Ministra do STJ anula júri porque réu preso foi impedido de usar roupas civis

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 07/06/2024 às 06:00

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O uso de uniforme de presídio por parte do réu durante júri popular ofende princípios como os da ampla defesa e da isonomia, porque que esse tipo de roupa produz um estigma que pode influenciar os jurados e o acusado, caso respondesse ao processo em liberdade, compareceria ao plenário com trajes civis. Com essa fundamentação, a ministra Daniela Teixeira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu habeas corpus para anular julgamento no qual dois homens foram condenados em São Paulo.

“Em atenção aos princípios da ampla defesa e do contraditório, assim como à pacífica jurisprudência desta corte, o pleito formulado pela defesa há de ser atendido, permitindo-se a realização de nova sessão de julgamento na qual o réu tenha oportunizada a utilização dos trajes civis”, decidiu a julgadora. O habeas corpus foi impetrado pela defesa de um dos réus, cuja pena foi fixada em 19 anos de reclusão. O outro acusado é um sargento da Polícia Militar e foi condenado a 14 anos e três meses.

Citando outro acórdão de sua relatoria, a ministra destacou que deve ser conferido aos julgadores leigos um olhar de imparcialidade e serenidade para com o réu, “através da abolição de qualquer símbolo de culpa, tal como a vestimenta carcerária, que constrói, por óbvio, um estigma sociocultural de culpado em torno do custodiado, influenciando de forma indevida o ânimo dos jurados”.

Daniela Teixeira justificou que permitir o uso de roupas civis visa a resguardar a dignidade da pessoa humana e garantir a isonomia. “O pronunciado solto é levado ao julgamento do conselho de sentença sem trajar a ‘farda’ do sistema carcerário”. A julgadora do STF acrescentou que a questão do traje não traz qualquer insegurança ou perigo, tendo em vista a existência de policiamento ostensivo nos fóruns.

Antes do júri, que foi realizado no Fórum Criminal da Barra Funda, na Capital, os advogados Anderson dos Santos Domingues, Bruno Cavalcante e Eugênio Malavasi peticionaram nos autos para que o cliente pudesse vestir trajes civis. Porém, o presidente da sessão indeferiu o requerimento, sob a justificativa de que o uniforme auxiliaria na identificação do detento em caso de eventual fuga.

Após o júri popular, os advogados impetraram habeas corpus perante o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Eles pleitearam a anulação do julgamento sob a alegação de prejuízo à defesa em decorrência da utilização do uniforme do presídio. Porém, a 4ª Câmara de Direito Criminal negou o pedido por não vislumbrar a existência de “patente constrangimento ilegal” que autorize a sua concessão.

“O mero uso do uniforme do estabelecimento prisional não é suficiente para influenciar no ânimo dos jurados a ponto de gerar um juízo prévio de condenação, sendo esta, aliás, regra da Secretaria de Administração Penitenciária, de observância por todos os presos. (…) Além disso, a defesa não trouxe qualquer indicativo concreto de que o uso das vestes carcerárias interferiu na formação da convicção dos jurados”, diz o acórdão do TJ-SP.

Ao declarar a nulidade da sessão de julgamento e determinar a realização de outra, na qual se permita ao réu vestir roupas civis, a ministra ressalvou que o habeas corpus não pode ser manejado em substituição a recurso próprio ou a revisão criminal, conforme entendimento do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, o caso em análise, no qual se verifica “flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal”, é situação excepcional que autoriza conhecê-lo e concedê-lo de ofício.

O homicídio qualificado atribuído ao paciente, que seria agiota, e ao corréu, sargento da PM, ocorreu em junho de 2023, no Jaçanã, Zona Norte de São Paulo. Segundo o Ministério Público, os acusados desembarcaram encapuzados de um carro e executaram com 15 tiros um homem, que estava em outro veículo estacionado. Conforme a denúncia, a vítima também seria praticante de agiotagem e o crime foi motivado por disputa de clientela. O policial militar atuaria como “cobrador” do outro denunciado.

Eduardo Velozo Fuccia / Vade News

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