"Acho que estamos fazendo esse isolamento social", Marcos Caseiro, infectologista, em entrevista

Por Ted Sartori/#Santaportal em 23/03/2020 às 10:28

CORONAVÍRUS – O médico infectologista Marcos Caseiro conversou com o #Santaportal e falou sobre o momento do coronavírus na Baixada Santista. O profissional também participou ao vivo do telejornal Bom Dia Cidades, da Santa Cecília, assim como de uma live promovida pela Universidade Santa Cecília no Instagram @unisanta_oficial. Caseiro é docente do Mestrado em Auditoria da Saúde da entidade.

Qual o panorama atual de nossa região em relação ao coronavírus?
Temos um caso ainda não confirmado, mas é um que deu positivo com os exames do Hospital Emílio Ribas, de Guarujá. Esse paciente é de São Paulo e começou a ter desconforto respiratório. Ele veio para Peruíbe porque tem familiares. Na cidade da Baixada Santista, ele piorou, foi internado no pronto-socorro e foi solicitado vaga lá de Peruíbe para o Emílio Ribas. Então, na verdade, na maior parte do tempo ele é de São Paulo.

Por que ainda aparecem poucos casos?
Temos mais de 100 pacientes que estão aguardando exames. Estamos vivendo um enorme problema que é uma enorme dificuldade de ter esses resultados de PCR (proteína C-reativa), de biologia molecular. Quer dizer, foram colhidos exames dos pacientes suspeitos e ainda não temos esses resultados. O exemplo é esse próprio paciente de Peruíbe, que ainda não tem a contraprova do Adolfo Lutz. Provavelmente o local está com muitos exames para fazer e os resultados têm demorado.

E o controle?
Estamos monitorando todos os hospitais. Temos ainda um fluxo de pacientes não muito grande, mas nós não temos ainda esse momento de dizer que o vírus está circulando entre nós. Eu estou surpreendentemente feliz. Acho que estamos conseguindo fazer esse isolamento social de uma forma importante. O que a gente tem que fazer é esse bloqueio. O epicentro da epidemia é São Paulo. Se a gente conseguir realmente fazer esse bloqueio de São Paulo para cá, vai ser muito eficiente para que a gente reduza ao máximo o número de casos e, obviamente, ter um serviço de saúde que dê conta de assistir todos esses pacientes.

A demora está na contraprova?
Só é feita contraprova exames que são realizados fora do âmbito público. Então, por exemplo: de um paciente qualquer do Guilherme Alvaro, a amostra foi enviada para o Adolfo Lutz, que é um órgão oficial e o resultado já é confirmado. É feito contraprova quando o indivíduo faz exame, seja em um laboratório particular ou não público, e essa amostra tem que ser enviada para o público para confimrar o que chama de contraprova. Você pega o Einstein, o Sírio Libanês…Tivemos aqui um paciente, mas na verdade deu negativo, e foi enviado para o Fleury, que deu negativo. Se desse positivo, precisaria da amostra ser enviada para o Lutz, o Lutz fazer o exame e confirmar. Isso é que é a contraprova. Tem que passar por um laboratório público. Não é aceito como prova definitiva vindo de outros laboratórios. O que aconteceu é que mudou o padrão de notificação. No Diário Oficial de 17 de março, o governador estipulou, junto com a Secretaria de Saúde, que não colheremos mais material suspeito. Só vamos colher exames PCR do paciente que internar em situação grave. A princípio, todo mundo que tiver quadro de tosse e febre, vai ser um suspeito e vai ser orientado pra fazer isolamento domiciliar, mas não será feito exame para termos a confirmação se é um caso ou não.

Isso ajuda, naturalmente, a diminuir esse gargalo…
Exatamente. Oitenta e cinco por cento dos pacientes vão ter um quadro gripal, um quadro sintomático leve. E exatamente esses indivíduos têm que fazer isolamento domiciliar.

Como o senhor avalia essa combinação de remédios destinados para outros males e e essa corrida desenfreada por eles?
A gente tem que tomar muito cuidado com essas coisas. O Donald Trump (presidente dos Estados Unidos) comentou isso e acabaram os remédios nas farmácias, caso dos usados para lúpus e artrite reumatóide, que é um imunomodulador. O problema é que essa formulação é basedada em dois estudos péssimos. Um estudo que não é estudo, que faz uma avaliação da possiiblidade terapêutica, enquanto em outro deram medicamento para seis pacientes e o desfecho que eles viram é ver se o indivíduo diminuiu a volemia (volume sanguíneo). Não era ver especificamente se vivia mais ou não. Então foi essa a situação. Esse estudo é muito ruim. Tanto é que, teoricamente, esse medicamento não deve ser utilizado, a príncipio, em circunstâncias que não sejam de um estudo clínico. Ela não foi aprovada para esse fim. É um estudo totalmente, do ponto de vista científico, desprezível, ruim. Não há evidências neste momeno em vários estudos com esta droga. Não há evidência que ele tenha eficácia. O estudo foi hidroxicloroquina com azitromicina, antibiótico que dispomos.

Duas semanas atrás, foi feita uma projeção de quase 30 casos graves. Houve alguma alteração?
São dados de estimativa, baseados no pior cenário que era o da cidade de Wuhan, em Hubei, na China, em que 0,1% da população se infectou. Mas não bemos bola de cristal. Acho que a gente está surpreendendo. Estamos fazendo bloqueio antes de ter casos. Embora São Paulo tenha demorado a agir, estamos com um timing diferente. Estamos a 60 km da Capital. No epicentro da pandemia, houve chegada de muitos indivíduos de áreas endêmicas doentes. O caso do italiano foi exemplar, que esteve em uma festa com 60 pessoas. Aí se entende como essas doenças acabam se disseminando. É tudo estimativa. Vai depender do que vai acontecer.

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