01/03/2025

Inquérito de estupro de idosa é arquivado por quebra da cadeia de custódia

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News em 01/03/2025 às 07:00

Reprodução
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A cadeia de custódia sucumbiu e o inquérito policial sobre suposto estupro de uma idosa de 85 anos pelo seu sobrinho-neto, de 27, foi arquivado pela Justiça. Diante da inexistência de indícios mínimos de autoria e até de materialidade do hipotético delito para respaldar a propositura de ação penal, a juíza de uma comarca do interior de São Paulo acolheu o pedido do Ministério Público (MP) para o arquivamento do feito.

Acamada em decorrência de um acidente vascular cerebral (AVC) ocorrido há alguns anos, a idosa foi levada pelo sobrinho-neto a um hospital para a realização de exames de rotina. No resultado de um deles, mais precisamente no de urina tipo I, constou a seguinte expressão: “Presença de espermatozoide na alíquota analisada”. Porém, o laboratório descartou o material coletado, inviabilizando a realização de contraprova.

“Acolho a manifestação do representante do Ministério Público e, com base em seus fundamentos, determino o arquivamento dos autos, na fase de inquérito policial, com as ressalvas do artigo 18 do Código de Processo Penal”, decidiu a magistrada. Essa regra processual permite que a autoridade policial realize novas investigações, “se de outras provas tiver notícia”.

“Os elementos informativos contidos nos autos demonstram um conjunto fático-probatório incerto, duvidoso e frágil quanto à autoria/materialidade delitiva e, por isso mesmo, fértil em suposições”, avaliou o promotor do caso. Segundo ele, o oferecimento de denúncia sem a necessária justa causa afetaria o estado de dignidade e liberdade do investigado. “O exercício da ação penal deve ser sério, responsável e convicto”.

Ao citar a gravidade de estupro de vulnerável, punível com reclusão de oito a 15 anos, o representante do MP reforçou a cautela que se deve ter no oferecimento da denúncia, devido às consequências ao acusado. No caso dos autos, o averiguado não chegou a ser preso, mas viveu por cerca de um ano sob a suspeita de ter abusado da tia-avó, sendo-lhe imposta a medida protetiva de urgência de proibição de se aproximar da suposta vítima.

Advogado Renan de Lima Claro

“Estou convicto de que se trata de um resultado falso-positivo do exame de urina. Porém, por causa da impossibilidade de se realizar contraprova pela quebra da cadeia de custódia, em razão do descarte do material coletado pelo laboratório, não será possível comprovar a falha do hospital para responsabilizá-lo na esfera cível, afirmou o advogado Renan de Lima Claro, defensor do sobrinho-neto da idosa.

“No entanto, apenas para argumentar, ainda que se considerasse inquestionável o resultado do exame de urina, ele não traria mínimos elementos para vincular o averiguado à suposta violência sexual”, destacou o advogado. Logo após a detecção de espermatozoide, o laboratório acionou a Guarda Civil Municipal, que, por sua vez, levou o caso ao conhecimento da Polícia Civil.

Além da preservação da cadeia de custódia, nos termos do artigo 158-A do Código Penal, inviabilizada pelo descarte da amostra de urina para contraprova, o delegado requereu exame de corpo de delito para a suposta vítima, cujo laudo afastou qualquer tipo de violência sexual. Por determinação dessa autoridade, também houve a coleta de material na vagina da idosa, cujo confronto genético revelou ser ele da própria examinada.

“O meu cliente realizou doação voluntária de material biológico à Superintendência de Polícia Técnico-Científica para ser submetido a confronto genético, que infelizmente não pôde ocorrer devido à violação da cadeia de custódia. Desde o início, ele colaborou com as investigações e refutou com veemência a prática de qualquer mal à sua tia-avó, demonstrando o seu interesse pela busca da verdade real”, esclareceu Renan.

O investigado disse em depoimento na delegacia ser o responsável por cuidar da tia-avó, como levá-la a médicos e providenciar alimentação e remédios. Quanto à limpeza íntima e banhos, essas tarefas são exercidas por uma cuidadora e, às vezes, pela sua avó, que é irmã da suposta vítima. O sobrinho-neto também informou ser o único homem a frequentar a casa, situação que o colocou no foco da investigação.

Em suas declarações ao delegado, o suspeito também demonstrou surpresa com o resultado do exame de urina que apontou a presença de espermatozoide. Sem indicar alguém que eventualmente pudesse estar envolvido com o caso, ele externou ceticismo quanto à ocorrência de estupro, salientando que, além da idade avançada, a tia-avó é pessoa acamada, não fala de maneira natural e tem grande declínio cognitivo.

Impossibilitada de prestar declarações, conforme atestado médico, a idosa não chegou a ser ouvida pela Polícia Civil. Com o arquivamento do inquérito policial, a defesa do averiguado requereu a revogação da medida protetiva de urgência determinada em seu desfavor. Com o aval do MP, a juíza acolheu o pedido, observando que “não foi demonstrada situação de risco atual” à suposta vítima.

Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News

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