Especialistas apontam entraves na aplicação da Lei de Alienação Parental
Por Beatriz Pires em 09/09/2025 às 11:00
Quinze anos após ser instituída no Brasil, a Lei de Alienação Parental (LAP) ainda levanta debates sobre sua eficácia. A Lei nº 12.318, sancionada em agosto de 2010, tem como objetivo proteger crianças e adolescentes de intervenções psicológicas que possam impedir ou dificultar a criação de vínculos com um dos genitores.
De acordo com dados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Santos, São Vicente e Praia Grande registraram um total de nove casos de alienação parental entre janeiro e agosto de 2025, sendo Santos responsável pela maior parte. O número representa uma queda de 35,71% em relação ao mesmo período de 2024, quando 14 processos estavam em tramitação.
Em 2024, foram contabilizados 23 casos nas varas das três cidades, valor superior a 2023, quando 21 processos estavam em andamento, um aumento de 9,52%. Em 2023, Praia Grande concentrou a maioria dos casos, com dez processos.
A advogada e presidente da Comissão de Direito de Família e Sucessões de Santos, Ana Lúcia Augusto, defende a lei como um mecanismo não apenas de proteção aos jovens vítimas dessa violência psicológica, mas também de prevenção. Ela ressalta que o uso efetivo da guarda compartilhada continua sendo a melhor forma de evitar conflitos, pois o essencial é o respeito mútuo entre os pais e o compartilhamento de decisões.
Segundo Ana, o processo judicial para identificar a alienação parental é multidisciplinar e envolve juiz, psicólogos, assistentes sociais e, em alguns casos, avaliação do Ministério Público. A lei determina que esses profissionais tenham experiência comprovada em alienação parental ou cursos específicos sobre o tema. No entanto, a advogada aponta falhas na região.
“O que existe na nossa região é uma fila extensa para conseguir uma avaliação judicial com esses profissionais multidisciplinares. Isso acaba arrastando os processos, o que gera prejuízo direto para as crianças”, explica.
A alienação parental, em geral, é praticada pelo responsável que detém a guarda, impedindo o contato da criança com o outro genitor ou promovendo campanhas de desqualificação contra ele. A prática também pode envolver avós, afastando a criança da convivência com familiares idosos.
Há profissionais que defendem a reformulação da lei, destacando que ela pode ser usada de forma distorcida em julgamentos envolvendo crimes como abuso sexual. Ana, no entanto, esclarece: “As denúncias legítimas de violência doméstica ou sexual são levadas ao Judiciário para uma apuração séria, com equipes multidisciplinares. Caso se demonstre que foi uma acusação falsa, haverá penalidade, inclusive criminal. Mas isso não deve ser confundido com alienação parental, que, em alguns casos, é desvirtuada e utilizada como vingança contra acusações legítimas.”
Ela ainda lembra que a LAP tem origem internacional. “Nossa lei de alienação parental é nacional, mas derivada dos estudos do psicólogo norte-americano Richard Gardner. Foi elaborada por uma equipe multidisciplinar formada não apenas por parlamentares, mas também por juristas e psicólogos”, afirma a presidente da Comissão.
A escuta de crianças e adolescentes durante uma audiência, segundo a advogada, é possível, mas não deve ser conduzida como acontece com adultos. “A criança é ouvida por meio de estudo social, com uso de mecanismos lúdicos e conhecimento de psicologia para extrair a verdade ou avaliar os malefícios que a situação possa ter causado. Também é assim que se identifica se a acusação é absolutamente falsa.”
Além das instituições indicadas pelo Judiciário, como casas de acolhimento, programas de justiça restaurativa e encaminhamentos para tratamento psicológico, existem associações de pais e mães que oferecem apoio.
“É importante ressaltar que a alienação parental deixa marcas profundas na saúde psicológica das vítimas. Por isso, além da atuação do Judiciário, associações e redes de apoio são fundamentais para garantir acompanhamento psicológico adequado”, reforça Ana.