Maquiagem, descanso e ar-condicionado: a preparação do cão Pimpão de 'Ainda Estou Aqui'
Por Leonardo Volpato/Folhapress em 03/02/2025 às 10:29
Quem vê o cãozinho Pimpão em “Ainda Estou Aqui“, filme que concorre a três Oscar, algumas vezes deve ter se surpreendido com a convincente “atuação” do bichinho. Porém, o que muita gente não faz ideia é do desafio que é fazer de um animal um bom ator. Dublês, descanso, muitos petiscos, repetição e sala especial com ar condicionado estão por trás da preparação.
Treinadora de Pimpão, que na vida real se chama Ozzy, a profissional In-Coelum Perdigão, 68, conta mais detalhes dos bastidores e de como foi o trabalho para fazer o cãozinho repetir em cena todos os comandos que eram necessários.
Segundo ela, que já ajudou a treinar animais em mais de 20 novelas na Globo e em diversos filmes, o diretor de “Ainda Estou Aqui”, Walter Salles, queria um cachorro que não parecesse um robô em cena. Ele também desejava que o cão aparecesse em duas fases diferentes de idade, ou seja, seria preciso ao menos dois animais para compor o elenco.
Quando Perdigão apresentou filhotes de 4 e 10 meses da raça jack russel terrier, o autor adorou. As gravações começariam num mês específico, mas acabaram sendo adiadas em seis meses. Então, os cães tiveram de ser trocados, já que cresciam com o decorrer do tempo. Os selecionados, em idades diferentes, foram os irmãos Suri e Ozzy, este o cão principal da maioria das cenas.
“O Salles queria um cão com aparência de abandonado, então fizemos uma maquiagem com rímel preto e areia para dar o aspecto de sujeira. E como o diretor não queria usar dois cães, o Ozzy era o titular e havia outros quatro cães bem parecidos que serviam como dublês para marcar algumas cenas e deixar o Ozzy descansar”, conta.
Além disso, o animal passou, literalmente, pelas mãos de todos os atores para que se acostumasse com eles e com as câmeras. Havia um veterinário em todas as cenas -eram duas a cada dia de gravação.
Para evitar o estresse, Ozzy tomava banho sempre após as cenas para tirar a maquiagem e a areia dos pelos e era seco. Depois, descansava numa sala com ar-condicionado especialmente preparada para ele ao lado do set.
Mas ele permanecia o tempo todo por perto para entender o ambiente ao qual estava inserido. Rapidamente, se afeiçoou a todos, principalmente ao ator mirim Guilherme Silveira, 13, que, segundo a treinadora, virou quase seu novo tutor, tamanha a afeição entre os dois.
Ela conta que seu trabalho não está associado aos comandos clássicos de “deita”, “late” e “senta”, e consiste em criar laços afetivos entre atores e cães -com ajuda de petiscos. “Quanto mais natural, melhor. A cena da praia em que o Pimpão chega até uma menina, nós o induzimos a ir até ela com afeto e estímulos de comida”, conta.
“Já uma cena em que Selton Mello está com ele no colo, eu indiquei o jeito correto de tocar no cão da forma que ele se rendesse, e o tom correto de voz. E deu muito certo”, comenta.
Ela também cita mais duas cenas cujo método usado reforça seu estilo de trabalho. Uma delas foi a cena do atropelamento do animal. A especialista afirma que nem entrava no set e que Guilherme, intérprete de Marcelo Rubens Paiva na infância, era o responsável por conduzir o Ozzy com muito afeto. “Apenas com toques e tom de voz, o cão apagou na cena do atropelamento sem a necessidade de dopá-lo ou dar algum remédio”, conta.
Ela completa que o take mais difícil com Ozzy/Pimpão foi a cena em que ele andava sozinho pela praia num plano geral e chegava até a rua. Era arriscado ele fugir e a treinadora não poderia estar perto para não vazar na gravação.
Então, gravou comandos de voz pelo celular e deixou escondido o aparelho com uma atriz figurante que a cada momento ligava o player para que o cão escutasse os comandos. Mais uma cena concluída com sucesso.
No próximo dia 2 de março, tanto “Ainda Estou Aqui” quanto a atriz Fernanda Torres, que interpreta Eunice Paiva, a protagonista da história, concorrem ao Oscar. Ozzy/Pimpão também faz parte dessa conquista, assim como a própria treinadora.
“Eu estou ansiosa como todos os brasileiros, me sinto orgulhosa por fazer parte disso. Uma conquista inédita que seria espetacular. No primeiro dia de filmagens, eu falei a todos que iria para o Oscar”, diz.