26/11/2025

Morre aos 100 anos o jurista José Afonso da Silva, marco do direito constitucional

Por Renata Galf e João Pedro Abdo/ Folha Press em 26/11/2025 às 18:49

Divulgação
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Considerado uma das principais referências no direito constitucional brasileiro, o jurista e professor emérito da USP (Universidade de São Paulo) José Afonso da Silva morreu nesta terça-feira (25), aos 100 anos.

Autor de mais de 30 obras, José Afonso foi apontado em levantamento de 2013 como o doutrinador mais citado em decisões do STF (Supremo Tribunal Federal).

Ao completar 100 anos em 2025, foi homenageado por grandes nomes do direito brasileiro, como pelo então presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, durante sessão da corte e também pela ministra Cármen Lúcia, em sessão no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sob sua presidência.

Natural do interior de Minas Gerais, José Afonso chegou a São Paulo em 1947, aos 22 anos, sem ter concluído o ensino primário. Na capital paulista, trabalhou como alfaiate enquanto completava os estudos.

Ingressou na Faculdade de Direito da USP aos 27 anos, depois de ter sido aprovado no vestibular. Mais tarde se tornou professor titular da instituição, onde lecionou até 1995. Em 2025, uma semana antes de celebrar seu centenário, recebeu o título de professor emérito.

Lançado em 1976, seu livro “Curso de Direito Constitucional Positivo” chegou à 46ª edição em 2025. “Esse é um livro que me agrada”, disse em entrevista à Folha de S.Paulo por ocasião de seus 100 anos, depois de contar que teve bastante trabalho para atualizar a obra com a Constituição de 1988. Sua obra favorita, por outro lado, conforme contou na data, era o livro “Aplicabilidade das Normas Constitucionais”, publicado em 1968.

Na Assembleia Constituinte, foi assessor do senador Mário Covas, então líder do PMDB. O jurista é descrito por seus pares como um dos grandes arquitetos da Constituição aprovada em 1988.

José Afonso atuou ainda como procurador do Estado de São Paulo e ocupou cargos públicos, como o de secretário de Segurança Pública, no governo Mário Covas (PSDB).

Em celebração por seus 100 anos, ele foi homenageado em evento na Faculdade de Direito da USP marcado por discursos emocionados. Entre os presentes estiveram Luís Roberto Barroso, então presidente do STF, e José Carlos Dias, ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Ao discursar, Barroso descreveu José Afonso como um dos principais cérebros por trás da Constituição de 1988 e afirmou que seu trabalho representou uma “virada de chave” no direito constitucional, trazendo uma lógica que seria de “fazer a Constituição funcionar”.

Barroso, que chegou a mostrar a José Afonso um de seus livros escritos pelo professor cheio de marcações e se emocionou em determinado momento. Citou ainda a ditadura militar, dizendo que o jurista “manteve a chama do direito constitucional acesa quando se via no Brasil um momento de muita escuridão”.

Oscar Vilhena, que é professor da FGV Direito, descreveu José Afonso no evento como “arquiteto jurídico” da Constituição de 88. “Sem risco de errar, o livro é um divisor de águas e um marco no direito constitucional.”

Em 2022, José Afonso se emocionou ao ser homenageado durante ato em defesa da democracia inspirado na célebre “Carta aos Brasileiros”, lida em 1977 e da qual ele também foi signatário.

José Afonso teve três filhos. Um deles, Virgílio Afonso da Silva, seguiu os passos do pai e é professor de direito na USP. Também é pai de Helena Augusta Afonso e Nereu Afonso da Silva.

Manteve escritório por décadas no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo, que abrigava sua biblioteca pessoal, da qual parte foi doada ao acervo da faculdade da USP. Ao chegar aos 100 anos, ele seguia visitando o local, onde antes trabalhava diariamente, para consulta quando necessário.

Durante a entrevista à Folha de S.Paulo em 2025, sua filha Helena Augusta que também estava presente, contou que o pai seguia revisando as próprias obras. “A gente liga na casa dele, às vezes nove e meia, dez horas, e pergunta ‘tá tudo bem, pai’? [E ele diz:] ‘Tô trabalhando'”, conta. “É que o chefe dele é realmente muito bravo, né, pai? Seu chefe é muito exigente”, brincou ela à época.

“O pior é que ele não paga bem”, arrematou o pai, na ocasião, ao que todos riram. Questionado então sobre a frequência com que ainda trabalhava, ele deu uma breve risada, antes de responder: “Eu trabalho todo dia”. Contou também que pelas manhãs e à noite reservava cerca de 20 minutos para meditar, prática que já levava consigo há algumas décadas.

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