Entrevista Especial: João Carlos Albuquerque visita a Unisanta e fala sobre sua vida e carreira
Por Rodrigo Martins/#Santaportal em 12/03/2019 às 09:44
ENTREVISTA – Um dos principais apresentadores dos canais ESPN, o jornalista João Carlos Albuquerque realizou uma palestra na noite desta segunda-feira (11), no auditório do Bloco E da Universidade Santa Cecília (Unisanta). O Canalha, como é frequentemente chamado por colegas e telespectadores, conversou com os alunos de Jornalismo sobre os desafios da profissão. João Carlos Albuquerque também conversou em entrevista exclusiva ao #Santaportal sobre a sua carreira.
Aos 63 anos, João Canalha acumula coberturas em Copas do Mundo e passagens por veículos importantes como as TVs Gazeta, Cultura, Record, SBT e a extinta Manchete, além da ESPN Brasil. De repórter de campo em rádios a âncora de telejornais e apresentador de programas esportivos na ESPN, João Carlos Albuquerque fala nesta entrevista especial sobre o período em que viveu em Santos, o começo de sua carreira, o seu lado professor, a paixão pela música e pelo Santos Futebol Clube, dentre outros assuntos. Confira!
Veja a entrevista completa:
#Santaportal: Muitos estudantes tem o sonho de se tornarem jornalistas esportivos. Como é para você participar de uma palestra com jovens? Chegou a preparar algum roteiro para esse bate-papo?
João Carlos Albuquerque: Para mim é uma felicidade dupla ou tripla, sei lá. Em 1998, dei aula para 130 jovens e crianças, da quinta série ao terceiro colegial. Foi uma experiência fascinante pra mim. É uma troca de ideias. Muita gente acha que não tem isso, mas não é o meu caso. Acho essa troca de visões de mundo fantástica. Eles são muito curiosos, querem saber como eu comecei, como é a vida em São Paulo e na televisão. Eu, na verdade, não preparo roteiros pra esse tipo de conversa. Quero ver o que eles querem saber e assim o papo vai fluindo. Não tenho nada preparado, quero saber as dúvidas do pessoal e depois eu começo a viajar, a falar de muita coisa. Gosto de música, de meio ambiente, literatura e até de política um pouco, mas evito falar, porque ultimamente está meio difícil. As pessoas estão descontroladas por causa disso. Mas é uma experiência enriquecedora e estou muito feliz por ter essa oportunidade de falar com um público tão jovem.
Santaportal: Sua carreira começou aqui em Santos, como repórter de rádio. Qual a sua relação com a cidade e a importância que Santos tem, não só para a sua carreira, como para a sua vida?
JCA: Eu adoro Santos. Fui muito feliz aqui. Morei aqui de 1971 até 1974, deu três anos e pouco. A minha família saiu de Brotas para Pederneiras, de Pederneiras para São Paulo em 1968 e em 1971 a gente se mudou pra Santos. Em 1974 voltamos para São Paulo, meus pais, minha família e eu. Santos era uma cidade ainda mais bonita porque tinha menos prédios, menos carros e menos gente. Então, era ainda mais bonita pra mim. É muito bom estar aqui: sentir esse cheiro de mar, essa descontração e ver as pessoas andando de bicicleta. Eu quero ver se ainda venho morar aqui de novo. Eu lembro dos meus primeiros passos, com um gravador enorme andando da Rádio Universal, que ficava na Avenida Ana Costa, até a Vila Belmiro para entrevistar Pelé, Edu, Clodoaldo, Cejas e Ramos Delgado, dentre outras feras. Lembro de tomar uma chuva depois de um Santos x Grêmio no Pacaembu e pedir um agasalho emprestado pro roupeiro do Santos, que me emprestou e falou: Me devolve amanhã na Vila, se não eu não te empresto mais. Muitas vezes eu voltava no ônibus com os jogadores para Santos. São coisas que não existem mais no futebol atual. Eu era uma espécie de mascote dos caras. Eu era muito novo, comecei quando tinha 16 anos, e antes do treino batia bola com os caras no gramado da Vila Belmiro. Isso não tem dinheiro que pague. Lembro de ter vivido muita coisa boa aqui. Eu jogava frescobol na praia do Itararé e estudava no Colégio Martim Afonso, em São Vicente. Hoje tem muito carro, mais sujeira. Sinto falta um pouco de como a cidade era antes. Mas eu amo Santos. Estou feliz de estar aqui de novo.
Falando da sua carreira: você foi repórter de rádio, âncora de telejornal, apresentador de programa esportivo… São experiências muito diferentes?
JCA: Eu, com 16 anos, peguei as páginas amarelas da lista telefônica, que a molecada nem sabe o que é, peguei um ônibus e fui pedir emprego em uma rádio. E me deram (o trabalho). Ou seja, nem eu sabia, mas eu tinha isso dentro de mim. Ler notícia, entrevistar, comentar, apresentar. Aí você dá entrevista pro Santaportal, dá uma entrevista pra uma televisão… apresenta um programa de esportes ou um telejornal. Eu apresentando o telejornal da (extinta) Rede Manchete, entre 1988 e 1989, às 8h da manhã, entrevistei Adolfo Pérez Esquivel, argentino que foi prêmio Nobel da Paz (em 1980), Luís Carlos Prestes, do Partidão, o maior líder comunista do país, Erasmo Dias, Paulo Maluf, Luiza Erundina e o Delfim Neto, entre outros. Era um telejornal diário e todo dia tinha um entrevistado. Isso tudo te desafia, faz você ter uma versatilidade maior, que te permite em atuar em tantas áreas diferentes.
Divulgação/ESPN Brasil
Já teve algum entrevistado que te tirou do sério? Qual foi a entrevista que você considera que foi a mais difícil na sua carreira?
JCA: (O atual governador de Goiás) Ronaldo Caiado foi uma entrevista muito complicada. É um cara muito sem educação, que cuspia, falava em um tom de voz muito elevado e fazia um discurso agressivo. O Márcio Thomaz Bastos (advogado criminalista e ex-ministro da Justiça, já falecido) estava no estúdio com o Caiado nesse dia. Em um determinado momento da entrevista, tive que pegar no braço dele (Caiado) e falar: aqui quem manda sou eu. Nem eu sei como fazia essas coisas. Acho que estava escrito nas estrelas que era esse o meu papel no planeta Terra. Eu já fiz outras coisas: música e dei aula, mas sempre me pagaram uma miséria. Aí sempre tenho que voltar para a televisão, porque é o único lugar em que me pagam (bem). E como eu tenho duas filhas, não dá para abrir mão do dinheiro.
Quem te acompanha na televisão, sabe que você é um apaixonado por música. Como surgiu essa paixão? Como a música apareceu na sua vida?
JCA: Eu me pego cantando músicas às vezes de quando eu era muito pequeno e algumas que eu aprendi, não sei como te dizer, de quando eu nem era nascido. E eu sei as letras. Sei letras de músicas do Ataulfo Alves, do Noel Rosa, ou que a Elza Soares cantava quando eu era criança. A minha mãe ficava muito tempo com o rádio ligado ouvindo música quando eu era pequenininho em Brotas. Tipo: Lata d´água na cabeça, lá vai Maria…. Ou então Miltinho cantando: Oh mulata assanhada, que passa com graça, fazendo pirraça, fingindo inocência. Bossa Nova eu também cantava. Eu lembro também de uma vez, em um churrasco lá no sítio em Brotas, que o meu pai falou pra cantar a música do Lobo Bobo: Era uma vez um lobo mal, que resolveu jantar alguém. Todo mundo olhando e eu cantei a música inteira. É uma coisa que está no sangue! A minha mãe cantava muito bem, o meu pai também, mas não eram profissionais, nem tocavam nenhum instrumento. Com 12 anos, eu pedi um violão de aniversário para o meu pai. Ele me deu um Tranquillo Giannini nº 6. Eu não sabia tocar nada. Daí ele me mandou em um colégio de freira perto de casa e tinha uma freira que dava aula de violão. Ela me ensinou a tocar A Garota do Baile, do Roberto Carlos, de 1966 ou 1967, não me lembro. Daí aprendi a tocar uma ou outra música. Daí eu fui expandindo: nos anos 1970, saiam umas revistas com as cifras das músicas e eu aumentei um pouco mais o repertório. Hoje eu tenho várias pastas com as músicas e levo pra tocar no bar. Me divirto muito com música, mas dinheiro não dá.
Quais as suas maiores influências na música? Tem alguma música que você considera ser a trilha sonora da sua vida?
JCA: Eu gosto de tanta gente. Eu gosto de rock – mas daquele rock clássico: Led Zeppelin, Black Sabbath, Deep Purple, Steppenwolf, Grand Funk Railroad, etc. Eu gosto desses blockbusters do rock. Tem umas coisas mais novas, tipo Green Day, que eu adoro. É mais pesado, quase punk, que eu acho bem legal e adoro também. Mas eu toco Bossa Nova, Caetano Veloso, Roberto Carlos e Rita Lee. Aliás, Rita Lee eu adoro. Tanto que a minha filha mais velha se chama Rita. O pai é brasileiro e a mãe italiana, então ficou uma homenagem para a Rita Lee e a Rita Pavone. Elton John foi muito marcante no começo do anos 1970. Quando eu ouvi Rocket Man e Skyline Pigeon eu tinha 15 anos e fiquei encantado. Tanto que hoje eu tenho uns 25 ou mais LPs do Elton John. Tenho mais de 600 vinis, pelo menos 25 do Elton John. Eu tenho uns 15 do Caetano Veloso, uns 7 dos Rolling Stones. Também tenho do Lulu Santos, tenho vários do começo da carreira dele. Aquelas baladas todas dele eu acho muito legal. Gosto de música mais elaborada também. Várias vezes ouço a Jazz Sinfônica, tenho discos de bandas instrumentais. Eu gosto de bastante coisa. Mas se fosse pra colocar uma trilha sonora da minha vida, eu colocaria: I´ve Seen That Movie Too, do Elton John. É (uma música) com ele no piano, que eu acho bem legal.
Todo mundo que acompanha você sabe que você é torcedor do Santos. Você sempre foi santista ou torcia para algum outro time na infância?
JCA: Eu torci pela Ferroviária por uma paixão infantil. Quando a gente morava em Brotas ou Pederneiras, o meu pai me levava em Araraquara para ver jogo da Ferroviária, no velho estádio da Fonte Luminosa, com arquibancada de madeira. Meu pai era palmeirense e eu não conseguia torcer pro Palmeiras. Então, eu gostava da Ferroviária.
Então como surgiu a paixão pelo Santos?
JCA: Na verdade eu me considerei na época um aprendiz de Santos Futebol Clube. Um admirador do Santos, de seus jogadores. Eu tinha 16 anos, ficava com um gravador esperando e de repente entra o Santos para treinar com: Cejas, Carlos Alberto Torres, Ramos Delgado, Vicente e Zé Carlos; Clodoaldo, Nenê e Brecha; Jair da Costa, Pelé, Eusébio e Edu. Aí ainda tinha Léo, Turcão, Hermes, Wilson Quiqueto, etc. E de repente eu estou trabalhando como repórter e esses caras jogando. Pra um cara que nem eu, que adorava futebol, era maravilhoso. Em 1972, começando no rádio, quando eu vi já estava torcendo pelo Santos. Eu cobria treino e fazia os jogos do Santos. Conhecia todo mundo no Santos, todo mundo me chamava pelo nome. Pegava táxi na Vila Belmiro para ir pra casa com o Oberdan, zagueiro do Santos, ou com algum outro jogador que morava perto de casa. Não tinha como você não torcer. Você acaba virando amigo dos caras. Então, quando eu vi, já tinha virado santista. Eles eram meus amigos e eu queria que eles ganhassem. Como eu disse anteriormente, antes do treino eu batia bola com os caras, brincava com eles. Aí de repente os caras estavam no campo jogando contra o Corinthians, o Palmeiras ou o São Paulo e eu estava atrás do gol louco pro Santos ganhar. Afinal, eu queria fazer um vestiário alegre, festivo. Então, não teve como: virei santista!
Como você avalia o atual momento do Santos? Gosta do trabalho do Sampaoli? É uma inovação mesmo ou vê algum exagero nos elogios ao treinador argentino?
JCA: Eu acho que futebol, enquanto forem 11 contra 11, em um campo nessas dimensões, ninguém vai dar uma de Aladim, dar uma de gênio da lâmpada maravilhosa. Nem mesmo se você comparar com o elétrico futebol inglês, o europeu em geral. Eu acho que é uma questão de cultura futebolística. Acho que a gente pegou muito no colo alguns jogadores muito novos, que viraram astros pop cedo demais. Antes mesmo de sofrerem um pouco ou gramarem mais um pouco. Acho que o Sampaoli bota fogo no time. Ele tem um jeito de jogar e faz o time correr atrás desse jeito de jogar. Eu acho que muitos jogadores hoje não obedecem ao que os treinadores pedem para eles. Tem uma preguiça ou indisposição contra o técnico que pede determinadas coisas. Acho que ele (Sampaoli) é interessante, mas também acho que a qualquer momento ele pode ir embora. Ele não me parece um cara muito estável emocionalmente, é só você lembrar que ele teve uma confusão com a Argentina na última Copa do Mundo. Mas eu estou curioso, eu tenho esperança que dê certo. Eu acho que faltam jogadores. O Santos tem alguns bons jogadores, que pelo empenho e por obedecerem as determinações do Sampaoli, estão rendendo mais do que poderiam render com um treinador menos exigente. Acho que essa é uma marca inegável do Sampaoli. Mas vendo o primeiro tempo do clássico do último domingo, na Arena corintiana, eu acho que o Fábio Carille não deve nada pra ele. Dá pra fazer o time jogar de acordo com o que cada treinador quer propor. Eu acho que o Santos está recuando bola demais pro goleiro. Recuaram umas 50 bolas pro Vanderlei e isso me irrita um pouco. A falta de um centroavante pesa também. Eu critiquei demais o Gabigol, mas depois que ele começou a render e fazer gols, melhorou bastante ali. Só que agora ele saiu e ficou um buraco no comando de ataque. Então, se as jogadas saem pelas extremas, não tem ninguém lá.
Falando sobre o seu trabalho na ESPN Brasil, recentemente você fez um pedido para deixar a apresentação do Futebol na Veia (antigo Bate-Bola na Veia), ficando apenas no comando do Bola da Vez. Por qual razão decidiu deixar o Futebol na Veia? E como é o desafio de apresentar o Bola da Vez com grandes nomes do esporte?
JCA: Para falar a verdade, eu às vezes gostaria de fazer sozinho (o Bola da Vez), pois em algumas oportunidades eu quero encaminhar uma conversa. Mas aí tenho que esperar uma pergunta e outra, que por vezes não tem nada a ver. Mas normalmente não tenho nenhum problema, nada contra os outros dois participantes do programa. Gosto muito da entrevista. Você descobre coisas que nem imaginava. É como ler um livro. De vez em quando eu sofro um pouco no programa, porque às vezes não conheço tanto o histórico do convidado para esmiuçar um pouco mais. Porém, vou perguntando e abrindo passagem na história do entrevistado e acho isso bem legal. Ao contrário do Bate-Bola, que está muito parecido com todos os programas. Aquele debate interminável, longo. O mesmo assunto durante uma hora. Enfim, eu estou cansado também. Estou velho. Fiquei 16 anos fazendo o Bate-Bola. Todo dia fazendo estúdio, não há tatu que aguente, como dizem lá em Brotas.
Para encerrar, você é conhecido e chamado carinhosamente pelo público de Canalha. Por isso, não dá para deixar de perguntar: como surgiu o Canalha?
JCA: Ah, eu andei chamando muita gente de canalha. Falei que tinha muito canalha no futebol, na política. Infelizmente, temos muitos corruptos no Brasil. E às vezes recebia algumas mensagens mal-educadas e falava assim: Oh, tem um canalha aqui também. E um dia eu falei assim: Canalhas somos todos nós! Todos nós eu acho que temos alguma porcentagem de canalhice no nosso DNA. Só que nós somos Canalhas do bem. Canalha com c maiúsculo. Não esses canalhinhas mercenários, esses profissionais da política que roubam o dinheiro público das crianças, das merendas, da Saúde e da Educação. E chamava muito as pessoas de Canalha, daí passaram a me chamar de Canalha também. Chamei o Jô Soares de Canalha também. Aí ele me ligou, perguntando pra mim: Como assim você me chama de Canalha?. Eu nem conhecia ele. Daí eu descobri que ele assistia o programa, viramos amigos. Eu defino o Canalha mais como uma brincadeira para entreter um pouco o público.
Caio Bibiano/#Santaportal