05/02/2025

'Os Sapos' é filme teatral com as maiores virtudes na direção e no elenco

Por Folha Press em 05/02/2025 às 10:28

Divulgação
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Digamos, para começar, que quando se dá a um filme o título de “Os Sapos” e o filme não vem de Hollywood, o caminho para o fracasso já está percorrido ao menos pela metade.

O peso simbólico do título até ajuda no início a desencadear a trama, embora leve o filme dirigido por Clara Linhart a esbarrar em certos obstáculos na segunda metade.

Começando pela primeira metade. Ali encontramos o casal formado por Luciana, papel de Karina Ramil, e Marcelo, interpretado por Pierre Santos, que vivem em uma casa cercada por beleza: árvores, plantas, rio, montanhas. Um lugar idílico. Meio que por engano, ao local chega Paula, vivida por Thalita Carauta e amiga de Marcelo dos tempos de colégio. Na verdade, explica Marcelo, ele havia marcado um churrasco com toda a turma, mas desmarcou e esqueceu de avisar Paula.

Paula é o primeiro sapo da história, se se descontar o sapo de verdade que apareceu na casa logo na primeira cena. Existe algum desconforto com a presença de alguém que Marcelo não vê há uns 20 anos e que Luciana nunca viu na vida.

O ligeiro mal-estar se desfaz graças à simpatia de todos. Mais amigos chegam. Primeiro, Claudio, interpretado por Paulo Hamilton, o músico; depois Fabiana, papel de Verônica Reis, sua mulher. Algumas coisas começam a se desarranjar. Somos informados de que Marcelo, esse bom rapaz, não divide o aluguel com Luciana. Ela é quem paga a conta. Aliás, o que ele faz, além de frequentar bosques e cachoeiras?

A primeira metade do filme é dedicada ao desenvolvimento dessas personagens. Fora esses ligeiros sinais de desarranjo, o que prevalece são conversas em que conhecemos um pouco mais essas pessoas e elas se dedicam a tornar a convivência o mais agradável possível. De todo modo, já é possível perceber que chegar a isso não será tão fácil. Luciana é meio que deixada um tanto ao largo, enquanto Marcelo passa da recordação dos anos de colégio a uma discreta paquera com Fabiana.

Dito isso, chegamos à segunda parte. Numa conversa a sós, e razoavelmente íntima com Paula, Fabiana fica sabendo que Claudio não é bem quem nós pensávamos. É possessivo, chega a ser violento e tal. Paula, que dizia ter um marido apaixonado, agora já pensa em largar o marido tirânico.

Dessa tirania ele oferece a prova um minuto depois. Manda a mulher para casa e começa a conversar com Fabiana. Conversa vai, conversa vem, agarra a moça e tenta beijá-la na marra. Sabemos então que se trata de um cafajeste de última categoria.

Podemos nos perguntar o que faz um canalha como esse num lugar onde suas oportunidades de exercer a cafajestice são mínimas -assim como de ter sua música ouvida. O fato é que o clima fecha de vez. Claudio não vale nada, nem as caipirinhas que faz são aceitáveis, mas estamos à “huis clos”, de modo que Fabiana nem pode se abrir com os outros.

Quanto ao suave Marcelo, ficamos sabendo que também tem lá seus problemas de caráter. Se pela manhã, no começo do filme, se apresenta como companheiro sólido e carinhoso de Luciana, mais à noite, à luz da fogueira, a sua história vai mudar um pouco.

Além de folgado, ele não tem compromisso algum com Luciana, mas um “relacionamento aberto”, como explica a Fabiana, logo que vê uma chance dar em cima da moça. Ele faz assim talvez porque ela lhe pareça disponível, talvez porque esteja há muitos anos querendo ficar com ela -quem vai engolir, afinal, essa de que esqueceu de avisá-la do cancelamento do churrasco?

Enquanto isso, Luciana está lá, na cozinha, e não gosta nada dessa história. Não importa no que isso vai dar, e sim que, nessa altura, temos duas certezas: uma, que as mulheres estão de um lado e os homens de outro -de um modo mais agressivo ou mais sutil ambos não valem nada. Outra, que a inspiração do roteiro é nitidamente teatral, pois a partir de certo instante as peças começam a se encaixar para melhor estarem ao gosto da roteirista -que no caso é autora da peça teatral que inspira o filme.

Isso vai nortear a evolução de “Os Sapos”, na mesma medida em que serve à simbologia teatral -sapos seria o mesmo que dizer os grilos, quer dizer, elementos que aparecem para desarranjar um arranjo precário, mas satisfatório. Mas vai ao mesmo tempo dar a essa evolução um caráter um tanto mecânico: as peças se encaixam mais para satisfazer a uma ideia prévia do que outra coisa.

Nisso, as maiores virtudes vêm da diretora, que consegue valorizar a paisagem, a natureza, que se manifesta nas montanhas, nos gramados, na cachoeira, no próprio vento. As atrizes também se destacam em relação aos atores, mas isso pode ser creditado ao maior cuidado que o filme dispensa às personagens femininas.

Aos rapazes cabe ser covardes, paqueradores, violentos ou tolos. Às mulheres, com exceção de Fabiana, cabe ser frágeis ou submissas, é verdade, mas têm matizes que os personagens masculinos desconhecem.

Clara Linhart, que codirigiu o “Domingo”, de Fellipe Barbosa, tem um claro sentido da imagem: não é dessas que começa a fazer campo e contracampo a cada vez que alguém abre a boca. Deixa que os diálogos fluam, constrói imagens agradáveis.

No começo parece mesmo que estamos diante de algo próximo de um “conto moral” à maneira de Éric Rohmer. Depois de um tempo, porém, o filme cede à tentação da teatralidade e a evolução torna-se mais convencional. Mesmo assim, o melhor do filme parece vir da direção e do elenco, onde Karina Ramil e Thalita Carauta se destacam.

Os Sapos

– Avaliação Regular
– Quando Estreia quinta (6) nos cinemas
– Classificação 12 anos
– Elenco Thalita Carauta, Karina Ramil, Pierre Santos
– Produção Brasil, 2024
– Direção Clara Linhart

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