Júri acolhe tese de suicídio e absolve acusado de estrangular a mulher
Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 24/07/2025 às 06:00
Submetido a júri sob a acusação de ter matado a sua mulher por asfixia mediante estrangulamento e em contexto de violência doméstica, um comerciante foi absolvido na Bahia. Os jurados acolheram a tese defensiva de que sequer houve homicídio, porque, na realidade, a vítima se enforcou com um cinto. O casal vivia junto há mais de 20 anos.
Realizado no Fórum de Tucano, município da região conhecida por Polígono das Secas e distante a 252 quilômetros de Salvador, o julgamento popular durou três dias. Presidida pelo juiz Donizete Alves de Oliveira, a sessão começou na manhã da última quinta-feira (17) e terminou à meia-noite de sábado (19). O Ministério Público (MP) irá recorrer.
Perante as quatro mulheres e os três homens sorteados para compor o conselho de sentença, os promotores Marcos José Passos Oliveira Santos e Davi Gallo Barouh pediram a condenação do comerciante Antônio Carlos Gomes Bitencourt, de 62 anos, por homicídio qualificado pela asfixia e pelo feminicídio, nos mesmos termos da denúncia.
Na qualidade de assistentes da acusação, os advogados Raul Livino Ventim de Azevedo e João Oliveira Santos endossaram a pretensão dos representantes do MP, que sujeitaria o réu a pena de 12 a 30 anos de reclusão, se fosse condenado. Quando a vítima morreu, o feminicídio ainda não era um tipo penal autônomo, punível com 20 a 40 anos.

As equipes dos advogados Fabiano Pimentel e Florence Rosa Faria rebateram a tese acusatória de homicídio. Com uma meticulosa análise do exame necroscópico realizado no Instituto Médico-Legal (IML) de Euclides da Cunha, a defesa sustentou que a vítima morreu de asfixia por enforcamento, logo, se suicidou.
Os debates entre a acusação e a defesa contaram com réplica e tréplica. Além de Fabiano Pimentel e Florence Rosa, também compuseram a banca defensiva os advogados Catharina Maria Tourinho Fernandez, Isaque de Santana Correia, Ana Paula Trento e Bernardo Torres.
Lesões no pescoço
Para discorrer sobre os aspectos técnicos do laudo, a defesa se baseou nos pareceres de três renomados legistas que juntou aos autos. Um desses médicos, inclusive, foi ouvido em plenário para prestar esclarecimentos sobre o seu estudo, descartando a hipótese de homicídio e, por extensão, qualquer vínculo do réu com as lesões detectadas na vítima.
Os pareceres avaliaram as fotografias tiradas do cadáver no IML. Eles concluíram que as marcas no pescoço da vítima são condizentes com enforcamento (suicídio) e afastaram a hipótese de homicídio. As lesões decorrentes de estrangulamento possuem outras características, apesar de ambos os tipos de morte serem espécies de asfixia mecânica.
Somado a esses dados técnicos, os defensores abordaram o histórico de vários transtornos psiquiátricos, tratamentos e afastamentos da vítima, conforme relatórios médicos. Consta dos autos que o pai dela se suicidou por enforcamento, nas mesmas condições da filha, em um armador de rede para dormir, segundo destacou a defesa.
Conforme citado em um parecer, filhos e a psicóloga da falecida comentaram que ela falava com frequência em se matar, principalmente após o suicídio do pai. Também não foi produzida qualquer prova de agressões entre o casal, destoando da narrativa da polícia e do MP de feminicídio, que pressupõe um ciclo de violência doméstica.

Ana Paula Trento e Bernardo Lins
Interpretação equivocada
Relatório da Polícia Civil concluiu pela ocorrência de homicídio qualificado porque o laudo do IML apontou como causa da morte “asfixia mecânica, secundária à constrição cervical”. No entanto, os pareceres dos legistas elucidaram que esse termo é genérico e significa enforcamento, podendo, eventualmente, indicar estrangulamento.
De acordo com os defensores, a acusação de homicídio recaiu sobre o comerciante porque ele, em um primeiro momento, escondeu o cinto com o qual a mulher se enforcou, antes de comunicar que a encontrou morta dentro da residência do casal, em Tucano, na manhã de 5 de dezembro de 2015.
Com o laudo necroscópico apontando que a vítima morreu em decorrência de asfixia, o suposto estrangulamento foi imputado ao réu. O acusado chegou a ficar preso preventivamente por aproximadamente seis meses, sendo solto graças a habeas corpus impetrado por Pimentel para que o denunciado respondesse à ação penal em liberdade.
O advogado justificou que Antônio Carlos escondeu o cinto usado no enforcamento, sem revelar a real causa da morte da mulher, para evitar o impacto emocional dessa notícia na família, em especial na mãe e na filha da vítima. Para o defensor, a conduta do réu foi típica de uma pessoa em desespero e não de quem quis ocultar suposto crime.
* Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News