Vice de Tarcísio responde por suspeita de improbidade e processa opositores
Por Carolina Linhares e Artur Rodrigues / Folha Press em 23/08/2022 às 08:35
Candidato a vice-governador na chapa de Tarcísio de Freitas (Republicanos), o ex-prefeito Felício Ramuth (PSD), 35, responde a uma ação de improbidade por sua atuação como empresário e acumula uma série de processos abertos por ele contra pessoas que o criticam na internet.
Felício foi eleito prefeito de São José dos Campos (SP) em 2016 e foi reeleito em 2020, mas renunciou neste ano para concorrer ao Governo de São Paulo -acabou desistindo para apoiar Tarcísio.
Em janeiro passado, após militar por 28 anos no PSDB, ele ingressou no PSD, de Gilberto Kassab.
Felício foi acusado pelo Ministério Público por suspeita de improbidade administrativa depois que sua empresa e uma empresa que ele representava venceram licitações supostamente direcionadas na Prefeitura de Praia Grande (SP) entre 2014 e 2016.
Em 2020, o juiz Enoque Cartaxo de Souza, do foro de Praia Grande, rejeitou a ação, mas o Ministério Público recorreu. Em junho passado, os desembargadores da 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo determinaram que a ação seja retomada em sua origem.
As três licitações para fornecer softwares à prefeitura, vencidas pela CSJ Sistemas ou pela Direct Serviços Digitais, não tiveram outras concorrentes. Felício era representante da CSJ e dono da Direct, que hoje tem como sócios sua mulher e seu pai.
O Ministério Público lista entre as suas suspeitas o fato de que, na licitação vencida pela Direct, cujo pregão foi realizado em 30 de dezembro, a empresa deu um lance 125% maior do que o preço do contrato anterior.
Felício afirma que a ação não tem relação com sua atuação como prefeito e que teve motivação política, pois foi aberta quando ele liderava a eleição para a prefeitura em 2016.
“Não foi especificado nos autos qualquer ato que Felício tenha efetiva e pessoalmente praticado e que seja doloso, ilegal ou causador de dano ao erário”, diz a assessoria do ex-prefeito à reportagem.
A de 1º grau, diz a nota, reconheceu que as empresas “preencheram as exigências do edital, apresentaram proposta mais vantajosa e sagraram-se vencedoras, não vislumbrando envolvimento em ato de improbidade”.
Em boa parte das ações envolvendo o ex-prefeito, no entanto, Felício figura como autor -a reportagem identificou ao menos 15 processos, entre 2017 e 2022, que ele moveu contra pessoas e páginas na internet para remoção de conteúdo, pagamento de danos morais e acusação de calúnia, injúria e difamação.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, autoridades têm processado cidadãos comuns por críticas que não chegam a dez curtidas. Foi o caso da publicação de Maria José Scamilla Jardim, contrária à reabertura do comércio na pandemia de Covid-19 e mãe de uma juíza que havia tomado decisão contrária à retomada de atividades no município.
“Prefeito de São José dos Campos, do PSDB, vai reabrir o comércio antes do dia das mães. Está claro de que lado o vagabundo está”, disse ela em post que tinha quatro curtidas quando foi levado à Justiça. Ela foi condenada a apagar a publicação e a pagar R$ 2.000 em danos morais -há recursos em tramitação.
Já a expressão “capacho do empresariado”, usada por ela em outra publicação, não extrapolava os limites do direito à crítica, segundo a decisão.
Na ação em que é acusada de difamação e injúria, Maria José obteve uma primeira decisão favorável. O juiz argumenta que ela agiu “com a intenção de censurar o comportamento que atribui ao querelante [Felício] enquanto agente político, estando claro que não se trata de ataque pessoal, mas à figura do prefeito”.
Os detratores do ex-prefeito foram obrigados a excluir as publicações e a pagar danos morais na maior parte dos processos em que já houve sentença.
Felício já teve direito a receber ao menos R$ 32 mil em oito ações na primeira instância. O ex-prefeito informou que as indenizações são doadas a entidades sociais.
Parte das publicações contém xingamentos (“felixo”, safado, vagabundo, puxa-saco), montagens ou charges e também acusações, que o ex-prefeito enquadra como fake news (de calote, superfaturamento, emprego de aliados, corrupção).
A maioria dos posts vem de uma página de crítica e de um opositor que hoje é candidato a deputado federal -uma das publicações alcançou 250 curtidas.
“Aqueles que defendem esse lixo do Felixo deve ser amiguinho, comissionado, ter parentes lá dentro com medo de perder a vaguinha”, diz outra publicação, que teve a exclusão determinada pela Justiça e que custou R$ 3.000 de danos morais à autora.
No entanto, há publicações elencadas por Felício que não apresentam xingamentos: “Obrigado por votarem em mim. Vou retribuir com mais radares”, diz uma publicação com a foto dele.
Nas ações, a defesa de Felício argumenta que ele “respeita o direito à livre manifestação do pensamento e o direito de ser oposição”, no entanto “não consente e jamais consentirá com atos que consistem em violação aos direitos de honra”.
A assessoria de Felício afirmou que ele “reconhece o debate político, de forma pacífica e leal, como ato significativo para a sociedade, prezando pela democracia”, mas “não consente com ofensas pessoais que afrontam a lei e a moral média do cidadão”.
“O fato de ser pessoa pública não permite que haja desrespeito à sua honra e dignidade. Felício não moveu nenhuma ação na Justiça contra críticas à sua gestão, todas as ações referem-se a postagens que extrapolam o universo da crítica e dizem respeito a ofensas pessoais ou até mesmo preconceito contra deficiência física que ele possui (Felício é estrábico e tem visão monocular)”, afirma em nota.
Na sua terceira eleição, Felício, que é empresário e formado em administração com especialização em gestão pública, declarou R$ 1,43 milhão em bens -valor próximo ao declarado nas eleições de 2016 e 2020, de R$ 1,2 milhão.
O ex-prefeito declarou manter R$ 67 mil em dinheiro em espécie. A assessoria de Felício afirma que “todos seus bens foram apresentados no Imposto de Renda e possuem origem comprovada”.
Atualmente, Felício atua na área de energia como sócio de uma empresa cujo capital social é de R$ 4,8 milhões.
Ele iniciou a carreira como comerciante e sempre manteve a atuação como empresário. Felício assumiu o primeiro cargo público como secretário municipal na gestão do então prefeito Eduardo Cury (PSDB), um dos seus padrinhos políticos, entre 2009 e 2012.
Sua vida partidária, no entanto, começou bem antes, em 1993, quando se filiou ao PSDB por influência de Cury e de Emanuel Fernandes, tucano que também foi prefeito de São José dos Campos.
Felício chegou a presidir o diretório municipal do PSDB e participou das campanhas dos aliados, formando um grupo político coeso na cidade. Em 2021, os tucanos de São José decidiram apoiar Eduardo Leite (RS) e não João Doria (SP) nas prévias presidenciais do partido. Por fim, o ex-prefeito acabou deixando o PSDB.