16/02/2022

Em 'Sempre em Frente', Joaquin Phoenix brilha ao lado de ator mirim

Por Bruno Ghetti/Folha Press em 16/02/2022 às 11:36

Divulgação
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Poucas coisas são mais irritantes num filme do que aquelas crianças que parecem adultos em miniatura -atores mirins já tão conscientes do próprio ofício que, ao atuar, sonegam aos personagens seu caráter mais infantil (ou o fazem de maneira artificial, “técnica”), fazendo deles criaturas estranhamente robotizadas, pequenos autômatos. Ainda bem que não é o caso de Woody Norman, o menino escolhido para interpretar um garoto de nove anos, mas com cabeça de alguém bem mais experiente, no filme Sempre em Frente, que estreia nesta quinta-feira (17).

Seria insuportável ver uma criança metida a adulta sendo interpretada por outra com o mesmo perfil, mas felizmente Norman tem um olhar sempre puro, inocente, que dá um certeiro equilíbrio ao personagem -e há sempre algo de lúdico na presença dele em cena, mesmo quando o garoto diz frases que poderiam ter saído da boca de um psicanalista veterano.

A trama mostra a relação conturbada entre os irmãos Johnny, interpretado por Joaquin Phoenix, e Viv, papel de Gabrielle Hoffmann, que praticamente romperam após a morte da mãe deles. Um ano depois, quando Viv se vê impelida a passar alguns dias em outra cidade, para cuidar do ex-marido com distúrbios psiquiátricos, Johnny se oferece para cuidar do filho dela, Jesse, papel de Norman, nesse período.

Por conversas telefônicas -e tendo a preocupação com Jesse como ponte-, os irmãos vão, aos poucos, restabelecendo um elo que se esvaía. A criança é muito precoce em algumas questões. Quando o tio pede a ele que seja um pouco mais “normal”, o pequeno o desconcerta com uma réplica mordazmente singela. “Mas o que é normal?”

Educação da criança

Jesse, no entanto, é ainda bastante infantil em vários outros aspectos. E, ao precisar ter jogo de cintura para lidar com essas duas facetas do sobrinho, Johnny acaba se compreendendo melhor. O convívio o faz perceber capacidades e debilidades que, até então, ele desconhecia sobre a própria personalidade.

É sempre muito complicado educar uma criança, sobretudo na fase em que já não é mais tão pequena, mas também ainda não é pré-adolescente. Não se pode manter ninguém num mundo de ilusões, que em nada corresponde à realidade terrível da vida real. Mas também tratar uma criança em pé de igualdade, como um adulto, pode ser ainda pior; as verdades precisam ser ditas, é fato, o problema é achar a melhor maneira para fazer isso.

No filme, tanto Johnny quanto Viv em geral optam por dizer verdades ao garoto, tentando não perder a ternura. Mas, às vezes, um pouco mais de autoridade adulta não faria mal. Jesse sabe muito bem ser caprichoso e mimado, e por pena (ou seria medo?), o tio e a mãe cedem às birras do menino.

Mas o longa é bem-sucedido ao mostrar como é difícil estar o tempo todo precisando tomar decisões que podem ter uma influência enorme sobre alguém em fase de formação. Uma mísera resposta apressada, ou impaciente, pode gerar um trauma que a criança levará para sempre.

Responsabilidade de formar alguém

O filme é, de certo modo, uma maneira de mostrar a um homem o peso e a responsabilidade a que muitas mulheres estão diariamente sujeitas, atuando como mães. Mesmo que, no caso, não se trate do pai da criança, mas do seu tio. De qualquer modo, é importante que ele tenha esse contato, até para entender melhor a própria irmã.

Johnny trabalha num projeto que consiste em entrevistar crianças de diversas origens sociais e étnicas, perguntando a elas o que pensam sobre o mundo e o futuro. O filme traz trechos de depoimentos verídicos de vários pequenos, e as cenas até se integram relativamente bem ao todo do longa. Mas talvez pudessem aproveitar esse material de forma mais interessante em algum documentário à parte, sobre a visão de mundo das crianças modernas.

O maior problema do longa, no entanto, está no gesto estético do cineasta Mike Mills ao usar uma fotografia em preto e branco, assinada pelo sempre competente Robbie Ryan. As tomadas urbanas, mostrando o dia a dia em grandes metrópoles, têm uma beleza levemente melancólica e por vezes suntuosa. Mas não há uma justificativa de fato convincente para todo esse “empetecamento” visual.

Ainda mais quando a música de fundo, impositiva, sobrecarrega desnecessariamente um filme que precisa de alguma leveza. Felizmente, porém, o trio de atores principal não soleniza demais as situações; Phoenix, Hoffmann e o pequeno Norman garantem frescor às cenas. Que, com atores inadequados, poderiam se tornar pesadas e exaustivas.

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