No adeus ao Rei, multidão busca palavras para descrever a grandeza de Pelé
Por Luciano Trindade, Klaus Richmond e Fábio Pescarini/Folha Press em 03/01/2023 às 06:00
O baiano Antônio da Paz, 69, o ítalo-suíço Gianni Infantino, 52, o paulista Emílio Carmo, 58, o paraguaio Alejandro Domínguez, 50, a brasiliense Adriana Bonfim, 53 e o catarinense Paulo Roberto Falcão, 69.
Pessoas de várias partes do mundo. Das mais diversas áreas. De diferentes gerações, religiões e crenças. Do ajudante de vendedor ambulante, ao presidente da Fifa. Autoridades políticas, jogadores do passado e do presente. Torcedores do Santos ou não.
Todos que passaram pela Vila Belmiro nesta segunda-feira (2) tiveram a mesma dificuldade: definir a importância de Edson Arantes do Nascimento, o Pelé.
A simples presença de cada um deles no velório do Rei do futebol é uma das formas de expressar a grandiosidade do único jogador na história a conquistar três Copas do Mundo.
Desde o começo da madrugada, filas começaram a se formar no entorno da Vila, onde o corpo de Pelé é velado.
Durante o dia, mesmo sob um sol de quase 30°C, as filas chegaram a passar de 1,5 km, ocupando ruas no entorno do estádio.
Alguns levaram até três horas só para entrar no local. Segundo o Santos, mais de 27 mil pessoas passaram pelo gramado para prestar uma última homenagem até o início da noite desta segunda.
No último dia 29, aos 82 anos, o ex-jogador morreu em decorrência de insuficiência renal, insuficiência cardíaca, broncopneumonia e adenocarcinoma de cólon. Ele havia ficado internado por um mês no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
A notícia causou comoção no mundo inteiro. Homenagens surgiram das mais diversas formas. No velório do Rei, muitos buscaram a chance de se aproximar do corpo dele pela última vez, fazer um aceno, fixar o olhar e marcar presença na cerimônia de adeus.
Em caixão aberto, coberto por uma bandeira do Brasil e outra da cidade mineira de Três Corações, onde nasceu, Pelé ocupava pela última vez o gramado do clube que lhe deu projeção internacional.
O espaço estava sob escolta da Guarda da Câmara Ardente, formada por cadetes do último ano da Academia de Polícia Militar do Barro Branco, responsáveis por guardar o corpo de autoridades e personalidades.
Coberto por uma tenda, o local foi dividido em duas áreas, uma externa, por onde os admiradores e curiosos circulavam em uma fila ininterrupta, e outra parte interna, mais reservada, onde a família do Rei recebia as condolências de amigos, autoridades, ex-jogadores, entre outros.
Nos últimos dias de vida, Pelé também esteve cercado por sua família, incluindo os netos Octávio Felinto Neto, 24, e Gabriel Arantes do Nascimento, 22, filhos de Sandra Regina Arantes do Nascimento Felinto. Apenas após batalha judicial, em 1996, ela só foi reconhecida como filha e herdeira de Pelé.
Ao chegar ao velório do avô, eles afirmaram terem perdoado ele momentos antes de sua morte. “Os últimos momentos foram muito bons, apesar de tristes”, disse Gabriel. “Esse é o legado que tem que ser deixado. O perdão e o amor vencem todas as coisas”, acrescentou Octávio.
Além deles, os filhos de Pelé Edinho e Maria Lúcia, além de outros familiares, foram juntos à Vila.
Márcia Aoki, viúva do ex-jogador, com quem ele se casou em 2016, chegou ao local nas primeiras horas da manhã, mas preferiu manter o silêncio. Ao lado do corpo, chorou.
O presidente da Fifa, Gianni Infantino, passou pela mesma entrada, no portão 15 da Vila, pouco depois da chegada de Márcia. E tentou definir o Rei. “O Pelé era uma lenda e foi um presente dos deuses para dar emoções para as pessoas.”
O dirigente, que foi ao estádio acompanhado dos presidentes da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Ednaldo Rodrigues, e da Conmebol, Alejandro Domínguez, disse, ainda, que vai “pedir para que todos os países do mundo tenham pelo menos um estádio com o nome do Pelé”.
Em outro canto do estádio, no setor destinado aos fãs, o pintor Emílio Carmo, morador da Casa Verde, em São Paulo, recordou-se de um jogo do Santos que ele assistiu no antigo Palestra Itália, estádio do Palmeiras. “O Santos empatou em 1 a 1 com o Palmeiras, com gols de Pelé e Ademir da Guia, olha que privilégio eu tive.”
Recém-empossado, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), disseram ao chegar à Vila Belmiro que todas as homenagens ao ídolo serão insuficientes para descrever a importância dele para os brasileiros.
Os dois, assim como o prefeito de Três Corações, João Roberto de Paiva Gomes (PSD), afirmaram também que estudam novas formas de homenagear o Rei, mas não citaram nenhum projeto concreto.
Até para eles era difícil dimensionar a representatividade do ídolo mundial, que se acostumou a atrair multidões por onde passou.
Muitos ainda terão a oportunidade de se arriscar na busca pelo adjetivo mais adequado, já que o velório se estenderá até às 10h desta terça-feira (3), quando é esperada a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Por outro lado, algumas ausências serão sentidas, como Neymar. O ex-jogador do Santos e atual camisa 10 do Paris Saint-Germain pediu para seu pai representá-lo.
Depois do velório, o corpo seguirá em cortejo para o cemitério vertical Memorial Necrópole Ecumênica. No caminho, passará pelo canal 6, onde mora a mãe de Pelé, Celeste Arantes.
A flamenguista Adriana Bonfim, moradora de Brasília, veio a Santos para acompanhar toda a cerimônia. “Vim por tudo que ele representou para o país.”
Paulo Roberto Falcão, último treinador da carreira do ex-camisa 10, no jogo entre Brasil e um combinado do mundo inteiro, em outubro de 1990, foi quem mais se aproximou de uma definição para o craque. “O Pelé é tudo. Se define assim.”