01/04/2023

Autor de ataque a escola de SP está assustado, diz advogada da família

Por Paulo Eduardo Dias/Folha Press em 01/04/2023 às 08:00

Fernando Frazão/Agência Brasil
Fernando Frazão/Agência Brasil

Assustado. É assim que a advogada Rafaela Dantas classifica o estado do adolescente de 13 anos que atacou uma escola de São Paulo e está internado em uma unidade da Fundação Casa no Complexo Brás, no centro da capital.


“Ele é uma criança e não entende exatamente os efeitos jurídicos de sua conduta. Ele não queria estar na Fundação Casa”, afirma Dantas.


Na manhã da última segunda (27), o jovem entrou na escola estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia (zona oeste), onde cursava o 8º ano do ensino fundamental, e matou a facadas a professora Elisabeth Tenreiro, 71. Também feriu outras cinco pessoas, incluindo três professoras.


A advogada representa o adolescente junto à Vara da Infância e da Juventude e também os pais do menor de idade -um homem que trabalha como segurança e uma secretária. Em entrevista à reportagem, ela defende uma investigação profunda a fim de identificar eventuais aliciadores que podem tê-lo incentivado e ajudado a planejar o ataque.
Dantas conta que o jovem sempre se refere ao bullying que vinha sofrendo.


O adolescente relata ser alvo frequente de deboches nas escolas por onde passa. É ridicularizado por ser reservado e também pelo porte físico, sendo chamado por colegas de “feio” e de “rato de esgoto”, por exemplo.


O adolescente conviveu com esse tipo de ofensa, diz a advogada, tanto no colégio onde o ataque foi concretizado, para onde havia sido transferido poucos dias antes do crime, como na escola estadual José Roberto Pacheco, em Taboão da Serra (Grande SP), onde estudou até o início de março.


Antes do atentado, o estudante deixou uma carta para a família na qual conta que passou dois anos planejando o ataque. No bilhete, endereçado à mãe, ao irmão, à avó e a uma tia, ele afirma que bullying, tristeza e ódio o levaram a fazer “uma besteira”. O jovem pede desculpas por decepcionar os parentes e conta que escondeu da família o que sentia, exibindo um sorriso em vez de se expressar.


Na avaliação da advogada da família, falta treinamento aos professores para lidar com episódios que envolvam questões emocionais da criança e do adolescente. “O tema bullying tem que ser abordado nas escolas. Os professores também precisam ser abraçados nesta causa”, afirma Dantas.


A profissional preferiu não dar detalhes sobre a relação do adolescente com a família. Também não quis dizer se o estudante passava por algum tratamento psicológico ou psiquiátrico.


Sabe-se, contudo, que o jovem faltou a duas consultas psiquiátricas agendadas a pedido da escola de Taboão. O Conselho Tutelar afirmou à reportagem ter sido acionado pela unidade em 28 de fevereiro deste ano.


No mesmo dia, uma funcionária da escola registrou um boletim de ocorrência contra o aluno. No documento, o adolescente é descrito como alguém que vinha apresentando comportamento suspeito nas redes sociais, “postando vídeos comprometedores, por exemplo, portando uma arma de fogo e simulando ataques violentos”.


O boletim registrou, ainda, ameaças que o jovem fez contra outros estudantes. “O aluno encaminhou mensagens e fotos de armas aos demais alunos por WhatsApp, e alguns pais estão se sentindo acuados e amedrontados”, diz outro trecho do registro policial.


Um aluno de 12 anos da escola José Roberto Pacheco relatou à reportagem que era amigo do adolescente agressor. Contou que eles costumavam jogar games online juntos, até que o jovem de 13 anos começou a fazer ameaças e a dizer que mataria o amigo e a mãe dele. A partir daí, a amizade foi cortada.


Na semana anterior ao ataque, no dia 23, o adolescente agressor deu um soco no rosto de um garoto mais novo, de 11 anos, na escola. De acordo com a mãe do aluno agredido, o agressor afirmou que estava “com raiva e precisava desestressar”. Esse episódio somou-se a outro, também na semana passada, em que o adolescente fez ofensas racistas a um colega da mesma turma, dando início a uma briga que precisou ser apartada pela professora Elisabeth, que viria a morrer no ataque. “Vai ter volta”, teria dito o estudante a ela, segundo relatos.


Para a professora Ana Célia Rosa, 58, gravemente ferida pelo adolescente, qualquer um que estivesse ali em seu lugar seria atacado. “Ele estava com raiva do mundo”, disse à reportagem a docente de história, que leciona para o 9º ano -portanto, não era professora do agressor. “Acho que foi aleatório, mesmo. Quem ele pegasse, ele machucaria.”


Atingida no braço, a professora Rita de Cássia Reis, 67, disse que o autor do ataque era muito quieto e sempre usava fone de ouvido na sala de aula. Ela disse que não sabia do histórico de ameaças do jovem, que era seu aluno, mas declarou à polícia que o aluno arranjava muita briga com colegas.

O delegado Marcus Vinicius Reis, titular do 34º DP (Vila Sônia), onde o caso é investigado, disse que o adolescente afirmou em depoimento que tentou comprar uma arma de fogo pela internet, mas não conseguiu. O crime foi cometido com uma faca, e ele contou que treinava um ataque do tipo com uma tesoura e um travesseiro, em casa.


O jovem usava uma máscara de caveira no momento do crime. A balaclava da caveira é símbolo de grupos supremacistas americanos, que a exibem na internet, e o mesmo tipo de máscara foi usado tanto pelos atiradores do massacre de Suzano (SP), em 2019, quanto pelo adolescente que atacou duas escolas em Aracruz (ES), em novembro de 2022 -nesse último caso o agressor tinha também uma suástica nazista no braço.


Além disso, o autor do ataque na escola Thomazia Montoro usava nas redes sociais o sobrenome de um dos atiradores de Suzano.


A internação provisória na Fundação Casa foi determinada pela Justiça na terça (28). Ele responde pelas acusações de homicídio qualificado consumado, três tentativas de homicídio, agressão e injúria racial- praticada dias antes contra um colega. O Ministério Público também pede a punição do jovem por atos infracionais supostamente cometidos enquanto ele estudava em outra unidade escolar. O caso está em segredo de Justiça.


Para a advogada Rafaela Dantas, a polícia precisa investigar outras possíveis responsabilidades por trás desse tipo de crime.


“A gente está vendo uma questão midiática, no sentido de que em outros locais acontece o mesmo modus operandi. É isso que tem que ser investigado, e é para isso que eu vou querer respostas, de quem poderia estar por trás de tudo isso.”

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