CNU avança em diversidade racial, mas baixa aprovação de mulheres decepciona
Por Luany Galdeano/Folhapress em 06/02/2025 às 11:36
![Bruno Peres/Agência Brasil](https://santaportal.com.br/wp/wp-content/uploads/2025/01/CNU.webp)
A aprovação de pessoas negras, indígenas e com deficiência no CNU (Concurso Nacional Unificado) supera o previsto pela lei de cotas e mostra avanços na política de diversidade do setor público federal, segundo especialistas. Por outro lado, a entrada de mulheres aquém do esperado pode postergar metas de equidade de gênero, sobretudo em cargos de liderança.
Mulheres foram 56% dos inscritos no certame, mas só 37% entre os classificados. Ainda que as candidatas tenham tido uma taxa de desistência superior à dos homens, elas foram maioria entre quem fez a prova, de acordo com a ministra Esther Dweck, de Gestão e Inovação.
A ministra diz que a pasta vai se debruçar sobre os dados para entender os motivos da baixa aprovação feminina. “Estamos comparando com outros concursos e já vimos que, em algumas dessas carreiras [que estiveram no CNU], o percentual de mulheres aprovadas era inferior a esse, então talvez tenha sido um aumento, não uma redução.”
Para especialistas, mulheres ainda enfrentam dificuldade para conciliar os estudos com a jornada tripla, que mistura o cuidado com filhos e o trabalho dentro e fora de casa. Por isso, saem em desvantagem, sobretudo em concursos que exigem dedicação em tempo integral.
“Sabemos que as mulheres já são maioria nas universidades. Há um paradoxo no resultado do CNU neste aspecto, mas é preciso ressaltar que historicamente elas exercem uma jornada mais exaustiva que a dos homens e que isso pode comprometer o tempo de dedicação que os concursos exigem”, diz Elaine Reis, mestre em administração pública pela FGV.
O bloco 5, de carreiras de educação, saúde, desenvolvimento social e direitos humanos, é o único que teve mais mulheres classificadas do que homens. Nos demais, a classificação ficou abaixo de 42% -o menor foi no bloco 2, de tecnologia e dados, em que a aprovação feminina ficou em 8,4%.
“Mulheres ainda estão restritas às carreiras relacionadas ao cuidado, que sabemos que, em sua maioria, têm uma remuneração menor”, afirma Renata Vilhena, presidente do conselho do Instituto República.org, dedicado à melhorias no setor público.
A carreira com maior salário inicial do CNU foi de auditor-fiscal do trabalho, que receberá R$ 22.921,71. O cargo estava inserido no bloco 4, em que apenas 35,6% dos aprovados são mulheres.
Para especialistas, também houve avanços na diversidade regional, apesar da taxa de aprovação menor na região Norte do país. Eles compõem 8,5% da população brasileira segundo dados do IBGE, mas somam apenas 5,6% dos que passaram no certame.
No centro-oeste, o percentual de classificados, puxado por candidatos no Distrito Federal, fica acima da demografia do país: a região tem 8% da população, mas representa 25,6% dos aprovados. Ao todo, candidatos de 908 cidades passaram na prova -16% do total de municípios do país.
Já entre cotas raciais e para pessoas com deficiência, os avanços foram mais significativos, de acordo com especialistas. O total de aprovados superou o de inscritos: pretos e pardos, por exemplo, foram 18,8% dos candidatos, mas 24,5% dos classificados. Já as pessoas com deficiência foram 2,06% dos inscritos e 6,8% dos aprovados. Além das vagas reservadas por cotas, essas pessoas também ocuparam posições em ampla concorrência.
“A lei garante 20% de cotas para pessoas negras, mas esses 20% acabaram se tornando uma meta, e não um mínimo. O CNU foi capaz de romper com isso”, afirma Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, voltado à gestão de pessoas no setor público.
Indígenas foram 0,46% dos candidatos e 2,29% dos aprovados, impulsionado pelas ações afirmativas na Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), que previa uma reserva de 30% das vagas para esse grupo. Ainda que considere isso um avanço, Jessika defende ampliar a presença de indígenas para outros órgãos públicos.
“É interessante ter a diversidade em outras pastas, senão caímos na mesma ideia por trás dos estereótipos relacionados a mulheres, que ocupam apenas pastas que se referem ao cuidado”, diz.
Com a entrada desses servidores no setor público, as especialistas dizem que é preciso investir na inclusão para o dia a dia de trabalho, buscando garantir uma melhor experiência para grupos que representam a diversidade.
“Essas pessoas vão entrar na administração pública e não podem enfrentar no seu ambiente de trabalho as mazelas que já enfrentam na sociedade brasileira. É preciso empreender programas que visem a inclusão e a permanência desses grupos”, afirma Jessika.