01/07/2024

Vício oculto em barco não exclui prêmio de seguro por naufrágio em Salvador

Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 01/07/2024 às 06:00

Igor Santos/Divulgação PMS
Igor Santos/Divulgação PMS

Seguradora não pode negar a cobertura a sinistro ocorrido com o bem sem demonstrar, de forma inequívoca, a ocorrência de situação que a isentaria do dever de indenizar. Com esse entendimento, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) condenou uma companhia a ressarcir um cliente em R$ 242 mil pela perda total do seu barco. Ele naufragou na Baía de Todos-os-Santos por causa de um vício oculto.

A decisão do colegiado foi unânime para dar provimento ao recurso de apelação do dono da embarcação e reformar sentença da 7ª Vara de Relações de Consumo de Salvador. A juíza Catucha Moreira Gidi havia negado o pedido do autor sob a justificativa de que a perícia juntada aos autos atestou ter o barco afundado após a entrada de água, devido a um reparo oculto e de má qualidade no casco pelo qual a apelada não é a responsável.

Esse problema não foi verificado durante a vistoria realizada pela companhia antes da celebração do pacto. A magistrada destacou em sua decisão que a posterior constatação do reparo oculto isenta a seguradora do pagamento do prêmio do seguro, em virtude de cláusula contratual na qual estão expressas as hipóteses de exclusão. Uma delas se refere a reparos ou substituições de partes ou peças que apresentem defeito.

Porém, a 1ª Câmara Cível observou que ao caso incide as regras da Lei 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor (CDC), por ser o apelante o destinatário final do produto (seguro náutico de embarcação) prestado pela apelada. Desse modo, devem ocorrer a aplicação da inversão do ônus da prova (artigo 6º, inciso VIII) e a interpretação do contrato de forma mais favorável à parte hipossuficiente da relação (artigo 47).

Risco assumido

Conforme o relator do recurso, desembargador Edson Ruy Bahiense Guimarães, inexiste dúvida sobre o conserto no casco, bem como o fato desse reparo ter provocado o acidente. Contudo, um engenheiro naval designado como perito do juízo concluiu que não há como afirmar se a realização dessa restauração foi antes ou depois da contratação do seguro, precedida de vistoria a cargo da companhia Mapfre.

Elaborado por perito indicado pela seguradora, o laudo de vistoria serve para estabelecer o “limite máximo de indenização” a ser indicado na apólice e até justificar eventual recusa da empresa na celebração do pacto. No documento exibido pela companhia, quanto ao “estado de conservação” do barco, consta que ele está “limpo e bem mantido”. Também há a seguinte observação: “sem avarias informadas ou localizadas nesta vistoria”.

“Entende-se que a seguradora assumiu o risco da contratação, uma vez que possui expertise e aparatos para, em sendo o caso, ter recusado a contratação ou até segurado em percentual mínimo”, frisou o relator. Em prol do apelante, acrescentou o julgador, o laudo do perito judicial afirma não ser possível saber se o reparo no casco foi realizado antes ou depois da inspeção feita pelo profissional da confiança da Mapfre.

Guimarães concluiu pela condenação da apelada ao pagamento integral do prêmio. “Ante a fragilidade do polo consumidor, é possível afastar a autonomia privada e alterar os termos do negócio jurídico quando reconhecida a abusividade das cláusulas ou das condições do contrato e, sobretudo, não existem provas assertivas capazes de fundamentar a aplicação das exclusões contratuais, como é o caso dos autos”.

A quantia a ser desembolsada pela seguradora deve ser corrigida monetariamente, desde o evento, e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação. A recorrida ainda arcará com as custas e despesas processuais, além dos honorários advocatícios, arbitrados em 15% sobre o valor da condenação. O naufrágio ocorreu em 7 de janeiro de 2018, após o barco sair de Salvador com destino à Vera Cruz, na Ilha de Itaparica.

* Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News

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