Tribunal mantém condenação de homem por castigar enteado com pimenta no pênis
Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 20/06/2024 às 11:00
Por identificar a intenção do agente em castigar a vítima, causando-lhe intenso sofrimento físico ou mental, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) negou provimento ao recurso de apelação de um homem e manteve a sua condenação por torturar duas vezes o enteado de apenas quatro anos.
Sustentando que não ficou comprovado o dolo específico da tortura, a defesa do réu pleiteou na apelação a sua desclassificação para maus-tratos. Relator do recurso, o desembargador Glauco Fernandes esmiuçou em seu voto as diferenças entre esses dois delitos e concluiu que, de fato, o recorrente cometeu o crime pelo qual foi condenado.
“Resta comprovado suficientemente o dolo do agente em querer impingir sofrimento à vítima, a permitir a conclusão de que a ação do réu teve o especial fim de agir descrito no inciso II do artigo 1º da Lei nº 9.455/97”, frisou o julgador. Segundo a denúncia, o réu colocou pimenta no pênis do menino para castigá-lo por supostas ereções.
“A aplicação de substância como pimenta em mucosa genital é induvidosamente uma ação que não pode ser considerada apenas um excesso nos meios de correção, mas sim uma conduta voltada ao padecimento do ofendido, em um contexto de aplicação de castigo pessoal ao menor”, anotou Fernandes.
De acordo com o Ministério Público, o acusado ainda cometeu um segundo crime de tortura porque, outra vez, submeteu o enteado a “sofrimento desmedido” ao agredi-lo com diversos golpes com cinto/fio. Nessa ocasião, o réu quis repreender a criança porque ela não queria ir para a cama.
O relator esclareceu que o elemento subjetivo do tipo penal de tortura é o dolo de dano, caracterizado pelo intenso sofrimento físico ou mental provocado por violência ou grave ameaça. Já o elemento subjetivo do delito de maus-tratos (artigo 136 do Código Penal) é o dolo de perigo, porque o resultado exige mera exposição da vítima ao risco de dano.
Fernandes considerou a materialidade das duas torturas comprovada por boletim de ocorrência, fotografias, laudo do exame corporal e prontuário médico. Em relação à autoria, o julgador citou que as informações prestadas pela criança foram apoiadas por outros depoimentos e elementos de prova produzidos sob o crivo do contraditório.
“Delitos desta natureza são costumeiramente praticados às escondidas, motivo pelo qual a palavra da vítima se revela de crucial importância quando, apreciada em cotejo com outros elementos dos autos, demonstra, de maneira firme e coerente, o cometimento do crime, tal como no presente caso”, finalizou o julgador.
As desembargadoras Daniela Villani Bonaccorsi Rodrigues e Beatriz Pinheiro Caires seguiram o relator, inclusive, ao considerarem irretocável a sentença do juízo da 1ª Vara Criminal de Araguari quanto à aplicação da regra do concurso material entre as duas torturas e à fixação da pena total em quatro anos e oito meses de reclusão.
O regime inicial de cumprimento da sanção é o semiaberto, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea “b”, do Código Penal, sendo incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, bem como a sua suspensão condicional, por ausência do preenchimento dos requisitos legais.
Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News