Milhares de pessoas deixam praia de lado e enfrentam fila para ver navio gigante
Por Klaus Richmond/Folha Press em 30/01/2023 às 06:00
A autônoma Suelen Moraes, 37, foi só uma das 10.630 pessoas que encararam uma fila de mais de uma hora, sob o sol e intenso calor de 30ºC, como parte de um programa inusitado neste domingo (29) em Santos. Na contramão de outros turistas e moradores do município, ela deixou a praia de lado para subir a bordo do Navio-Aeródromo Multipropósito A140 Atlântico, o maior da Marinha brasileira.
Adquirida em 2018, a embarcação atracada em Santos foi aberta à visitação do público, assim como três fragatas classe Niterói –Defensora, Liberal e Independência. A visita dos quatro navios faz parte das comemorações finais do aniversário de 477 anos da cidade.
A meta de Suelen era simples: tirar a filha de dez anos do tablet, em casa. “Praia, para nós, é algo bem mais comum. Tenho tentado proporcionar passeios de bicicleta e visitas de qualquer tipo para tirá-la da frente do tablet”, disse à Folha. “E como já fomos muitas vezes ao aquário e ao orquidário [locais públicos mais visitados do município], achei o navio uma opção interessante. Mas por ela já teríamos saído da fila antes mesmo de chegar.”
O navio-aeródromo chama atenção pelo tamanho. Possui 203,4 metros de comprimento –equivalente a um prédio de 40 andares–, pesa 21,5 mil toneladas e tem mais de 400 tripulantes e 150 alunos a bordo, além de capacidade para comportar até 1.400 militares quando em missão.
De acordo com a Marinha, o navio também pode transportar até 18 aeronaves em seu hangar e convoo, tanques e outros armamentos de guerra. Antes de ser adquirida, a embarcação foi utilizada pela marinha real britânica. Em seu histórico estão operações de apoio em Kosovo, Serra Leoa, Líbia e Iraque.
“Vim de Itabaiana, no interior de Sergipe, no dia 1º de janeiro, e vou embora em dois dias. Achei uma boa oportunidade antes de ir, mesmo com fila e calor. Nunca vi nada assim”, relata Helenílson da Silva, 40, que passou férias com a família em Santos.
Situação semelhante à da administradora Gisele Rodrigues, 40, moradora da capital paulista, que utilizou a visita ao navio como o ato derradeiro da viagem iniciada na última quarta (25), embalada pelo feriado do aniversário de São Paulo.
“Vim com minha mãe, meu irmão, sobrinhos e filha. Decidimos [visitar] o navio como o último passeio antes do retorno. Daqui é direto para a estrada”, contou.
Curiosidades
Espalhados por diversos pontos da embarcação, oficiais atendiam os visitantes para tirar dúvidas relacionadas às operações da Marinha e ao funcionamento do navio e de armamentos.
“Esse helicóptero é maior do que o Águia [utilizado pela Polícia Militar]?”, questionou o administrador Osmar Batista, 44. “Este comporta até 37 pessoas, com três horas de autonomia”, respondeu um dos tripulantes.
As fragatas, construídas nas décadas de 1970 e 1980, têm a missão de localizar e destruir aeronaves, navios de superfície e submarinos inimigos. São utilizadas normalmente para patrulhas.
Na parte inferior do navio ficaram expostos armamentos. Despertou atenção um míssil superfície-ar portátil Mistral, fabricado pelos franceses e adquirido pela Marinha no início da década de 1990.
Segundo a Força Naval, o item pesa cerca de 40 quilos. Quando há um alvo possível, um alarme sonoro informa a possibilidade de disparo. O míssil é projetado como um foguete, atraído pelo calor do alvo e com um alcance de até 6 km.
“Aqui tudo desperta muita curiosidade. Quando temos algo à disposição, como a praia, se torna comum. Nunca havia subido a bordo de um navio, muito menos militar. Vejo muitas crianças curiosas”, diz a técnica de enfermagem Ana Cristina Rodrigues, 35.
A esquadra formada pelos quatro navios faz parte da Operação Aspirantex 2023, que treina aspirantes da Escola Naval. O Navio-Aeródromo Multipropósito Atlântico possui cinco departamentos: armamento, operações, máquinas, administração e aviação. Ainda neste mês, outra esquadra esteve no porto de Paranaguá, no Paraná.
“As pessoas precisam entender: o que faz a Marinha? Há uma operação contínua de manutenção. Nada fica parado, é uma cidade flutuante que precisa estar pronta. Além, claro, de fiscalizações, simulações”, afirma Robledo de Lemos Costa e Sá, comandante da Capitania dos Portos do Estado de São Paulo.
Durante o período de visitação às embarcações, no próprio Cais da Marinha em Santos, foram arrecadados alimentos não perecíveis para serem distribuídos a entidades assistenciais.
Um dia antes, no sábado (28), a Marinha abriu o navio para visitas guiadas, e cerca de 1.300 pessoas estiveram presentes. Segundo a Capitania dos Portos, em todo o fim de semana foram registrados mais de 12 mil visitantes.