Guarda diz ter ficado chocado com atitude de desembargador e recusa desculpas: "Não seria sincero"

Por Rodrigo Martins/#Santaportal em 19/07/2020 às 21:08

SANTOS – O guarda municipal Cícero Hilário, que foi destratado pelo desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), Eduardo Siqueira, ao aplicar uma multa ao desembargador que caminhava sem máscara pela praia de Santos, falou ao #Santaportal sobre a repercussão do caso. Pouco mais de 24 horas após o episódio, o agente revelou que ainda está chocado com a situação e diz como foi a reação de sua família ao ver os vídeos da ocorrência.

Cícero e seu companheiro de GCM, Roberto Guilhermino, faziam a fiscalização para o uso de máscara pela orla quando avistaram o desembargador. ?A gente estava orientando um grupo pelo canal 6, quando de longe gesticulei para que ele usasse a máscara. Ele fez um gesto dizendo que não. Depois, quando o Roberto (Guilhermino, parceiro de GCM) o avistou, o Roberto até comentou que já havia tido um problema anteriormente com ele. Fomos de forma educada fazer a abordagem, ele se recusou a colocar a máscara, dizendo que o decreto não era lei. Falou ainda do episódio anterior, que ele havia sido autuado e jogou a multa na cara do outro guarda?, contou.

As gravações mostram que o desembargador se mostrou contrariado às orientações de Cícero e, logo em seguida, as ofensas começaram. ?Fiquei chateado quando ele perguntou se eu era analfabeto, se eu sabia ler. Ele ainda perguntou se eu tinha visto a carteira dele, se eu sabia com quem eu estava me metendo. Isso foi o que mais me chocou. No meu trabalho, a gente se separa com algumas situações, mas sinceramente eu não esperava isso, ser tratado dessa forma?, desabafou.

O guarda municipal também revelou como foi chegar em casa após esse episódio. Pai de três filhos, Cícero contou que Isabelly, de 15 anos, foi quem ficou mais fragilizada com o episódio. ?Quando eu entrei em casa, minha filha e a minha esposa estavam na sala. A minha esposa disse que elas tinham visto o vídeo. A minha filha logo perguntou o que eu tinha feito para ele? Eu disse que tinha feito o meu trabalho. Eu expliquei tudo o que aconteceu, ela ficou emocionada. Foi difícil ela entender, é algo fora do normal. Mas, depois com a repercussão nas redes sociais, com várias pessoas mandando mensagens positivas para mim, ela entendeu que eu fui um bom exemplo e de que a minha conduta foi correta?, disse.

Cícero admitiu que não esperava que o caso ganhasse uma repercussão tão grande, tanto nas redes sociais quanto na mídia. ?Não sabia dessa movimentação nas redes sociais, não imaginava que isso iria acontecer. Ainda estou surpreso com a repercussão. Até porque não fui eu que tive a ideia de fazer a filmagem, foi meu parceiro, o Roberto, que teve. Mas quero destacar também o apoio dos meus colegas de trabalho. Logo após o ocorrido tive total apoio dos meus colegas, do meu chefe?, detalhou.

Com toda essa repercussão, o agente falou que não conseguiu descansar desde então. ?Teve toda essa repercussão que eu não imaginava, até agora estou sem dormir. Não consigo parar de pensar no que aconteceu, fico pensando em tudo. A gente fica pensando: se eu tivesse outra conduta, ele teria me tratado daquela forma? Não imaginava, até agora estou sem dormir. Não consigo, fico pensando em tudo que repercutiu. A gente fica pensando naquilo, se eu tivesse outra conduta teria me tratado daquela forma??, comentou.

Indagado se perdoaria o desembargador, caso o reencontrasse e houvesse um pedido de desculpas, Cícero disse que não acredita em um arrependimento sincero de Siqueira. ?Eu não aceitaria, porque sei que não seria de coração, seria algo imposto pela repercussão que aconteceu. Acho que não seria um pedido de desculpas sincero. Por enquanto, tenho esse pensamento?, concluiu.

Entenda o caso
Durante força-tarefa da GCM realizada neste sábado, o desembargador Eduardo Siqueira estava sem a máscara obrigatória caminhando pela praia de Santos. A infração prevê multa de R$ 100,00, por descumprimento do decreto nº 8.944, de 23 de abril de 2020, que determina o uso obrigatório de máscara facial.

Segundo informações da Prefeitura, uma equipe da Guarda Civil Municipal (GCM) abordou o magistrado pedindo que o mesmo colocasse a máscara. Diante da recusa de Siqueira, foi lavrada a multa. De acordo com a Administração Municipal, trata-se de um caso de reincidência: o desembargador já foi multado em outra data por cometer a mesma infração.

“Outro dia também me deram uma multa, eu peguei, amassei e joguei na cara dele. Se quiser eu jogo na sua cara também”, falou Siqueira. O guarda responde: “O senhor vai jogar na minha cara? Quero ver o senhor jogar na minha”.

Durante a abordagem da GCM, Siqueira ainda diz para o agente que estava lavrando a multa que iria telefonar para o secretário de Segurança de Santos, Sérgio Del Bel. “Estou aqui com um analfabeto seu aqui, um rapaz. Ele está fazendo uma multa porque tem um decreto.” O magistrado oferece o celular para que o guarda fale com Del Bel, mas o agente recusa.

Após alguns minutos, o desembargador recebe a multa, rasga o papel e o joga no chão, antes de sair caminhando normalmente pela faixa de areia.

A Prefeitura informa ainda que Siqueira também foi multado em R$ 150,00 por jogar lixo no chão, de acordo Lei Cidade sem Lixo, que proíbe o lançamento de resíduos de qualquer natureza nas praias, além de passeios, jardins, logradouros, canais e terrenos.

O secretário de Segurança de Santos, Sérgio Del Bel, informa que deu total apoio à equipe que fez a abordagem e a multa foi lavrada na tarde deste sábado (18). A Prefeitura de Santos afirma ser veemente contra qualquer ato de abuso de poder e, por meio do comando da GMC, dá total respaldo ao efetivo que atua na proteção do bem público e dos cidadãos de Santos.

A Administração Municipal também esclarece que a gestão das praias está sob a competência e responsabilidade do Município. De acordo com o artigo 14 da Lei Federal nº 13.240/2015, a Prefeitura de Santos celebrou, em 19/07/17, termo de adesão com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), por meio do qual a União outorgou ao Município a gestão das praias marítimas urbanas, inclusive bens de uso comum com exploração econômica, pelo período de 20 anos.

Outro lado
O desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), Eduardo Siqueira, falou na noite deste domingo (19) ao Jornalismo do Sistema Santa Cecília de Comunicação sobre o episódio no qual rasgou uma multa aplicada pelo guarda municipal Cícero Hilário, após descumprir o decreto municipal que estabelece o uso de máscaras em Santos.

Por telefone, Siqueira disse que ?todos na cidade o conhecem e sabem sobre sua conduta, que ele não é uma pessoa que costuma mentir?.

O magistrado falou que mora próximo ao canal 5 há anos e criticou a abordagem da Guarda Civil Municipal. Siqueira afirmou que não estava próximo de pessoas enquanto caminhava pela praia e que, em razão disso, não teria problema nenhum em ficar sem máscara naquele momento.

Sobre a abordagem do guarda municipal no episódio de sábado, o desembargador falou que entende muito bem sobre o que é um decreto e que isso não o obriga a usar a máscara, pois não tem força de lei.

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