12/06/2024

'A Casa do Dragão' volta com briga de mães sob promessa de frear violência gratuita

Por Guilherme Luis/Folhapress em 12/06/2024 às 10:56

Divulgação/HBO
Divulgação/HBO

Em “A Casa do Dragão”, o embate é entre duas feras que querem proteger seus filhotes.

Não dragões, mas as ex-amigas do peito Rhaenyra Targaryen e Alicent Hightower, que na nova temporada da série abandonam qualquer traço de carinho que já nutriram uma pela outra. Agora arqui inimigas, elas tomam partido na briga dos filhos, cujas travessuras adolescentes acabaram num assassinato não premeditado entre eles na primeira leva de episódios, de 2022.

O segundo ano do seriado prelúdio de “Game of Thrones”, que volta a ser exibido pela HBO neste domingo, leva a picuinha de madrasta e enteada afora dos seus castelos, o que faz com que outras castas metam o bedelho neste grande caso de família.

Ainda que “A Casa do Dragão” agrade a audiência ao apostar no mesmo misto de espadas e fofocas de “Game of Thrones”, ela tem uma diferença notável -o que impera aqui são os dramas de duas mulheres, Rhaenyra e Alicent, que flutuam sobre os homens da história.

É um avanço frente à primeira temporada, quando as duas orbitavam o rei Viserys, pai de Rhaenyra e marido de Alicent. Agora, com ele morto, elas se enfrentam pela coroa, a primeira para seu próprio desfruto, e a outra para agraciar o filho mais velho.

“É isso que torna ‘A Casa do Dragão’ única no cenário de fantasia, e diferente da série original”, diz Ryan Condal, cocriador e roteirista da produção. “A razão de termos escolhido contar essa história, e não outra [do universo de ‘Game of Thrones], é o fato de termos duas mulheres no centro, mesmo que sob o controle do patriarcado, lutando contra ele.”

Outro papel importante é o de Rhaenys Targaryen, tia da protagonista Rhaenyra, conhecida como a Rainha que Nunca Foi -no passado ela disputou o trono com o irmão Viserys, mais novo que ela, mas perdeu justamente por ser mulher.

“Desde que ‘Game of Thrones’ estreou, em 2011, o mundo mudou muito. Houve o Me Too”, diz a atriz Eve Best, intérprete de Rhaenys, mencionando o movimento em que mulheres denunciaram casos de assédio e abuso cometidos por homens da indústria do audiovisual. “Hoje vemos toda uma geração de mulheres ascendendo a cargos de governança.”

“A discussão da série é tão palpável que me faz relacioná-la com a Câmara dos Comuns, do Reino Unido, [câmara que reúne parlamentares britânicos], um ambiente tão masculino e machista. É muito parecido com o que interpretamos no set de gravações, como as cenas no conselho do reino em que Rhaenyra [que luta pela coroa] é intimidada ou ignorada por um grupo de homens.”

Seguir numa toada mais feminina faz com “A Casa do Dragão” atenda também a uma demanda antiga dos fãs de “Game of Thrones”, que por uma década acumulou prêmios e prestígio, mas também uma mesma reclamação -a de que exagerava nas cenas de violência e abuso sexual com mulheres.

O auge da polêmica ocorreu num capítulo da quinta temporada, de 2015, quando a personagem Sansa Stark é estuprada pelo marido numa cena tachada de desconfortável por muitos. À época reclamavam também que a série pregava a ideia de que as garotas da série dependiam de violências desse tipo para terem alguma evolução no seu arco narrativo.

“A Casa do Dragão” já tinha sido mais comedida nesse sentido desde sua estreia, e a julgar pelos capítulos liberados aos jornalistas com antecedência, a série volta com a promessa de frear ainda mais nas cenas de crueldade -como no primeiro capítulo, quando a lente da câmera é desviada de um assassinato bárbaro.

“‘Game of Thrones’ construiu sua reputação cruzando seu limite e então criando outro para cruzar de novo. Brutalidade e sexo são intrínsecos a esse mundo, e precisa haver uma razão para inseri-los na história, mas não queremos ser gratuitos aqui”, diz Condal, o roteirista.

Ele escreve os episódios de “A Casa do Dragão” usando como base o livro “Fogo e Sangue”, publicado no Brasil pela editora Suma. A obra é de George R. R. Martin, a mente por trás deste universo fictício.

O escritor não esteve envolvido com a nova temporada de “A Casa de Dragão”, porém. Condal diz que ele anda ocupado escrevendo “vários livros e outras séries de TV”.

Martin está há anos prometendo concluir “As Crônicas de Gelo e Fogo”, romances que deram origem a “Game of Thrones”, cujo quinto e último volume foi publicado em 2011. A demora virou piada entre parte dos fãs, que dizem temer que ele morra antes de finalizar a obra que mudou sua vida.

Apesar disso, Martin é tido como um dos nomes mais relevantes da fantasia contemporânea. Um dos autores mais bem pagos do mundo, seus calhamaços venderam milhões de exemplares e ajudaram a levar a fantasia épica para as prateleiras mais visadas das livrarias.

Um dos seus méritos foi criar uma história em que é difícil definir quem é bom ou mau, o que fez “Game of Thrones” despertar amores e ódios por seus personagens nada maniqueístas. Essa pegada segue em “A Casa do Dragão”.

“Somos criaturas complexas”, diz Steve Toussaint, ator que dá vida a Corlys, lorde dos Velaryon, aliados da protagonista Rhaenyra. “Existem políticos que eu não suporto ouvir discursarem, mas que com certeza são adoráveis entre seus amigos. Nos cabe tentar retratar isso de forma fiel porque é como o mundo opera.”

Se nos tempos de “Game of Thrones” os fãs se dividiam entre torcer para alguns poucos mocinhos, em “A Casa do Dragão” é mais difícil decidir se é a madrasta ou a entrada quem merece prosperar.

A própria HBO se aproveitou disso para divulgar a série ao criar vídeos em que as bandeiras dos dois exércitos da série foram colocadas digitalmente em pontos turísticos de vários países. Um dos escolhidos foi o bondinho do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro, que segura a bandeira verde da família de Alicent, enquanto o Castelo de Chapultepec, na Cidade do México, foi coberto com o símbolo preto de Rhaenyra.

Essa ambiguidade da personagens inflama até o elenco. Fabien Frankel e Matt Smith, que dão vida a Daemon Targaryen e Sor Criston Cole, de lados opostos na série, debatem durante a entrevista.

“Não consigo ver nenhum traço de maldade na Alicent”, diz o primeiro, cujo personagem é um pau-mandado dela. Smith, até então um braço-direito de Rhaenyra, lembra ao colega de uma série de escrúpulos da personagem.

“As pessoas existem na ambiguidade que permeia o mundo. Essas figuras não são boas, nem más, não são diferentes nem indiferentes. Elas são tudo ao mesmo tempo, e isso é ser humano”, diz o ator.

A Casa do Dragão – 2ª temporada

  • Quando: Neste domingo, dia 16, na HBO e na plataforma de streaming Max
  • Autoria: Ryan Condal e George R. R. Martin
  • Elenco: Emma D’Arcy, Olivia Cooke e Matt Smith
  • Produção: EUA, 2024
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