24/04/2024

Acusada de favorecer prostituição é absolvida porque vítimas já se prostituíam

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 24/04/2024 às 06:00

Divulgação
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O crime de favorecimento da prostituição (artigo 228 do Código Penal) pressupõe as condutas de “induzir” ou “atrair” alguém a se prostituir. Desse modo, o delito não se caracteriza se a suposta vítima já se prostituía.

Com esse entendimento, a juíza Paula Mantovani Avelino, da 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, absolveu uma brasileira, moradora em Portugal, da acusação de favorecer a prostituição de três mulheres supostamente aliciadas no Brasil para realizarem programas sexuais com clientes vips nos Estados Unidos.

Conforme a julgadora, ficou demonstrado nos autos que duas das pretensas vítimas já se dedicavam à prostituição antes da ida aos Estados Unidos, porque exerceram essa atividade em viagem pretérita feita ao Catar, da qual a ré não teve qualquer participação.

A juíza anotou que, segundo entendimento pacífico da doutrina pátria, apenas pessoa que não se dedicava anteriormente à prostituição pode ser sujeito passivo das condutas de “atrair” e “induzir” descritas no tipo penal. Em relação à terceira suposta vítima, o crime também não houve, porque ela não chegou a se prostituir nos Estados Unidos.

“Em relação às vítimas N. J. e D., a conduta é atípica, por ter não se concretizado o ato de prostituição, em relação à primeira, e pelas duas últimas não terem aptidão para figurar como sujeitos passivos do delito”, concluiu a magistrada.

A absolvição foi fundamentada no inciso III do artigo 386 do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal). Com essa decisão, foi determinada a restituição à acusada dos R$ 20 mil que ela pagou de fiança para responder ao processo solta. A ré teve mandado de prisão preventiva cumprido por agentes da Interpol em Portugal.

O advogado Marcelo Cruz sustentou a atipicidade da conduta da sua cliente

Denúncia inepta

Os advogados Marcelo José Cruz e Yuri Cruz sustentaram a tese de atipicidade da conduta ou de inexistência de provas de autoria, porém, preliminarmente, apontaram a denúncia como inepta por descrever os fatos de forma “genérica”, sem individualizá-los.

“A leitura do trecho da peça de acusação acima transcrito não deixa margem para dúvidas no sentido de que aquela não atende aos requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal, especificamente no que concerne à obrigação de descrição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias”, destacou Paula Avelino.

Porém, a juíza não acolheu a preliminar defensiva de inépcia, apesar de reconhecê-la, sob a justificativa de ter assumido os autos após a instrução, quando eles já estavam conclusos para sentença, e do princípio da primazia do julgamento de mérito.

De acordo com a julgadora, a denúncia, “em alguns pontos, tangencia, realmente, com a inépcia”. Porém, ela optou por examinar mesmo assim o feito, “considerando, nessa análise, além da apreciação da materialidade, autoria e tipicidade, as questões relacionadas à imprestabilidade das iniciais alegada pelos acusados”.

O Ministério Público Federal (MPF) juntou nos autos diálogos entre a acusada e o corréu em um aplicativo de mensagens, nas quais eles conversaram sobre prostituição, valores a serem pagos e divisão de comissões, citando os nomes de algumas garotas.

Contudo, ao citar tais diálogos na denúncia, o MPF não estabeleceu relação direta com as três vítimas. “Cabe ao titular da ação penal descrever o fato criminoso que imputa aos acusados, descrição essa que não foi realizada, ao menos da forma como determina nossa legislação processual penal”, frisou a juíza.

O advogado Yuri Cruz também atuou no caso

‘Book rosa’

A denúncia é derivada de investigação da Polícia Federal contra rede de tráfico internacional de mulheres para a prostituição de luxo. Com base nessa mesma apuração, o MPF ofereceu mais quatro denúncias, sendo todas reunidas na mesma ação penal.

A magistrada que recebeu os autos conclusos para a sentença criticou a realização da instrução do processo sem o desmembramento das denúncias. “É medida heterodoxa, que tornou dificultosa a tramitação dos autos”. As cinco iniciais totalizaram sete réus e 30 vítimas, entre as quais uma funkeira com milhões de seguidores.

Segundo a denúncia específica à brasileira presa em Portugal, com o fim de “lucro fácil” e se valendo do serviço de “book rosa”, ela auxiliou o corréu, apontado como líder do esquema, denunciado em todas as ações, a induzir e atrair as vítimas para a prostituição.

Além dos Estados Unidos, o homem apontado como cabeça da rede tráfico de mulheres também foi acusado pelo MPF, nas outras iniciais, de mandar vítimas se prostituírem no Paraguai, na Bolívia, no Catar e na Austrália. Absolvido em três denúncias, ele foi condenado nas demais ao total de 12 anos de reclusão.

A esse homem também foi imputado o crime de tráfico de pessoas. Uma segunda ré foi condenada a oito anos, enquanto os demais acusados foram inocentados. A PF chegou a investigar uma renomada modelo, mas a sua participação no esquema não se confirmou.

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News

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