivos, destacando que a PF, após receber a denúncia anônima e o respectivo vídeo, realizou diligências preliminares antes de abrir o inquérito. Esses materiais foram encaminhados originariamente ao Ministério Público Eleitoral, que os repassou de forma oficial ao órgão policial para a devida apuração.

Segundo o delegado responsável pelo inquérito, o setor técnico da PF analisou de forma preliminar o conteúdo recebido, extraindo prints, identificando participantes, números telefônicos e diálogos. Também foram identificados áudios atribuídos ao paciente (pessoa para quem se pede o HC), com orientações explícitas sobre como filmar o voto, comprovar a escolha do(s) candidato(s) determinado(s) e receber o pagamento.

O julgador constatou que o vídeo foi encaminhado pelo Ministério Público Eleitoral à PF com registro documental pelo Sistema Eletrônico de Informações (SEI), “situação que preserva sua rastreabilidade”. Porém, ainda que assim não fosse, ele ressalvou que “a quebra de cadeia de custódia não configura, por si, nulidade processual, senão potencial ineficácia da prova”.

Outro ponto frisado pelo juiz foi o de que não se vislumbra nos autos qualquer indício de adulteração e nem é demonstrado prejuízo específico ao suspeito. “As alegações defensivas são genéricas, não descrevendo fato concreto capaz de infirmar a higidez do elemento informativo. Em sede de habeas corpus, tal discussão demanda instrução probatória, incompatível com a via estreita do mandamus”.

Garantia de investigação

Por ser a fase inquisitiva da persecução penal antecedente à acusatória, Pinati reforçou a necessidade de se garantir menor rigor à investigação, ainda que isso acarrete transtornos ao homem de bem, pois esse é o “preço” para viver em sociedade. “Se a justa causa é para a segunda etapa exigida, faz-se mister pretender-se menos para a primeira, sob pena de não haver razão para a sua existência”.

Conforme o julgador, há descrição objetiva de condutas potencialmente enquadráveis no artigo 299 do Código Eleitoral – inclusive orientações para a filmagem do voto, promessa de vantagem e organização de grupo destinado à prática – o que afasta o reconhecimento imediato de atipicidade, ilegalidade flagrante ou abuso de poder que justifiquem o trancamento do inquérito policial.

“Tendo havido a descrição de fato criminoso imputado ao impetrante, é imprescindível que sejam os fatos devidamente averiguados, a fim de autorizar a propositura da ação penal ou mesmo o arquivamento do inquérito, mas apenas após exauridas as investigações”, concluiu Pinati.

Eleições de 2024

Conforme o conteúdo dos arquivos das mídias analisadas pela PF, fica claro que o esquema de compra de votos aconteceu para as eleições de 2024 em Cubatão. Os diálogos orientam como os membros dos grupos de WhatsApp, criados para esse fim, deveriam filmar os seus votos na cabine de votação, embora seja proibida a captação de imagens (foto ou vídeo) no momento em que o eleitor esteja na urna.

O objetivo da gravação é servir de prova de que o eleitor cooptado pelo esquema votou no(s) candidato(s) indicado(s) e possa receber o pagamento em dinheiro prometido. Pelo teor das mensagens, os aliciados têm ciência de que cometeram crime eleitoral. Não há menção nos áudios da quantia a ser paga e do(s) candidato(s) favorecido(s).

Por esse motivo, ainda é longo o caminho para a PF trilhar na investigação. Inicialmente, foram identificados três administradores dos grupos do aplicativo de mensagens e 33 membros. Todos são suspeitos, mas esses números devem subir.

O artigo 299 do Código Eleitoral considera crime e pune com reclusão de até quatro anos quem dá, oferece, promete, solicita ou recebe, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita.

Já o artigo 41-A da Lei 9.504/1997 prevê a cassação do registro da candidatura ou do diploma do candidato eleito, se a corrupção eleitoral for reconhecida em decisão judicial definitiva. Nessa hipótese, outra consequência é a declaração de inelegibilidade pelo prazo de oito anos, a contar da eleição na qual ocorreu o crime.

* Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News

loading...

Este site usa cookies para personalizar conteúdo e analisar o tráfego do site. Conheça a nossa Política de Cookies.