Cotado para ministério de Lula usou gráfica de fachada nas eleições
Por MATHEUS TUPINA E JOÃO PEDRO PITOMBO/Folhapress em 26/12/2022 às 17:51
O deputado federal Elmar Nascimento, líder da União Brasil na Câmara dos Deputados e cotado para ser ministro do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), gastou R$ 702 mil em uma gráfica de fachada para a campanha de sua reeleição neste ano.
Declaração de gastos feita pelo deputado à Justiça Eleitoral aponta que ele gastou 23% dos recursos de campanha para imprimir cerca de 17 milhões de santinhos e outros materiais gráficos com a empresa Waldyr Rodrigues dos Santos.
A empresa, contudo, não tem endereço fixo nem maquinário para impressão de materiais de campanha.
Waldyr Rodrigues dos Santos é pai de Fábio Dias dos Santos e Márcio Dias dos Santos, sócios da Qualigraf Serviços Gráficos e Editora -fundada em 1995 e que está impedida de celebrar contratos com a administração pública baiana desde maio de 2021 por fraudar licitações.
Além do gasto com a gráfica, Elmar Nascimento contratou uma empresa na qual é sócio junto com seu irmão, o prefeito de Campo Formoso, Elmo Nascimento (União Brasil). A N2 Distribuidora de Bebidas foi contratada por R$ 82,5 mil para arrendamento de um helicóptero.
Procurado, o deputado reeleito disse que não cuida pessoalmente da contratação de empresas para a campanha e afirmou que recebeu o material pelo qual pagou. Também disse que as contas da sua campanha eleitoral foram aprovadas sem ressalvas pelo TRE-BA (Tribunal Regional Eleitoral da Bahia).
O deputado afirmou ainda que a empresa foi contratada em outras campanhas e que o material foi entregue no prazo e com preço de mercado. “Sempre fazemos cotações antes de contratarmos os serviços e os preços deles foram melhores.”
Sobre a contratação da aeronave que pertence a uma empresa do próprio deputado, sua assessoria informou que o pagamento foi feito com recursos de doação de pessoa física e que não foi usado nenhum centavo de dinheiro público do fundo eleitoral nesse contrato.
Segundo os autos do processo administrativo que tramitou no âmbito do Governo da Bahia, a Qualigraf estabeleceu esquema que removia concorrentes dos pregões e os recompensava distribuindo parte do valor pago pelo estado, superfaturando os preços dos serviços a serem prestados.
A gráfica Waldyr Rodrigues dos Santos foi aberta em outubro de 2021 -cinco meses após a sanção imposta à Qualigraf- com o nome fantasia de WR Comunicação e Impressão. A gráfica foi registrada com capital social de R$ 10 mil e optou pelo Simples Nacional, sistema de simplificação tributária para companhias de pequeno porte.
Mesmo registrada como uma microempresa, a gráfica fechou contratos com 17 candidatos nas eleições deste ano, arrecadando um total de R$ 2,7 milhões.
Dentre eles está o estadual eleito Junior Nascimento (União Brasil-BA), primo de Elmar, que gastou R$ 271 mil com a empresa. Ele afirmou que “não há ilicitude na contratação da gráfica”, destacou que todos os gastos de campanha foram devidamente declarados e as contas foram aprovadas sem ressalvas.
“Todos os materiais contratados na empresa foram entregues no prazo combinado. Se há alguma irregularidade na empresa, não é do meu conhecimento.”
A reportagem visitou o endereço que consta no registro da Waldyr Rodrigues dos Santos, em Salvador, mas no local funciona um escritório de contabilidade. A Qualigraf, por sua vez, possui capital social de R$ 20 milhões e é registrada como uma empresa de pequeno porte, possuindo endereço fixo.
Fábio Dias dos Santos, sócio da Qualigraf, disse à reportagem que a gráfica Waldyr Rodrigues dos Santos é virtual, não possuindo escritório físico nem materiais de impressão, e que terceiriza a produção para outras gráficas, o que, segundo ele, não gera ilicitude.
Afirmou também que a empresa de seu pai, Waldyr, fatura de forma regular para diversos clientes, e não foi criada para burlar nenhuma contratação com a administração pública. A reportagem não conseguiu contato direto com Waldyr.
Reportagem da Folha de S.Paulo antes da eleição, em outubro, mostrou a entrega de cisternas compradas pela Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) e instaladas nas casas marcadas com o nome dele.
O deputado tem influência no governo Bolsonaro como líder da União Brasil na Câmara, tendo sido ele o responsável pela indicação do atual presidente nacional da Codevasf e de seu superintendente regional na Bahia.