22/04/2024

Funcionamento do Pix corre risco com falta de investimentos no BC, diz Campos Neto

Por Júlia Moura/ Folha Press em 22/04/2024 às 15:19

Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, discursa durante cerimonia de sanção da Lei da Autonomia do Banco Central
Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, discursa durante cerimonia de sanção da Lei da Autonomia do Banco Central

Em nova defesa da autonomia financeira do Banco Central, o presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, se diz preocupado com a queda no orçamento da instituição e com seus possíveis efeitos práticos, como na operação do Pix.

“Neste ano, nosso orçamento de investimentos foi de R$ 15 milhões, isso é um quinto do que foi há cinco anos. Chegamos ao risco de alguma hora falar ‘como é que a gente vai conseguir fazer rodar o Pix?'”, disse Campos Neto durante evento em São Paulo nesta segunda-feira (22).

Segundo o presidente do BC, as paralisações dos funcionários do BC por ajustes salariais e mais contratações já atrasa a implementação da agenda digital da instituição, que inclui avanços no Pix e a criação do Drex, moeda digital ainda em fase de testes.

Outro argumento de Campos Neto em favor da PEC (proposta de emenda à Constituição) 65, seria a possibilidade de o BC, com uma empresa pública com autonomia fiscal e orçamentária, estabelecer contratos com empresas privadas de “gestão dividida”.

“Por exemplo, no Drex eu tenho ajuda de várias empresas, da Microsoft, da Parfin, e, para fazer os contratos é muito difícil, porque a máquina pública não programou esse tipo de contrato que precisamos na gestão moderna”, disse Campos Neto.

Questionado sobre se a PEC tem apoio do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Campos Neto disse que é necessário esclarecer alguns pontos.

“O ministro [Fernando Haddad] tem falado que não é conta, mas que precisa esclarecer alguns pontos. E no Legislativo, no Senado, eu tenho sentido uma boa vontade para aprovar”, afirmou o economista.

Sobre a transição no comando do BC ao fim deste ano, Campos Neto voltou a dizer que será um processo “suave” e “construtivo”, e que espera que a agenda de digitalização da autarquia continue sob seu sucessor.

“O Banco Central tem todos os ingredientes para ter uma continuidade nas políticas que a gente está fazendo. Os técnicos do BC são muito bons, e qualquer um que entra no BC rapidamente entende que grande parte do que a gente faz vem de uma trilha mais antiga e que tem aspectos técnicos que preponderam”, afirmou.

Quando questionado sobre o seu começo no comando da autarquia, Campos Neto disse ter sentido receio de não estar apto para o cargo.

“Eu tinha um grande temor de não estar preparado para aquilo. Quando sentei na cadeira, a primeira coisa que pensei foi ‘por que estou aqui?’, ‘será que tenho capacidade de estar aqui?’ e aí com o tempo você vai aprendendo. Contei com muita gente boa no BC que me ajudou. Fizemos o Pix no meio da pandemia, com as pessoas trabalhando de madrugada, eu aprendi muito com eles.”

Risco Fiscal

Segundo o presidente do BC, o risco fiscal dos países estará cada vez mais sob o holofote de investidores, pois a realidade fiscal dos países estaria descolada da política monetária em todo o mundo.

“Principalmente nos Estados Unidos, Europa e Japão. Se somarmos [os três], isso mais ou menos dá dois terços da dívida soberana mundial. E se ela custava 1% para rolar, agora custa 3%. Além disso, essa dívida subiu 25% durante a pandemia. Em algum momento, a sustentabilidade da dívida vai virar um tema e o fiscal vai ficar mais no foco”, disse Campos Neto.

Com relação ao Brasil, o economista avalia que o país está “um pouquinho pior que a média” em relação aos pares emergentes para investidores estrangeiros.

“Mas o Brasil teve suas peculiaridades. [O mercado brasileiro] tem bastante peso em empresas estatais, e teve um ruído do governo nelas. E os nossos juros são mais altos, então você tem uma taxa de desconto mais alta, a perspectiva de que o risco de prêmio que entra na Bolsa pela parte fiscal tem piorado um pouquinho também”, disse o economista.

“No final das contas, se você olha que o Brasil tem um juro de longo prazo que paga acima de 6%, isso explica um pouco por que a Bolsa não sobe. Você tem aí uma âncora pesada para carregar. Isso não tem nada a ver com o Banco Central, isso é uma percepção de risco do Brasil”, afirmou Campos Neto.

Atualmente, a Selic está a 10,75% ao ano, após uma série de cortes promovidos pelo Banco Central. A taxa básica de juros de dois dígitos tem sido alvo de críticas do governo Lula, que também criticou nominalmente Campos Neto pelos juros altos.

Nesta segunda, Campos Neto também voltou a dizer que o aumento no nível de incerteza, especialmente com relação à política monetária americana, leva a uma menor previsibilidade para os próximos cortes na Selic.

“Um cenário é essa incerteza diminuir, e a gente voltar para a nossa forma de atuação [ritmo de cortes na Selic] que a gente tinha começado. Um outro cenário é esse aumento de incerteza ficar mais tempo, e criar ruídos crescentes e aí a gente tem que trabalhar em como é que vai ser o ritmo, se a gente o diminui”, disse.

Na última semana, os investidores passaram a precificar corte de apenas 0,25 ponto percentual na Selic em maio, não de 0,50 ponto percentual, como vinha indicando o BC em suas comunicações mais recentes.

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