Jovem de 22 anos que sonhava em ser médico morre por complicações da covid
Por Bárbara Silva em 08/06/2021 às 06:19
Matheus Lopes de Carvalho sonhava em fazer parte do programa “Médico Sem Fronteiras”. Queria ajudar as pessoas que ninguém mais queria ajudar, como conta a mãe. Mesmo tendo que trancar o cursinho com o início da pandemia da covid-19, ele continuou se dedicando aos estudos em casa. Não queria colocar em risco a saúde da mãe, Katherine, que tem asma e hipertensão, e da avó Guiomar, de 77 anos.
Por isso, evitava ao máximo sair de casa. Não ia a festas, bares, não aglomerava. Em seu perfil no Facebook, aberto ao público, compartilhava notícias sobre a pandemia e conscientizava as pessoas do isolamento social e da vacina. A única vez que saiu foi por extrema necessidade – foi a uma ótica trocar o óculos. Matheus tinha bastante miopia e um grau alto em astigmatismo, e foi e voltou sozinho no banco de trás do transporte por aplicativo. “Ele só saía de casa usando três máscaras, luva e toda a proteção”, lembra a mãe.
No dia 12 de maio, Matheus acordou com dor de cabeça e um pouco de febre. Falou que não era normal. “Eu vou ficar trancado no quarto, pode ser covid”, disse à mãe, ao que ela respondeu: “Como poderia ter algo? Você só fica em casa.”
À noite, ele foi ao hospital Beneficiência Portuguesa, sozinho. Recusou companhia; disse que não queria expor a mãe ao vírus. Tomou medicação e voltou, e no dia seguinte fez o teste em uma clínica, mas que demorava para ficar pronto. No dia 14, quando Matheus voltou a apresentar febre, foi feito o teste rápido, que deu positivo.
Os sintomas
A mãe, Katherine, conta que ele não teve perda de paladar nem apetite, apenas febre e cansaço leve. Quando saiu o resultado positivo, ao voltar para casa, Matheus se isolou novamente. “Ele começou a chorar desesperado. Eu abri a porta do quarto, abracei meu filho, porque não pensava, só abracei ele”, conta. Matheus falava, desesperado, “Eu vou contaminar você e a minha avó, vocês vão morrer, é minha culpa”. Katherine relata que o abraçou novamente, e lhe disse que não era sua culpa. Não saía de casa havia um ano e meio.
A médica que o atendia passava remédio para que ele tomasse em casa. No entanto, todos os dias Katherine precisava voltar com ele para o hospital por conta da falta de ar. Ao filho ser mandado pra casa, ela insistia que a falta de ar estava aumentando.
Internação
No dia 20 de maio, Matheus não conseguia mais andar por conta da falta de ar. Katherine chamou uma ambulância, e a partir daí, ele ficou internado na Casa de Saúde de Santos. Na semana seguinte, por volta do dia 26, a mãe conta que uma fisioterapeuta entrou no quarto e disse que iria fazer um exercício com uma máquina chamada CPAP – um aparelho usado para apneia do sono que envia um fluxo de ar constante para as vias respiratórias do paciente.
“O pescoço dele começou a inchar e ficar vermelho, o peito dele ficou vermelho”, relata Katherine. Ela chamou a enfermeira, que retirou o CPAP, e o médico foi acionado. Em uma tomografia, constatou-se uma fístula na traqueia, que teria sido causada pelo aparelho, e Matheus foi enviado à Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Matheus segurou a mão da mãe, com medo. “Filho, fica tranquilo. Tenha fé em Deus, você vai sair, é novo, nunca ficou doente”, disse. Ela conta que o filho nunca ficou internado e nunca teve problemas de saúde.
Katherine ficou ao lado de Matheus desde que ele deu entrada no hospital, e durante todos os outros dias da internação. “Ele foi pra UTI, e eu não podia mais entrar. Foi a última vez que eu vi meu filho vivo.”
No dia seguinte, ela foi informada que assim que Matheus entrou na UTI, teve de ser intubado. Katherine conta que o médico cirurgião teve que tirar o oxigênio que se espalhou da fístula da traqueia, porque havia se espalhado pelo peito dele e estava comprimindo o coração. Ao inserir o dreno, o oxigênio saiu, e Matheus chegou a ficar estável. “O coração chegou até a cair pra 60, mas depois começou a subir chegou a 85, 90, e a gente cheio de fé e esperança porque meu filho era novo, sem comorbidades, nunca bebeu, nunca fumou, nunca usou droga. Ele era extremamente saudável.”
No último sábado (5), a médica da UTI telefonou para Katherine. O quadro de Matheus havia piorado, e ele teve uma infecção generalizada. Às 4h15 da manhã de domingo (6), Matheus veio a óbito aos 22 anos de idade.
O jovem não tinha mais o vírus no corpo, pois já havia passado bastante tempo desde a infecção. Por isso, a família conseguiu fazer um velório. Ele foi enterrado no jazigo da família, no Cemitério da Filosofia, no Saboó.