Operação que investiga PCC por infiltração em setor de combustíveis cumpre mandados na região
Por Santa Portal em 28/08/2025 às 10:00
A Operação Carbono Oculto, realizada simultaneamente em oito estados com a participação de 1.400 agentes, cumpriu mandados em Santos e Guarujá nas primeiras horas desta quinta-feira (28). A operação é considerada a maior da história do país contra o crime organizado e desarticula uma esquema colocado em prática por organizações criminosas investigadas por participação fraudulenta no setor de combustíveis, com infiltração de integrantes da facção Primeiro Comando da Capital (PCC).
De acordo com a Polícia Federal, estão na mira da investigação vários elos da cadeia de combustíveis controlados pelo crime organizado, desde a importação, produção, distribuição e comercialização ao consumidor final até os elos finais de ocultação e blindagem do patrimônio por meio de fintechs e fundos de investimentos.
Segundo as investigações, são mais de 350 alvos, entre pessoas físicas e jurídicas. Em Guarujá e Santos, os agentes cumprem mandados contra duas pessoas físicas. Os alvos são suspeitos da prática de crimes contra a ordem econômica, adulteração de combustíveis, crimes ambientais, lavagem de dinheiro, fraude fiscal e estelionato.
A força-tarefa é composta por cerca de 1,4 mil agentes das Polícias Civil e Militar, Polícia Federal, Ministério Público de São Paulo, por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), Ministério Público Federal e Receita Federal; além da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, que participa diretamente de 50 alvos, com a atuação de 160 auditores fiscais responsáveis pela apreensão digital de documentos.
Fraudes em importações
Importadoras atuavam como interpostas pessoas, adquirindo no exterior nafta, hidrocarbonetos e diesel com recursos de formuladoras e distribuidoras vinculadas à organização criminosa. Somente entre 2020 e 2024, foram importados mais de R$ 10 bilhões em combustíveis pelos investigados.
Um dos principais eixos da fraude investigada passa pela importação irregular de metanol. O produto, que chega ao país pelo Porto de Paranaguá (PR), não é entregue aos destinatários indicados nas notas fiscais.
Em vez disso, é desviado e transportado clandestinamente, com documentação fraudulenta e em desacordo com normas de segurança, colocando em risco motoristas, pedestres e o meio ambiente. O metanol, altamente inflamável e tóxico, é direcionado a postos e distribuidoras, nos quais é utilizado para adulterar combustíveis, gerando lucros bilionários à organização criminosa.
Em várias redes investigadas, em mais 300 postos de combustíveis, foram detectadas fraudes tanto qualitativas quanto quantitativas. Consumidores estariam pagando por volumes inferiores ao informado pelas bombas (fraude quantitativa) ou por combustíveis adulterados fora das especificações técnicas exigidas pela ANP (fraude qualitativa).
Lavagem de dinheiro
Auditores-fiscais da Receita Federal identificaram irregularidades em mais de 1.000 postos de combustíveis distribuídos em 10 estados.
A maioria desses postos tinha o papel de receber dinheiro em espécie ou via maquininhas de cartão e transitar recursos do crime para a organização criminosa por meio de suas contas bancárias no esquema de lavagem de dinheiro. Entre 2020 e 2024, a movimentação financeira desses postos foi de R$ 52 bilhões, com recolhimento de tributos muito baixo e incompatível com suas atividades. Os postos já foram autuados pela Receita Federal em mais de R$ 891 milhões.
No entanto, cerca de 140 postos eram usados de outra forma. Eles não tiveram qualquer movimentação entre 2020 e 2024, mas, mesmo assim, foram destinatários de mais de R$ 2 bilhões em notas fiscais de combustíveis. Possivelmente, essas aquisições simuladas serviram para ocultar o trânsito de valores ilícitos depositados nas distribuidoras vinculadas à organização criminosa.
Ocultação
Para ocultar os verdadeiros beneficiários dos lucros ilícitos, os ganhos eram distribuídos por meio de uma rede de interpostas pessoas, camadas societárias e financeiras, fundos de investimento e instituições de pagamento. Parte substancial desses recursos foi usada para comprar usinas sucroalcooleiras e expandir a atuação criminosa em distribuidoras, transportadoras e postos de combustíveis.
Os criminosos utilizavam ainda fintechs em vez de bancos tradicionais de pagamentos para dificultar o rastreamento dos recursos. Segundo a Receita Federal, as investigações já identificaram ao menos 40 fundos de investimentos (multimercado e imobiliários), com patrimônio de R$ 30 bilhões, controlados pela organização criminosa. Em sua maioria, são fundos fechados com um único cotista, geralmente outro fundo de investimento, criando camadas de ocultação.
“A asfixia financeira do crime organizado é o nosso foco. Essa ação integrada entre as forças de segurança ataca diretamente o núcleo do problema, onde esses criminosos conseguem lucros vultuosos de forma fraudulenta, prejudicando toda cadeia econômica e, principalmente, a população de diversos estados brasileiros”, afirmou o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite.
Segundo o Ministério Público, o comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (CIRA/SP) adotará providências judiciais para bloquear bens suficientes para recuperar o tributo sonegado, cujo montante atualizado é estimado em R$ 7.672.938.883,21.
Terceiro mandado na região
Também deflagrada nesta quinta-feira, a Operação Tank tem como foco o desmantelamento de uma das maiores redes de lavagem de dinheiro já identificadas no estado do Paraná. Um mandado de busca e apreensão foi cumprido em Bertioga.
Segundo a Polícia Federal, o grupo criminoso atuava desde 2019 e é suspeito de ter lavado pelo menos R$ 600 milhões, movimentando mais de R$ 23 bilhões por meio de uma rede composta por centenas de empresas, incluindo postos de combustíveis, distribuidoras, holdings, empresas de cobrança e instituições de pagamento autorizadas pelo Banco Central.
A estrutura criminosa utilizava diversas táticas para ocultar a origem dos recursos, como depósitos fracionados em espécie (que ultrapassaram R$ 594 milhões), uso de “laranjas”, transações cruzadas, repasses sem lastro fiscal, fraudes contábeis e simulação de aquisição de bens e serviços. Além disso, o grupo é suspeito de se valer de brechas no Sistema Financeiro Nacional para realizar transações de forma anônima por meio de instituições de pagamento.
As investigações também revelaram práticas de fraude na comercialização de combustíveis, como adulteração de gasolina e a chamada “bomba baixa”, em que o volume abastecido é inferior ao indicado. Pelo menos 46 postos de combustíveis em Curitiba estavam envolvidos nessas práticas.
Além de Bertioga, foram cumpridos 14 mandados de prisão e 42 de busca e apreensão nos estados do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro. Foram bloqueados bens e valores de 41 pessoas físicas e 255 jurídicas, totalizando uma constrição patrimonial superior a R$ 1 bilhão.