27/08/2025

CPIs investigam irregularidades em aposentadorias desde 1947 e têm eficácia questionada

Por Caio Spechoto/Folhapress em 27/08/2025 às 16:05

Reprodução/Marcelo Casal Jr./Agência Brasil
Reprodução/Marcelo Casal Jr./Agência Brasil

A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) de deputados e senadores instalada para investigar fraudes no INSS está longe de ser a primeira a apurar irregularidades nos institutos de aposentadorias. Comissões como essa são formadas há quase 80 anos.

O registro mais antigo de CPI sobre o tema, segundo arquivos da Câmara, do Senado e do Congresso Nacional, é de 1947 -quando o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) ainda não existia.

De acordo com documentos encontrados pela Folha de S.Paulo, o atual é ao menos o 22º colegiado pertinente ao sistema de seguridade social instalado em todo o Legislativo. Há casos, inclusive, em que o relatório final de uma CPI contesta os resultados de investigações anteriores.

A comissão de 1947 era “incumbida de apurar a arrecadação e aplicação dos fundos dos institutos e caixas de aposentadorias e pensões”, de acordo com registro da época. Quem solicitou a criação do colegiado foi o deputado Café Filho (1899-1970), que assumiria a presidência da República em 1954 depois do suicídio de Getúlio Vargas.

O próprio Café Filho foi o relator, mas o documento final, de 1949, não teria sido publicado. A informação está no arquivo “Comissões parlamentares de inquérito: 1946 a 2002”, editado pela Câmara.

A criação das CPIs foi permitida pela Constituição de 1934. Em 1937, Vargas deu o golpe do Estado Novo, instaurou uma ditadura e a ação de congressistas ficou restrita. O regime autoritário acabou em 1945.

No ano seguinte, uma nova Constituição passou a vigorar, estipulando que tanto Câmara quanto Senado poderiam criar CPIs. Os arquivos acessados pela reportagem cobrem os colegiados criados a partir de 1946.

A primeira CPI sobre a Previdência requerida e instalada depois da Constituição de 1988, que vigora atualmente, foi em 1991. O colegiado foi composto por deputados e senadores.

O relatório final cita que houve diversas comissões de inquérito anteriores sobre o tema funcionando em clima de apatia. De acordo com o texto, a repetição provocava, na opinião pública, o sentimento de que os colegiados davam resultado.

O texto também diz que havia uma comoção em torno do tema que teria impedido a CPI de 1991 de “mostrar-se tão ineficaz quanto as anteriores”. O colegiado pediu providências judiciais contra advogados, juízes e outras pessoas envolvidas em decisões judiciais que obrigaram o pagamento de benefícios excessivamente altos.

Dois dos integrantes titulares daquela CPI continuam no Congresso, a deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ) e o senador Esperidião Amin (PP-SC). “Essa CPI foi eficaz. Não posso dizer que tenha acabado com a corrupção porque ninguém vai acabar, mas foi eficaz”, disse o senador.

“Multiplicaram por mil a conta do sujeito”, contou Amin sobre o principal caso de benefício irregular investigado.

Dois dos suplentes, à época deputados, continuam em cargos com protagonismo nacional: o senador e líder do MDB Eduardo Braga (AM) e o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB).

Antes da atual, a última CPI que tinha por objetivo investigar fraudes na Previdência teve seu relatório final concluído em 2003. O documento recomenda medidas como aumentar o número de auditores, prover os principais cargos do INSS sem admitir indicações políticas, melhorar mecanismos de controle e outras providências.

Em seguida, constata que parte dessas ideias já foi apresentada por colegiados anteriores. “Os problemas detectados são recorrentes e suas soluções dependem, basicamente, de decisões políticas”, escreveu o relator, o então deputado federal pelo antigo PFL Eduardo Paes -hoje prefeito do Rio de Janeiro.

A CPI encerrada em 2003 foi criada para apurar quitações fraudulentas de dívidas com o INSS, entre outras irregularidades, que teriam sido efetuadas por advogados de companhias e servidores da autarquia.

No fim, os únicos indiciamentos indicados pelo colegiado foram dos sócios de uma consultoria que teria se apropriado de dinheiro destinado à Previdência. O grupo fez a ressalva de que teve o trabalho prejudicado pelo calendário eleitoral e que não fora possível esgotar o assunto.

O relatório afirma que 20 CPIs haviam sido criadas para investigar irregularidades no sistema de aposentadorias, incluindo a de 2003. Em 2017, uma outra comissão de inquérito sobre o financiamento da Previdência, e não fraudes, foi instalada, completando 21. Por essa conta, o colegiado atual seria ao menos o 22º sobre o sistema de aposentadorias.

A comissão de inquérito instalada no último dia 20 tem como presidente o senador Carlos Viana (Podemos-MG), eleito depois de o governo se descuidar e perder a disputa pelo posto. O relator é o deputado Alfredo Gaspar (União-AL).

O colegiado se propõe a investigar descontos irregulares em aposentadorias. O caso se tornou um escândalo em abril deste ano, quando a Polícia Federal e a CGU (Controladoria Geral da União) realizaram uma operação contra o esquema.

Viana afirmou à Folha, após ouvir o relato de que CPIs anteriores tiveram a eficácia questionada, que os inquéritos são feitos de acordo com as irregularidades observadas em cada momento, e que quem quer lesar o patrimônio público sempre procura brechas. “Outras investigações futuras naturalmente poderão ser feitas para entender quais brechas que precisam de uma nova legislação”, declarou.

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