Maior ação penal de tráfico internacional do País tem 61% de absolvição

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 15/11/2024 às 06:00

Divulgação/APS
Divulgação/APS

Com um total de 159 réus, a maior ação penal de tráfico internacional de drogas do País, derivada da Operação Brabo, da Polícia Federal, apresentou índice de absolvição de 61,54% em um dos quatro processos nos quais ela foi desmembrada. A sentença é da juíza Paula Mantovani Avelino, da 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo. Cabe recurso.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), a organização criminosa desmantelada pela Brabo é ligada ao Primeiro Comando da Capital (PCC). O grupo foi responsável pela remessa de cerca de nove toneladas de cocaína do Brasil a vários países europeus, entre 2015 e setembro de 2017, principalmente, a partir do Porto de Santos.

Ouvidos pelo Vade News, advogados de acusados que foram inocentados atribuíram o elevado percentual de absolvições à “pirotecnia, sem o respaldo de provas”, promovida pela PF e pelo MPF por ocasião da deflagração da Brabo e do oferecimento da denúncia. A princípio, a inicial elencou 156 réus, sendo depois aditada para incluir mais três.

Em sentença de 236 laudas prolatada no último dia 7 de novembro, a juíza federal apreciou a conduta de 39 réus, em 12 dos 26 “eventos” (nome dado a cada ação atribuída ao grupo investigado) descritos na denúncia principal da Brabo. As operações criminosas analisadas resultaram na apreensão de 4,4 toneladas de cocaína no Brasil e no exterior.

O desmembramento dos autos originais em mais três outras ações decorreu do grande número de eventos e de acusados, além das situações processuais diversas dos réus (presos preventivamente e em liberdade). Dos 39 recém-julgados, houve a condenação de 14 (38,46%) e a absolvição de 25 (61,54%).

Além do tráfico internacional, os réus responderam por integrar organização criminosa de alcance transnacional e conexa a outros grupos mafiosos. Conforme a participação de cada um no esquema, as penas variaram de três anos e seis meses (para apenas um acusado, absolvido da organização criminosa) a 15 anos e 11 meses de reclusão.

Segundo o MPF, os membros da organização criminosa dividiam tarefas necessárias para o sucesso do esquema, tais como a cooptação de caminhoneiros e tripulantes de navios, a contratação de equipes responsáveis pela inserção da cocaína em contêineres previamente selecionados e o aliciamento de funcionários de terminais portuários.

Elo perdido

A denúncia vinculou um dos absolvidos ao evento nº 18 – relacionado à apreensão de 332 quilos de cocaína no Porto de Santos, em maio de 2017. Defendido pelo advogado Marcelo Cruz, esse réu foi acusado de desempenhar o papel de “elo” entre as células da organização, obtendo dados de contêineres com trabalhadores de terminais.

Conversas telefônicas foram usadas pelo MPF para incriminar esse acusado. Porém, para a juíza federal, o “conteúdo sucinto dos diálogos” não se mostra suficiente para comprovar a suposta participação do réu e nem detalhou qual teria sido ela. Desde a resposta à acusação, Cruz apontava essa fragilidade probatória, reconhecida na sentença.

“Para um inocente acusado de crimes graves como o tráfico internacional e participação em organização criminosa, figurar como réu representa uma pena sem condenação. Foram sete anos de angústia para o meu cliente, mas há de se louvar a cautela e o senso de justiça da magistrada ao apreciar ação tão volumosa e complexa”, declarou Cruz.

Sem reconhecimento

Os advogados José Luiz Moreira de Macedo e Fábio Spósito Couto defenderam um estivador acusado de participar, com outros homens, do içamento de 234 quilos de cocaína para introduzi-lo no navio Cap San Artemissio, atracado em Santos, em novembro de 2016. Posteriormente, a droga foi colocada em um contêiner embarcado.

Segundo a PF, dois tripulantes estrangeiros do cargueiro flagraram o esquema. No entanto, conforme Macedo e Couto, os policiais federais não providenciaram que as supostas testemunhas realizassem o reconhecimento do estivador, de acordo com as exigências legais, sendo o réu acusado apenas porque trabalhava no navio na ocasião.

A juíza Paula Avelino assinalou na sentença que as informações do timoneiro e imediato do navio não foram ratificadas em juízo, e nem poderiam, “tendo em vista que ambos sequer foram arrolados como testemunhas”. Ela acrescentou a ausência de quaisquer outras evidências a comprovar a ligação do estivador com o caso, absolvendo-o.

DEA e PF

Funcionário de um terminal portuário de Santos, um outro réu foi acusado de envolvimento com o evento nº 5, que resultou na apreensão de 1.137 quilos de cocaína em setembro de 2016. Segundo o MPF, esse acusado utilizou o seu login e a sua senha para apagar imagens de câmeras de segurança no pátio de contêineres da empresa.

Defendido por Alex Sandro Ochsendorf, esse réu negou participação, alegando trabalhar com tecnologia há 20 anos e que, se tivesse intenção de deletar a filmagem, não usaria as próprias credenciais. A julgadora acolheu esse argumento, salientando que não foram produzidas provas vinculando o funcionário do terminal aos demais acusados.

O advogado Ochsendorf apontou nos autos “violação à soberania nacional” por suposta investigação da Drug Enforcement Administration (DEA) – agência antidrogas dos Estados Unidos – em território brasileiro. “A rigor, as provas deveriam ser anuladas, porque a PF juntou no processo uma série de diligências da DEA como se fosse dela”.

Eduardo Velozo Fuccia / Vade News

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