Tradição das bordadeiras do Morro do São Bento inspira nova geração de artesãs em Santos
Por Santa Portal em 27/11/2025 às 06:00
O projeto Ponto de Contato: Diálogos com a Tradição do Bordado em Santos, no litoral de São Paulo, vem reacendendo a memória de uma das tradições mais significativas da cultura santista: o bordado do Morro do São Bento. Desde fevereiro, a iniciativa tem promovido ações de formação, pesquisa e criação com foco na herança deixada pelas bordadeiras, mulheres que transformaram o ofício em expressão artística, fonte de renda e símbolo de identidade coletiva.
Atualmente, a iniciativa está na etapa de mentorias criativas e encerra o ciclo de encontros com o grupo nesta quinta-feira (27), de forma presencial no Instituto Procomum, entidade parceira. Participam do processo quinze artistas e pessoas artesãs, cada um contemplado com uma bolsa de incentivo de R$ 3.500. A coordenação é do artista visual Julian Campos, idealizador do projeto, ao lado de Luciana Arruda, Rick Rodrigues e Paulo Rezende.
“Nosso foco é chamar a atenção da cidade para a importância que as bordadeiras do Morro do São Bento têm na história social e cultural de Santos. As mentorias são o coração do projeto, porque dialogam com uma história que marcou gerações e corre o risco de ser esquecida”, afirma Julian.
Memória viva do Morro
Entre as participantes está Maria Carmina de Andrade Sebastião, de 75 anos, filha de Isabel da Paixão, conhecida como Dona Isabel, uma das bordadeiras originais do Morro do São Bento. Portuguesa, Carmina aprendeu o ofício na infância e vê na mentoria uma oportunidade de manter viva a tradição que marcou sua família e a cidade. “Tem sido uma bênção participar dessa experiência, que revive o trabalho das bordadeiras e cria um espaço de troca entre gerações”, afirma.
Além de resgatar uma prática ancestral, o projeto amplia o debate sobre o bordado como linguagem artística e política. “Por muito tempo, o bordado foi associado exclusivamente ao universo feminino. No Ponto de Contato, também discutimos como os fazeres manuais ultrapassam qualquer marca de gênero”, destaca Julian Campos.
Entre fios, afetos e heranças portuguesas
A história do bordado santista é marcada pela influência da imigração portuguesa. O advogado Manoel Ricardo Sebastião, presidente do grupo folclórico Cruz de Malta e descendente direto das bordadeiras, lembra que a tradição chegou a Santos na década de 1960, trazida por mulheres da Ilha da Madeira.
“O resgate do bordado da Madeira em Santos é crucial para a preservação da nossa identidade cultural. A técnica, com pontos ricos em detalhes, é reconhecida como patrimônio imaterial e tem um valor simbólico que vai muito além da peça em si”, afirma Manoel.
O grupo original das Bordadeiras do Morro do São Bento, fundado em 1985, chegou a reunir cerca de 300 mulheres. Hoje, apenas duas sobrevivem, entre elas a mãe de Manoel.
Encerramento com mostra e publicação
Após a finalização da etapa de mentorias, o projeto realiza a exposição de mesmo nome “Ponto de Contato: Diálogos com a tradição do bordado em Santos”, no espaço Futrica Economia Criativa (Rua 15 de Novembro, 146 – Centro), com abertura em 6 de dezembro, das 14h às 19h, reunindo os trabalhos desenvolvidos durante o processo formativo.
A mostra seguirá até fevereiro e também exibirá peças históricas do acervo das bordadeiras, cedidas por familiares, marcando o lançamento de uma publicação inédita que atualiza a história do grupo a partir de 2013.