07/11/2017

CPI investigará falhas no teste clínico para liberação da pílula do câncer

Por Agência Brasil em 07/11/2017 às 19:18

SAÚDE – Em sua segunda reunião, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fosfoetanolamina aprovou, nesta terça-feira (7), a convocação de nove pessoas para falar sobre possíveis falhas na condução dos testes clínicos para a liberação da substância sintética, também conhecida como pílula do câncer. Os testes clínicos em humanos tiveram início em julho do ano passado e pretendiam testar a eficácia da fosfoetanolamina sintética no tratamento do câncer.

Entre as pessoas que serão ouvidas na CPI da Assembleia Legislativa de São Paulo, estão o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira, o professor Gilberto Chierice, um dos estudiosos da pílula, e Bernadete Chioffi, membro da auditoria dos testes clínicos. A próxima reunião da CPI será na próxima terça-feira (14), às 14h30. Além dos três especialistas, deverão ser ouvidas pessoas que participaram da fabricação da pílula e da aplicação dos testes.

A pílula, que vinha sendo distribuída a pacientes oncológicos mesmo sem ter sido testada e comprovada por testes clínicos e sem ter registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), gerou polêmica no país. A distribuição foi proibida e muitas pessoas começaram a entrar na Justiça para ter acesso à substância. Testes clínicos em humanos começaram, então, a ser feitos em São Paulo para testar a eficácia da droga.

Os testes foram conduzidos pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), com o acompanhamento de, Gilberto Chierice, pesquisador aposentado do campus da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos. Em março deste ano, o Icesp suspendeu os estudos porque concluiu pela falta de comprovação da eficácia da fosfoetanolamina sintética no combate ao câncer. Segundo a pesquisa, de 72 pacientes com tumores sólidos avançados tratados com a pílula do câncer, apenas um obteve resposta parcial.

A CPI da Fosfoetanolamina foi criada em outubro deste ano para pretende apurar as razões que motivaram o estado de São Paulo a suspender as pesquisas para liberação da substância, produzida por cientistas no campus da USP em São Carlos. De acordo com o presidente da CPI, deputado Roberto Massafera (PSDB), o objetivo não é investigar a eficácia da substância, mas se houve falhas nos testes clínicos para sua liberação.

“Os auditores que participaram [dos testes clínicos] apontaram várias falhas, e essas falhas não foram corrigidas. Para se ter a dosagem ideal de um produto, que ainda não é medicamento, é preciso fazer um teste chamado fármaco-dinâmico. E isso não foi feito”, disse o deputado. É preciso saber a dosagem certa para tomar um medicamento, alertou o deputado. “Você toma uma pílula e vê a dosagem, toma duas e vê a dosagem, para saber a dosagem recomendada para o paciente. Isso não foi feito”, afirmou Massafera.

“Ao final dos trabalhos, a CPI tem a obrigação de investigar se o dinheiro que o Estado aportou para essa pesquisa foi bem utilizado. E vamos responsabilizar se não foi. E refazer o que não foi feito”, acrescentou o deputado.

O relator da CPI, deputado Ricardo Madalena (PR), informou que a comissão vai investigar se os testes feitos no Icesp realmente cumpriram o protocolo da Anvisa. “Vamos apurar com muita responsabilidade e transparência se houve crime”. De acordo com o parlamentar, se forem constatadas falhas, os culpados serão responsabilizados. “Segundo consta, precisamos apurar se as recomendações do corpo clínico do professor Gilberto (Chierini) foram seguidas. E também se cumpriram o protocolo que é norma da Anvisa.”

A CPI é composta também pelos deputados Márcia Lia (PT), Ed Thomas (PSB), Cássio Navarro (PMDB), Sebastião Santos (PRB), Márcio Camargo (PSC), Rafael Silva (PDT) e Gileno Gomes (PSL).

Esperança de cura
Na tarde de hoje, a CPI da Fosfoetanolamina foi acompanhada pela professora Deize de Jesus dos Reis, de 32 anos. Ela busca a liberação da pílula para o seu pai, que tem câncer no intestino.

“Descobrimos que ele tinha câncer há três meses, no intestino, com metástase no fígado”, disse Deize, muito emocionada. “Entramos com uma liminar (na Justiça) e estamos aguardando há mais ou menos um mês pela liberação da fosfo (fosfoetanolamina). Até agora, não tivemos a resposta”, disse a professora.

“Eu acredito que na fosfo (a fosfoetanolamina) esteja realmente a esperança da cura do câncer”, disse Deize. Para a professora, a CPI pode ajudar a “acelerar o processo de liberação” da substância.

Histórico
Sintetizada há mais de 20 anos, a fosfoetanolamina foi estudada pelo professor aposentado Gilberto Orivaldo Chierice, quando ele era ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da USP, no campus de São Carlos. Algumas pessoas passaram a usar as cápsulas contendo a substância, produzidas pelo próprio professor, como medicamento contra o câncer.

No Icesp, os testes foram feitos com base em orientações de Chierice, da sintetização e encapsulamento até a dosagem oferecida.

Em junho de 2014, uma portaria da USP determinou a obrigatoriedade de substâncias em fase experimental terem todos os registros antes de serem distribuídas à população.

Desde então, pacientes que tinham conhecimento das pesquisas passaram a recorrer à Justiça para ter acesso às pílulas. O Tribunal de Justiça (TJSP) de São Paulo chegou a receber centenas de pedidos de liminar para garantir o acesso à substância.

No dia 22 de março do ano passado, o Senado aprovou o projeto de lei que possibilita o uso da substância mesmo antes de a fosfoetanolamina ser registrada e regulamentada pela Anvisa.

No mesmo mês, a USP denunciou o professor Gilberto Chierice por crimes contra a saúde pública e curandeirismo. A universidade também fechou o laboratório onde eram produzidas as pílulas, já que o servidor técnico que produzia a pílula foi cedido à Secretaria Estadual de Saúde para auxiliar na produção da substância para testes sobre seu possível uso terapêutico.

O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a interrupção do fornecimento da pílula do câncer pela USP, após o fim do estoque. A Corte analisou um pedido feito pela universidade USP contra uma decisão do TJSP que determinava o fornecimento da substância.

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