16/12/2025

'Avatar' não se resume a tecnologia, afirma James Cameron, incerto sobre IA

Por Guilherme Luis/Folhapress em 16/12/2025 às 11:03

Divulgação/20th Century Studios
Divulgação/20th Century Studios

James Cameron esperava o elevador pousar com uma calmaria que não se traduz no novo “Avatar: Fogo e Cinzas“. Para além da trama caótica do filme, que vai aos céus para acompanhar o voo de uma família enlutada, nos bastidores parece haver um certo temor sobre o futuro desta franquia que é uma das mais rentáveis e caras da história.

“Posso estar diante de uma decepção, mas não há nada que eu possa fazer”, diz o diretor em um hotel de luxo em Los Angeles, nos Estados Unidos. “Os filmes de Avatar precisam fazer muito dinheiro para justificar o quanto eles custam.”

Se Cameron antes não tinha dúvidas de que faria cinco filmes ao todo, agora vem dizendo que as possíveis sequências vão depender da performance do terceiro capítulo, que estreia nesta quinta-feira. “Eu faço o filme, mas não consigo adivinhar o que o público está querendo. Os gostos mudam e o mercado também. Estamos saindo de um ano terrível. O cinema foi reduzido em uns 30% ou 35% e ainda não se recuperou.”

Sessões vazias, ingressos inflacionados, estúdios sendo vendidos. Vivemos um cenário no mínimo aterrorizante para Cameron, que fez carreira em cima da defesa do cinema como experiência coletiva e sagrada. Na esperança de trazer o público de volta às salas, neste filme o diretor repete o desbunde visual dos anteriores, com mais primor —ele teve cinco anos para trabalhar na edição após as filmagens, encerradas em 2020.

Assim, “Fogo e Cinzas”, o mais longo “Avatar” até agora, mostra ao longo de quase três horas e vinte minutos criaturas azuladas superpalpáveis, cenas debaixo d`água ainda mais fluidas e paisagens deslumbrantes com bichos que por décadas moraram só na cabeça do diretor.

Mas Cameron está cansado de falar só de tecnologia, e quer que “Avatar” seja de uma vez por todas reconhecido para além disso. “Se forem ver este filme buscando alguma nova forma de cinema, não vão encontrar. É uma continuação do que eu já fiz. Se continuarem me perguntando sobre a tecnologia, vou continuar dizendo que é sobre os personagens. Pergunte-me sobre as coisas que são importantes para mim ou não pergunte mais.”

Pois bem. Na trama, Jake Sully e a companheira Neytiri lidam com a morte do filho, que marca o final do longa anterior. Os dois se deparam ainda com a ameaça de uma tribo ligada ao fogo, liderada por Varang, uma criatura implacável que manipula as chamas.

Queira Cameron ou não, foi graças às ousadias técnicas que “Avatar”, de 2009, virou o longa de maior bilheteria da história, tendo arrecadado US$ 2,9 bilhões. O segundo, “O Caminho da Água”, lançado há três anos, provou que um raio pode cair duas vezes no mesmo lugar ao fazer US$ 2,3 bilhões, ficando em terceiro lugar no mesmo ranking. Cameron tem ainda outro título na lista, “Titanic”, que aparece na quarta colocação. É um currículo como de nenhum outro.

O diretor não conta quanto gastou com o novo “Fogo e Cinzas” e tampouco admite quanto almeja ganhar. “É impossível cogitar qualquer valor no cenário atual”, afirma.

Gênio da computação gráfica e mestre do 3D, Cameron enfrenta pela primeira vez um rival imparável —a inteligência artificial, que se alastrou feito fogo pela indústria do entretenimento. A própria Disney, que distribui “Avatar”, acaba de ceder seus personagens para a dona do ChatGPT usar na criação de vídeos.

“Não é fácil dizer se sou contra ou a favor da IA. Há benefícios e riscos na mesma medida”, ele afirma. “Mas nunca usamos essa tecnologia para criar uma imagem sequer de ‘Avatar’, e não acredito que faremos isso algum dia porque a ideia de substituir atores não me interessa.”

Um vídeo exibido antes da sessão de “Fogo e Cinzas” para jornalistas em Los Angeles mostra Cameron advogando contra o uso de IA e falando da trabalheira que deu para a equipe de centenas de pessoas pôr os filmes de pé. Isso porque “Avatar” usa uma avançada técnica de captura de movimentos para possibilitar que os corpos azulados dos personagens sejam colocados por cima dos atores na hora da edição. É o mesmo feito nos animais dos últimos filmes de “Planeta dos Macacos” ou na criatura Gollum de “Senhor dos Anéis”.

Incorporar IA na pós-produção de “Avatar” certamente ajudaria a reduzir os custos, mas Cameron não quer nem saber. “Eu poderia usar IA, não vejo por que não. Mas não quero que essa tecnologia seja abusada. Não gostaria que cineastas pulassem a etapa de trabalhar com atores, de escrever suas próprias histórias. Me preocupa que haja jovens interessados nesse atalho porque não têm acesso a muito dinheiro.”

Sam Worthington, o protagonista de “Avatar”, diz que inteligência artificial nunca chegou a ser um assunto entre a equipe. “Mas a ideia não me assusta, desde que ela seja usada adequadamente. É uma ferramenta como qualquer outra”, acrescenta Stephen Lang, que volta à franquia como o vilão Quaritch. Quase derrotado no filme anterior, agora ele se junta ao povo do fogo para concluir sua vingança.

“Não há uma pessoa que trabalhe nesses filmes que não ame cinema. Se ‘Avatar’ puder de alguma forma ajudar a perpetuar o cinema, a fazer com que as pessoas vão mais ao cinema, bom para todos nós”, ele segue.

Cameron é desses cineastas que tem a indústria aos seus pés. Celebrado pelo dinheiro que faz circular em Hollywood, o diretor viu “Fogo e Cinzas” receber na semana passada indicações ao próximo Globo de Ouro sem o filme sequer ter estreado.

A produção aparece entre os nomeados a canção original, pela música “Dream as One”, cantada por Miley Cyrus, e em melhor filme blockbuster, categoria criada para contemplar títulos pipoca que dificilmente teriam lugar entre os títulos mais cabeçudos que historicamente disputam os prêmios principais.

“Avatar”, afinal, virou uma franquia de forte apelo popular à la Marvel, com direito até a parque de diversões e videogame. Cameron diz que se render a esse modelo de mega saga foi importante para ele conseguir verba o suficiente para filmar as continuações. “É um ecossistema positivo”, afirma. “Eu, pessoalmente, não me importo com o jogo. Mas se as pessoas gostam tanto de um universo que querem permanecer nele, tudo bem.”

O curioso é que ver o novo “Fogo e Cinzas” na telona já passa a sensação de estar diante de um videogame. Isso porque o filme usa mais quadros por segundo do que outros filmes, criando um tipo de movimento mais liso e rápido, que quebra a textura tradicional do cinema e aproxima a experiência da lógica visual de jogos modernos.

Na cena de abertura, por exemplo, um personagem parece estar sobrevoando a lua Pandora em uma cena acelerada de propósito. Causa estranhamento, mas lá pela quinta vez os olhos se acostumam.

Na première do filme no Dolby Theater, o cinema onde acontece a premiação do Oscar, o filme terminou aplaudido. Estavam lá o diretor, parte do elenco, e outros nomes quentes, de Arnold Schwarzenegger a Billie Eilish, que passaram pelo tapete vermelho enquanto um A gigantesco pegava fogo de verdade.

Avatar: Fogo e cinzas

  • Quando: Nesta quinta-feira, dia 18
  • Classificação: 14 anos
  • Elenco: Sam Worthington, Sigourney Weaver e Zoe Saldaña
  • Produção: EUA, 2025
  • Direção: James Cameron
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