15/03/2018

Homem é agredido na Rodoviária após guarda "confundi-lo" com morador de rua: "Não é coincidência"

Por Noelle Neves/Colaboradora em 15/03/2018 às 16:37

SANTOS – O estudante Cléverson Gonçalves de Oliveira, de 25 anos, planejava fazer uma viagem tranquila para Ribeirão Pires. Ele partiria na manhã do último dia 10 da Rodoviária de Santos, portanto, devido à distância, decidiu ir ao banheiro antes de iniciar a viagem. Voltando, começou a arrumar os documentos em um lugar de fácil acesso na bolsa, para “agilizar o processo de apresentação ao motorista no momento do embarque”. Estava tudo tranquilo, até que o inesperado aconteceu: um segurança, que estava de outro lado da escada, fez um gesto com a mão pedindo para que ele fosse embora da rodoviária.

Ele percebeu, mas decidiu ignorar, afinal “era um espaço público, uma rodoviária com transportes para diversos lugares do Brasil”. “O segurança se aproximou e falou: ‘sai fora, você não me ouviu falar?’. Eu fiquei tenso, perguntei o motivo e ele respondeu que eu era um ‘pedinte’ e que estava pedindo dinheiro e cigarro. Eu argumentei que ele não poderia fazer isso, que estava me estereotipando e subestimando meu corpo”, disse o jovem, em entrevista ao #Santaportal .

Durante o conflito, Cléverson vê uma pessoa negra com o mesmo estilo de roupa que ele estava usando: camiseta, shorts e tênis. A diferença era que aquela pessoa estava em situação de rua. Segundo ele, ao perceber a intenção do comentário do guarda, começou a falar alto: “Racista, não me subestime, quem você pensa que é para achar o que eu sou?”.

O debate avançou e o segurança chamou um colega de trabalho, que defendeu o estudante, dizendo que deveria pedir desculpa. “No meio da discussão, ele gritou ‘sou GCM, fora daqui!, Isso é desacato e posso te prender por isso’, respondi com o mesmo tom afirmando que não adiantava ele se valer da autoridade, já que o que ele estava fazendo era crime, violando a constituição no seu artigo 5°, onde está escrito sobre o direito a liberdade, o direito de ir e vir”, desabafou Oliveira.

A agressão veio em seguida. De acordo com o estudante, o segurança bateu nele três vezes seguidas de cacetete: no braço e no punho. “Mas o foco era minha cabeça. Usei os braços para me defender”, lembrou.

“Eu corri em volta da lanchonete próximo ao banheiro, busquei minha bolsa que estava no local da agressão e voltei gritando e denunciando a todas as pessoas que estava na rodoviária o caso de racismo, a agressão e ação truculenta da vigilância da rodoviária. Logo depois a PM chegou e fomos a delegacia”, declarou Cléverson Oliveira.

Foi aberto um Boletim de Ocorrência e feito um exame de corpo de delito. Os documentos estão com um advogado e será aberto um processo criminal contra o guarda.

Em nota, A CET-Santos informou que o serviço de vigilância no Terminal é terceirizado. A CET irá instaurar procedimento administrativo para apuração dos fatos e adotará as providências cabíveis, uma vez que não compactua com esse tipo de comportamento.

O Conselho Regional de Serviço Social- 9ª Região/São Paulo manifestou solidariedade ao estudante: “Reafirmamos nosso compromisso ético-político por uma sociedade sem discriminação de classe gênero, raça/tnia e condição social, e repudiamos qualquer tipo de atentado violento, aterrorizante, vexatório, constrangedor, produzido pela manifestação do racismo, preconceito étnico-racial expressos em linguagens insultuosas, ataque físico e extermínio. Nossas lutas são pela equidade de raça, etnia e pela política de igualdade racial!”

Cléverson postou sobre o ocorrido em uma rede social. O desabafo do estudante viralizou e, desde então, vem recebido muito apoio: “Agradeço a todas as pessoas que se dispõe a denunciar o racismo”, concluiu.

Confira a publicação de Cléverson Oliveira, o Ketinho, na íntegra:
“Não é coincidência é racismo.
Hoje ao voltar para visitar minha familia e amigos, me supreendo pela manha por mais um caso de racismo, é o racismo existe sim.
Pela manhã comprei passagem de ônibus na rodoviárias de Santos, com destino a Ribeirão Pires, ao ver o avançar da hora decidi ir ao banheiro para fazer uma viagem mais tranquila e segura. Ao sair do banheiro arrumei minha bolsa e preferi deixar o documento em um lugar de facil acesso na bolsa, para agilizar o processo e chegar logo para os compromissos que aguardava ansiosamente (O chá do ZURI) Porém foi diferente, e mais uma vez alvo de um estereótipo marginalizado, subjulgado e criminalizado – esse é o corpo negro – O segurança que estava de outro lado da escada faz um gesto com a mão a fim de eu me retirar daquele espaço (espaço público: Uma rodoviária com transportes para diversos lugares do Brasil) notei o gesto, continuei arrumando minha bolsa, em seguida o segurança se aproxima e diz: Sai fora, você não ouviu EU FALAR.
Tensionei perguntando por qual motivo deveria me retirar daquele espaço, o segurança me responde dizendo que eu era “PEDINTE” estava pendindo dinheiro e cigarro…
Imediatamente percebi que a atitude foi racista (O território que se localiza a rodoviária tem um número grande de pessoas negligenciadas pelo estado em situação de rua) ELE ATRIBUIU TODOS OS PADRÕES DE PESSOAS QUE CIRCULAM POR AQUELE ESPAÇO A MIM, Detalhe: não era minha roupa, meu cheiro, meu corpo e nem qualquer adjetivo ou padrões atribuido para as pessoas em situação de rua; O foco foi a cor da minha pele!!!
Quando percebo essas condições de subestimação do meu corpo negro, começo a falar alto e em bom tom: Racista, não me subestime, quem você pensa que é para achar o que eu sou. O debate foi avançando e o mesmo não reconhecia seu erro até que chamou mais um segurança, se sentiu mais confiável e me agrediu batendo com o cacetete 3 vezes, no meu braço e no punho, mas o foco era minha cabeça.
Foi triste, hoje o dia que deveria ser muito bom me trará marcas para uma vida inteira. As dores que agora sinto, jamais serão barreiras para minhas lutas…
Os procedimentos na “justiça” foi tomado, agora aguardar a velocidade do judiciário brasileiro.
Gratidão as pessoas que me deram esse grande apoio, em especial Beatriz e Matheus
Avante e afronte!
#ORacismoNãoVaiPassarEmBranco”

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