04/11/2021

'Eternos' traz à Marvel uma nova equipe de heróis distante dos padrões

Por Leonardo Sanchez/Folha Press em 04/11/2021 às 15:53

Divulgação
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Historicamente, o gênero de cinema dos heróis sempre foi dominado por tipos muito parecidos –homens brancos, héteros, musculosos, hipermasculinizados e perfeitinhos, de Chris Evans a Chris Hemsworth e Chris Pratt. Vez ou outra alguma mulher dava as caras, mas só há pouco tempo elas passaram a ocupar certo protagonismo.

E aí veio Pantera Negra, primeiro longa do Universo Cinematográfico Marvel, o MCU, protagonizado por um herói negro. A indicação ao Oscar de melhor filme, a aclamação da crítica e o US$ 1,3 bilhão de bilheteria –cerca de R$ 7,3 bilhões– pavimentaram o caminho para a diversidade dentro do gênero. Algo que, agora, Eternos eleva a um nível inédito.

Com estreia marcada para esta quinta-feira (4), o novo filme do universo compartilhado da Marvel, que não é nada boba, apresenta um leque plural de personagens superpoderosos, como se numa tentativa de se conectar com todo tipo de público.

No elenco estão Gemma Chan, de ascendência chinesa; Salma Hayek, mexicana; Kumail Nanjiani, paquistanês, e Ma Dong-seok, sul-coreano. Há ainda Lauren Ridloff e Brian Tyree Henry, que são negros –ela é surda, enquanto ele dá vida ao primeiro super-herói abertamente gay da Marvel, com direito até mesmo a beijo no meio do filme.

Eles ganham reforço dos “padrões” Angelina Jolie, Barry Keoghan, Lia McHugh –uma heroína mirim– e Richard Madden, que cumpre a cota de macho alfa viril –e é até comparado ao Super-Homem, da rival DC Comics, em cena.

“Eu acho que o propósito dos Eternos é representar a Terra e todos os que habitam nela. Então é uma equipe que tem como princípio dar a todos alguém com quem se identificar, englobando diferentes etnias, idades e poderes”, diz McHugh, por videoconferência.

Ao lado, Hayek concorda. “É isso mesmo. O que é incrível é que a diversidade desse filme não parece artificial, os atores estão lá porque eram as pessoas certas para aqueles papéis –só que, dessa vez, a busca pelo elenco ocorreu de forma livre, sem se restringir à mesma lista de atores que todos sempre procuram para esses projetos.”

História

Em Eternos, somos apresentados a tipos quase divinos, criados por uma entidade intergaláctica para protegerem os seres humanos. Na Terra há milênios, essa equipe imortal tem o objetivo de acabar com os “deviantes”, bestas alienígenas que impediriam a evolução no planeta. Mas há um porém -eles não podem se envolver em conflitos exclusivamente humanos, como guerras e genocídios.

A fuga do lugar comum da Marvel na nova trama se deve, em boa parte, à ocupante da cadeira de direção, Chloé Zhao. Este é o primeiro trabalho da chinesa desde que ela se tornou, em abril, a segunda mulher na história a vencer o Oscar de melhor direção –por “Nomadland”, também escolhido como filme do ano.

Richard Madden é dirigido por Chloé Zhao no filme Eternos, da Marvel. A diversidade, no entanto, não é a única grande diferença de Eternos.

Eternos é mais adulto e com menos ficção

Aqui, temos uma trama mais adulta –pela primeira vez, um longa do estúdio tem uma cena de sexo–, com tom mais sério, menos barulho e até mesmo um número reduzido de telas verdes.

As paisagens, tão plurais quanto o elenco –do agitado centro de Londres às densas florestas latino-americanas e às areias de um sítio arqueológico no deserto–, são em grande parte reais, o que permitiu a Zhao enquadrar, com sua câmera, belezas naturais por longos minutos e com certa melancolia, ecoando o que fez em Nomadland.

“Ela com certeza traz sua assinatura para Eternos“, diz Gemma Chan sobre a cineasta. “Eu sabia que ela era uma grande fã da Marvel, então eu estava curiosa para saber o que ela poderia fazer com esse filme. E eu acho incrível que diretores de diferentes contextos estejam sendo escalados para projetos como esse, para correr riscos, porque nós acabamos ganhando histórias totalmente distintas.”

Mas nem todo mundo aprovou a escolha. Apesar da grife da cineasta, Eternos amarga 54% de aprovação no agregador de críticas Rotten Tomatoes –a nota mais baixa para um filme do MCU, o que parece exagerado, mas, por ora, o site não encontrou indícios de boicote, como já aconteceu com outros títulos que priorizavam a diversidade.

“Eu vejo esse filme como um progresso em relação a tudo aquilo que o MCU trouxe para o cinema, e a partir de agora haverá mudança, coisas diferentes, e eu tenho muito orgulho disso e desse novo formato”, justifica Richard Madden, quando questionado sobre a recepção pouco calorosa de Eternos.

Recomeço

Parte disso talvez se deva à enorme, quase descomunal expectativa que envolve o projeto. Além de ser um filme com elenco diverso, comandado por Chloé Zhao, cheio de primeiras vezes –o primeiro beijo gay ou então o primeiro com diálogos em língua de sinais–, ele é o responsável por botar a casa em ordem depois do avassalador Vingadores: Ultimato.

No filme bilionário lançado há dois anos, vários heróis da Marvel se despediram do público e o vilão Thanos foi finalmente derrotado, deixando o caminho aberto para que outro malvado imponha uma ameaça à Terra. Eternos é a oportunidade para o MCU se reorganizar e, junto com as várias séries lançadas no Disney+ nos últimos meses, esboçar o futuro da franquia.

Esse objetivo fica muito claro desde os primeiros momentos do filme. Com incomuns 157 minutos de duração, Eternos parece ser, em sua primeira parte, uma longa introdução a esse novo capítulo do MCU. E aí, quando a trama começa a engrenar e ficar mais clara, recebemos a promessa de que os novos super-heróis retornarão em filmes futuros.

Por ora, Eternos funciona como uma celebração da humanidade –com seus êxitos, falhas, pluralismos e ambiguidades. O maniqueísmo típico do subgênero de heróis fica em segundo plano para mostrar que, apesar de tudo, nós merecemos ser salvos pelos superpoderosos, eles próprios gente como a gente.

Vários dos membros da equipe protagonista, afinal, traçam paralelos com lendas e crenças de civilizações antigas, principalmente a grega, que tinha no seu panteão de deuses figuras tão imperfeitas quanto aqueles que os veneravam.
Thena, personagem de Angelina Jolie, por exemplo, foi idolatrada no passado como a deusa Atena; já Ikaris, vivido por Madden, teria originado Ícaro, que nas histórias voou perto demais do Sol e perdeu as asas.

“Esse é um filme que cobre 7.000 anos da nossa história e um dos temas dele é a conexão”, diz Gemma Chan. “É uma trama que mostra como estabelecemos conexões uns com os outros através do tempo, como nos relacionamos com o nosso planeta.”

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