Quem foi Pagu, autora que revolucionou arte e política e ganha homenagem da Flip
Por FOLHAPRESS em 22/11/2023 às 11:48
Pagu já foi um nome escandaloso, um nome esquecido, um nome resgatado aos pedaços pela cultura pop e usado ao gosto do freguês para falar de feminismo, comunismo ou liberdade sexual. Virou música de Rita Lee e Zélia Duncan e batizou um bloco de Carnaval. Em 2023, Pagu, apelido de Patrícia Galvão, é a homenageada na Festa Literária Internacional de Paraty.
Nascida em 9 de junho de 1910 na cidade paulista de São João da Boa Vista, Galvão ganhou a alcunha quando tinha 18 anos pelo poeta e diplomata Raul Bopp, em 1928. No mesmo ano, ele também teria apresentado a jovem ao casal Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral, expoentes da Semana de Arte Moderna de 1922. O encontro mudaria os rumos da vida de todos eles e do movimento modernista.
Pagu contribuiria com a identidade do movimento ao converter a vanguarda artística em vanguarda política. Lúcia Teixeira, biógrafa de Pagu, publicou neste jornal um artigo em que esclarece o papel politizante de Pagu no movimento de que, inicialmente, seria apenas musa e estandarte da liberdade sexual — e alvo de fofocas, já que Oswald deixou Tarsila para se casar com a jovem escritora.
“Ela e Oswald, ao aderirem ao Partido Comunista, deram tratamento literário à luta ideológica”, escreve a biógrafa.
Pagu publicou em 1933, quando tinha 22 anos, o livro “Parque Industrial”. Assinou com pseudônimo Mara Lobo por imposição do partido de que era militante.
O crítico literário Nelson Ascher enumerou as “várias exceções” a que a obra pertence, sendo “modernista e urbano, marxista e feminista”, “desabusadíssimo na linguagem” e abordando questões que eram tabu tanto para a militância comunista quanto para o leitor burguês — duas categorias em que Pagu se enquadrava.
Esconder a autoria foi apenas uma das exigências do PCB a que Pagu se submeteria. No período em que era militante, foi privada de exercer o jornalismo e se lançou a uma vida precária e a jornadas exaustivas. Depois, como membro de um “Comitê Fantasma”, chegou a ter que se prostituir para conseguir informações para o partido.
A “Autobiografia Precoce” escrita pela autora não foi para se exaltar, mas para tentar explicar quem era a seu segundo marido, Geraldo Ferraz. “Paixão Pagu”, título usado em algumas edições do livro, é uma longa carta em que ela conta sua relação bombástica com Oswald, com o PCB, com o governo de Getúlio Vargas e até com o último imperador da China, Pun-Yi, uma amizade que lhe rendeu sementes de soja quando o vegetal não era cultivado no Brasil.
Teixeira, que lança nesta semana na Flip seu quarto livro sobre a autora, “Os Cadernos de Pagu: Manuscritos Inéditos de Patrícia Galvão”, conta que começou a reunir os cadernos de seu acervo por revelarem sua complexidade e “o quanto ela reviu a sua trajetória, para que, mais uma vez, o público dos estudiosos pudesse dar continuidade ao papel de entender sua dimensão, sua generosidade”.
Desiludida, Pagu foi expulsa do PCB em 1940 por ser dissidente trotskista, depois de quatro anos na prisão. Patrícia Galvão é considerada pela biógrafa a primeira mulher a ser presa política no Brasil, em 1935.
Com Ferraz, seu segundo marido, ela criou o Suplemento Literário do Diário de São Paulo em 1946. Tentou se lançar à política pouco depois, já no Partido Socialista Brasileiro, mas não foi eleita. Nesse período, também traduziu de forma pioneira nomes importantes da literatura como Eugene Ionesco e Octavio Paz. Morreu aos 52 anos de câncer no litoral paulista, em Santos.