Pesquisador de Praia Grande lidera estudo que revela aumento de 15.000% na desinformação sobre autismo
Por Santa Portal em 02/05/2025 às 10:00
Um estudo inédito, coordenado pelo pesquisador Ergon Cugler, de Praia Grande, revelou que a desinformação sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) cresceu mais de 15.000% nos últimos cinco anos nas comunidades da América Latina e Caribe no Telegram. O levantamento aponta o Brasil como o principal disseminador regional de conteúdos conspiratórios envolvendo o autismo.
A pesquisa, realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), em parceria com a associação Autistas Brasil, e conduzida pelo Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas (DesinfoPop/CEAPG/FGV), analisou mais de 60 milhões de mensagens de grupos conspiratórios no Telegram entre 2015 e 2025.
Ao todo, foram identificadas e categorizadas 150 falsas causas e 150 falsas curas para o autismo, espalhadas em conteúdos acessíveis ao público em geral. O estudo também contou com a colaboração de Arthur Ataide Ferreira Garcia, Guilherme de Almeida e Julie Ricard.
Segundo os dados, a pandemia da Cpvod-19 foi o ponto de virada no crescimento das fake news sobre o TEA. Somente entre 2020 e 2021, o conteúdo conspiratório aumentou 635%. No período de cinco anos (2019–2024), a desinformação se multiplicou por mais de 150 vezes.
Essas postagens alcançaram mais de 4 milhões de usuários e registraram quase 100 milhões de visualizações em toda a região. Das 47.261 publicações analisadas, o Brasil é responsável por 46% delas – mais de 22 mil conteúdos, visualizados por 1,7 milhão de brasileiros. Argentina, México, Venezuela e Colômbia seguem na lista.
Teorias inusitadas
Entre as teorias mais inusitadas catalogadas estão alegações de que o autismo seria causado por consumo de alimentos industrializados como Doritos, exposição a sinais de Wi-Fi, 5G, vacinas e até “inversão do campo magnético da Terra”. Do outro lado, “curas milagrosas” são oferecidas em formato de produtos e terapias perigosas, como dióxido de cloro (CDS), ozonioterapia, prata coloidal, azul de metileno e até eletrochoques supostamente “inspirados em Tesla”.
Segundo o coordenador do estudo, Ergon Cugler, que também é autista e membro da diretoria da Autistas Brasil, o crescimento dessas práticas não é apenas alarmante, mas representa risco real à saúde pública.
“Estamos diante de uma epidemia digital, em que mães, pais e familiares são bombardeados por mentiras perigosas disfarçadas de orientação”, afirma Cugler. “O Brasil se tornou o epicentro latino-americano da desinformação sobre autismo. Pessoas mal-intencionadas estão lucrando com o desespero alheio, vendendo falsas promessas como se fossem milagres”.
O estudo também mostra que essas comunidades funcionam como verdadeiras “seitas digitais”, com vocabulário que mistura ciência, pseudociência, espiritualidade e negacionismo. “Misturam termos científicos com biohacking e crenças esotéricas para criar bolhas de desinformação onde tudo parece fazer sentido internamente. O mais grave é que, dentro dessas bolhas, o autismo é tratado como algo a ser combatido, como se fosse culpa de alguém ou algo curável”, alerta o pesquisador.
A pesquisa, considerada uma das maiores já feitas sobre desinformação digital envolvendo o autismo na América Latina está disponível ao público em duas versões: diagramada com exemplos e prints (26 páginas) e versão acadêmica completa (124 páginas).