TJ-SP exime Guarujá de indenizar dono de casa destruída em área de proteção
Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 02/12/2024 às 16:00
A edificação de moradia em área de proteção permanente, identificada pela Defesa Civil como sendo também de risco, exime o município de responsabilidade por eventual destruição do imóvel em decorrência de eventos da natureza.
Por quatro votos a um, a 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) adotou esse posicionamento para prover o recurso de apelação do Município de Guarujá e reformar a sentença que o condenou por danos material e moral.
Um munícipe ajuizou a ação sob a alegação de que sofreu prejuízos materiais e abalo psíquico e emocional pela destruição de sua moradia, localizada no Morro da Vila Baiana. A perda do imóvel ocorreu em razão de deslizamento de terra causado por fortes chuvas que assolaram Guarujá entre os dias 2 e 5 de março de 2020, causando 34 mortes.
O juiz Cândido Alexandre Munhóz Pérez, da Vara da Fazenda Pública de Guarujá, julgou a demanda parcialmente procedente, condenando o Poder Público municipal a ressarcir o autor em R$ 30 mil por danos materiais e a indenizá-lo em R$ 20 mil por danos morais.
Em sua apelação, o Município de Guarujá sustentou que tomou medidas para evitar a ocupação irregular em área de risco geológico, alertou os moradores para que deixassem o local e inseriu o autor em programa de locação social da Prefeitura.
Segundo o recorrente, o autor recebeu auxílio-moradia emergencial de convênio firmado com o Estado e a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano. Por fim, defendeu que a ocupação indevida de bem público configura mera detenção, insuscetível de indenização, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O desembargador Fernão Borba Franco, relator da apelação, afastou eventual conduta omissiva do recorrente. “Aliás, sequer poderia haver, dada a natureza ilícita da própria ocupação, alheia a qualquer possibilidade de planejamento”.
O relator acrescentou que, “dada a ocorrência de chuvas extremas e imprevisíveis, e a irregularidade da ocupação, com edificação de moradia na encosta de morro, não se vislumbra planejamento urbanístico capaz de aplacar os danos vivenciados”.
O artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, que versa sobre a responsabilidade civil do Estado ou de quem lhe faça as vezes, foi utilizado por Franco na fundamentação do seu voto. A regra exige nexo causal entre o dano e o comportamento omissivo ou comissivo estatal para responsabilizar o ente público.
Porém, no caso em exame, o relator pontuou que não houve nexo causal, mas culpa exclusiva da vítima, “que estabeleceu sua moradia em ocupação irregular em área de proteção permanente, e identificada pela Defesa Civil municipal como área de risco”.
Desse modo, conforme Franco, o apelante não descumpriu dever legal e nem pôde impedir o evento danoso com atuação diligente, porque o autor construiu sua casa irregularmente e as consequências de seu ato não podem ser atribuídas ao Município.
Os desembargadores Eduardo Gouvêa, Luiz Sergio Fernandes de Souza e Francisco Shintate acompanharam o relator para reformar a sentença, julgando os pedidos autorais improcedentes. Na inicial, o munícipe que teve a casa atingida pelo deslizamento havia pleiteado R$ 100 mil e R$ 111 mil por danos morais e materiais, respectivamente.
Voto divergente
O único voto contrário à decisão majoritária do colegiado foi o da desembargadora Mônica Serrano. Segundo ela, o Município sabia da ocupação da área de risco, com grande potencial para deslizamentos de terra, devendo a sua condenação ser mantida.
“Seria seu dever realizar a efetiva desocupação da área com a retirada dos moradores e realocação em moradias dignas, o que não foi feito. Nesse ponto é que reside a omissão específica do Município que atrai a responsabilidade objetiva”, sustentou a julgadora.
“As pessoas não escolhem ocupar áreas de risco por recreação, mas por extrema necessidade e falta de opção de moradia digna. Aliás, o direito à moradia digna, inobservado pelo Município, possui envergadura constitucional e convencional”, concluiu Serrano.
* Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News