Médium de Santos realiza cirurgias espirituais e promete curar pacientes
Por Roberta Caprile/Colaboradora em 27/09/2014 às 14:41
SANTOS – Os espíritas acreditam que o corpo físico está associado a uma aura formada por elementos químicos desconhecidos que só existem no plano espiritual. As doenças seriam reflexos de alterações nesses elementos, causadas por desequilíbrios morais. Ou seja, para curá-la, um médium encarna o espírito de um médico e assume o tratamento. Como a doutrina espírita não tem práticas homologadas e reguladas, as técnicas cirúrgicas variam de acordo com o médium e o centro espírita. Alguns nem tocam o paciente, outros usam cristais e há ainda os que fazem incisões com aparelhos cirúrgicos.
Felipe Rodriguez Lopez Alvarez, 34 anos, diz operar e curar pessoas sem incisões. Ele exercita o “dom” há 19 anos. “Com 15 anos já vi que era um pouco sensitivo. Mas, aos 21, em um centro espírita que frequentava, uma médium vidente me falou que tinha uma entidade de cura que queria trabalhar comigo, um médico. Não levei muita fé, mas nesse dia incorporei e ele atendeu umas 3 ou 4 pessoas que saíram melhores. De lá pra cá, faço isso sempre”, disse.
Felipe faz operações espirituais. Em uma sala do Espaço Holístico Arcanjo Miguel, localizado em Santos (SP), casa onde trabalha, ele possui quatro macas e duas cadeiras onde as pessoas são atendidas. Frederich Von Steiger, médico alemão que, segundo Felipe, esteve na 2ª Guerra Mundial, é seu mentor espiritual. Durante a cirurgia, a entidade utiliza o corpo do médium para os procedimentos que são feitos sem incisões. Instrumentos como bisturi e tesouras cirúrgicas não afiadas, cristais e panos brancos, são usados.
As operações duram menos de cinco minutos e, ao final de cada procedimento, o paciente recebe uma energização e são receitadas ervas para o tratamento pós-operatório. Felipe diz já ter curado diversos tipos de doenças. “Câncer, hepatite, tuberculose. Essas foram as mais graves. Fora, joelho, coluna, rim. Muitas pessoas que vem aqui. Já salvei de uma cirurgia terrena”, relatou.
Sueli Belini, empresária de 52 anos, se submeteu a uma cirurgia espiritual porque sofria com problema renal. “Senti o corte e senti costurando. Me emocionei muito. No dia seguinte, eu já senti uma grande melhora”, conta a empresária. Sueli já havia realizado três cirurgias com seu médico, Dr. Albert, e foi fazer uma quarta, depois de fazer a espiritual.
Ela sempre recebeu anestesia geral durante as cirurgias. Porém, nessa última deram apenas a anestesia raquidiana, que a deixou consciente. “Ouvia o médico perguntar para os assistentes onde estava a pedra, que ele havia obstruído parte dela, mas que tinha certeza que ainda havia uma bem grande e ele não encontrou mais essa pedra grande. Encontrou só os caquinhos”, finalizou a paciente.
Outro caso é o de Leni Soares Ferreira, 53 anos. A cabeleireira fez uma cirurgia espiritual de intestino aos 21 anos. A operação não foi feita no centro onde Felipe trabalha, mas o procedimento descrito por ela é parecido com o do médium. “Eles me deitaram em uma cama, colocaram panos brancos em cima de mim, levantaram minha blusa e cortaram minha barriga. Não foi um corte real, mas eu senti que estavam cortando. Eles pediram para que todos os dias durante a primeira semana eu, dez horas da manhã, ficasse em um lugar sossegado, de preferência deitada, porque eu receberia uma injeção, e assim eu fiz. Depois dessa semana, quando fui defecar, saiu um pedaço de carne”. Leni diz que a melhora durou 10 anos, mas depois os sintomas voltaram.
O marido de Leni também operou. Brasílio Napoleão Martinez Cueto é analista de sistemas, tem 53 anos e também fez a cirurgia com 21. Ele buscava uma melhora na coluna, mas diz que não a obteve.
Como Leni, muitas pessoas procuram cirurgias espirituais porque não têm condições financeiras para se internarem em bons hospitais particulares. Outro fator é a suposta recuperação rápida, já que o paciente não precisa ficar internado quando é operado por um médium.
Para o médico e cirurgião geral Mohamad Dib Salah Ali, 30 anos, cirurgias espirituais não são seguras. “Tocando na fé da pessoa, ela acredita que está curada, mas na verdade só está retardando o tratamento”. Mohamad usa o câncer como exemplo. Ele diz que alguns tipos da doença não têm sintoma e a pessoa só descobre por um exame de rotina. “Alguém vai lá e diz que curou porque o paciente não tem sintoma. Depois de alguns anos, quando estará mais grave, a pessoa vai descobrir que está com câncer de novo”, explicou o especialista.
Os médicos tradicionais interpretam o sucesso de procedimentos cirúrgicos espirituais como resultado de um condicionamento da mente dos pacientes. De acordo com lei brasileira, cirurgia espiritual pode dar cadeia. Está previsto no Código Penal Brasileiro penas aos adeptos da cirurgia espiritual. O artigo 282 condena a prática ilegal de medicina e, o 283, anúncios de cura por “método secreto ou infalível”. O 284 prevê condenação por curandeirismo “usando gestos, palavras ou qualquer outro meio” e “fazendo diagnósticos”. Na prática, as acusações contra espíritas são raras e as condenações, mais ainda.