Papa Leão 14 vai à Turquia e ao Líbano, em sua 1ª viagem fora da Itália
Por Michele Oliveira/Folhapress em 27/11/2025 às 09:32
O papa Leão 14 começa nesta quinta (27) sua primeira viagem fora da Itália desde que foi eleito, em maio. Serão quase quatro dias na Turquia, seguidos por dois dias no Líbano. Na primeira etapa, um dos momentos mais importantes deverá ser sua visita à cidade onde aconteceu, há 1.700 anos, o primeiro concílio ecumênico cristão.
A viagem para a celebração do Concílio de Niceia é uma continuidade com o programa do papa Francisco, que tinha falado publicamente sobre a vontade de ir à Turquia neste ano. O pontífice argentino morreu em abril.
Ocorrido no ano 325 na cidade que hoje se chama Iznik, a cerca de 140 km de Istambul, o concílio foi fundamental na história do cristianismo. Foi convocado pelo imperador romano Constantino 12 anos após ele ter liberado a fé religiosa, colocando fim à perseguição aos cristãos, e reuniu cerca de 300 bispos.
A tarefa principal era encontrar fórmulas dogmáticas que resolvessem divergências entre religiosos que tinham vindo à tona após a liberdade de culto e o maior confronto entre os grupos. O temor de Constantino era que as fraturas entre os cristãos pudessem ameaçar a união do império.
O tema mais polêmico era ligado à identidade de Jesus e sua ligação com Deus. Em Alexandria, no Egito, o presbítero Ário dizia que o filho era subordinado ao pai e que não eram a mesma pessoa, dando a entender aos fiéis que Jesus era um Deus inferior.
“Que significa filho de Deus? O Concílio de Niceia responde que ele é da mesma substância do Pai, gerado e não criado. Que o filho é Deus de Deus, luz da luz”, diz Ilaria Vigorelli, professora de teologia dogmática da Pontifícia Universidade da Santa Cruz, em Roma. “A coisa mais importante foi a confirmação, do ponto de vista teológico, da fé trinitária da Igreja, o fato de que ela celebrasse o batismo em nome do Pai, do Filho e do Espiríto Santo.”
Do concílio surgiu o Credo Niceno depois aprimorado no encontro de Constantinopla, em 381, um dos principais legados até hoje. A oração costuma ser recitada em missas solenes da Igreja Católica, enquanto, no dia a dia, é usado o Credo Apostólico, mais curto. O Credo Niceno é um símbolo comum a católicos, ortodoxos, protestantes, anglicanos e outros. “É um sinal de reconhecimento entre cristãos”, afirma a professora.
“O Concílio de Niceia é atual pelo seu altíssimo valor ecumênico”, escreveu o papa Leão 14 na carta apostólica “In unitate fidei” (na unidade da fé), divulgada no domingo (23), em que comenta a importância do evento. “O que nos une é muito mais do que o que nos divide. (…) O Credo de Niceia nos propõe um modelo de verdadeira unidade na legítima diversidade.”
A programação de Leão 14 na Turquia prevê uma oração ecumênica em Iznik, perto dos restos arqueológicos de uma basílica construída no século 4, após o primeiro concílio, e ao menos dois encontros com o patriarca Bartolomeu, representante da Igreja Ortodoxa.
Se a ida à Turquia é um legado do antecessor, a escolha do Líbano tem sido entendida como parte dos esforços do americano Robert Prevost pela paz no Oriente Médio. As menções aos conflitos na região são frequentes e, logo no início da sua primeira fala como papa, ele fez apelos por uma “paz desarmada e desarmante”.
Além de autoridades, está na agenda um encontro ecumênico e interreligioso na praça dos Mártires, em Beirute. No país existem 18 comunidades religiosas ativas, uma referência de convivência plural na região. A visita ocorre após ataques de Israel contra um campo de refugiados palestinos no sul do país.
A partir de Paulo 6º (1897-1978) e principalmente com João Paulo 2º (1920-2005), as viagens internacionais assumiram papel importante para os pontificados, seja do ponto de vista pastoral, com a intenção de se aproximar dos fiéis, seja pelo aspecto simbólico e diplomático. A escolha dos destinos costuma se relacionar com os temas prioritários do pontífice.
Com 47 viagens em 12 anos, para quase 70 países, Francisco fez seu primeiro deslocamento internacional para o Rio de Janeiro, onde participou da Jornada Mundial da Juventude, quatro meses após sua eleição, em 2013. Dias antes, ele tinha ido a Lampedusa, ilha italiana que é símbolo da crise migratória do mar Mediterrâneo, um dos temas a que Francisco se dedicou.
Uma semana antes do primeiro embarque além do Vaticano e das fronteiras italianas, Leão 14 esteve em Assis, no centro da Itália, na primeira vez que saiu da região de Roma, o Lácio. Ainda não foram anunciadas novas viagens, mas o americano disse nos últimos dias que pretende ir, em 2026, para Portugal e América Latina, citando México, Uruguai, Argentina e Peru, onde viveu por mais de 20 anos. Sem menção, por enquanto, ao Brasil.
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Viagem Papa Leão 14
Quinta-feira (27/11)
Partida de Roma para Ancara, com chegada prevista às 12h30 locais (6h30 de Brasília)
Visita ao mausoléu de Ataturk, fundador da República da Turquia
Visita ao presidente Recep Tayyip Erdogan
Encontro com autoridades e corpo diplomático
Sexta-feira (28/11)
Em Istambul, oração com religiosos católicos na catedral do Espírito Santo
Em Iznik, antiga Niceia, oração ecumênica perto das ruínas da antiga basílica de São Neófito
Sábado (29/11)
Em Istambul, visita à mesquita Sultan Ahmet
Encontro com líderes cristãos na igreja ortodoxa siríaca de Mor Ephrem
Oração na igreja patriarcal de São Jorge
Encontro com o patriarca Bartolomeu
Missa na Volkswagen Arena
Domingo (30/11)
Em Istambul, visita à catedral Armênia Apostólica
Discurso na igreja patriarcal de São Jorge
Almoço com o patriarca Bartolomeu
Em Beirute, visita ao presidente Joseph Aoun
Encontro com outras autoridades do Líbano
Segunda-feira (1º/12)
Em Annaya, visita ao monastério de São Maroun
Em Harissa, encontro com religiosos católicos
Em Beirute, encontro ecumêmico e interreligioso
Em Bkerké, encontro com jovens em frente ao Patriarcado Maronita de Antioquia
Terça (2/12)
Em Jal ed Dib, visita ao hospital De la Croix
Em Beirute, oração no lugar da megaexplosão ocorrida em 2020 na região portuária
Missa no Beirut Waterfront