Entenda o papel da moda na corrida de Fernanda Torres por um Oscar
Por João Perassolo e Nadine Nascimento/Folhapress em 28/02/2025 às 11:02
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Comentar os looks de Fernanda Torres virou uma obsessão nacional. Na campanha de “Ainda Estou Aqui” para o Oscar, em cada aparição a atriz desfilou um novo vestido ou combinação de peças minimalistas que eram dissecados pelos fãs do filme e pela imprensa, de modo que agora a ansiedade é grande para o que ela vai vestir na cerimônia do prêmio, marcada para o domingo.
Assim como o cinema, moda é construção de imagem, e os looks da artista nas premiações e jantares, montados pelo stylist Antonio Frajado, transmitem uma mensagem não verbal tão poderosa para os fotógrafos como a atuação contida e de poucas palavras de Torres foi para os espectadores do filme de Walter Salles.
Tanto a atriz quanto seu stylist disseram em várias ocasiões que o seu visual não poderia ser maior do que Eunice, a personagem interpretada por Torres. Ele seria então desprovido de excessos, afinal o filme trata de uma tragédia -Eunice enfrenta a prisão e a morte de seu marido pela ditadura. Isso se traduziu em looks sóbrios, em preto, azul ou cores claras, que a atriz combinou com anéis ou brincos discretos.
Essa escolha faz parte de uma tendência de tapetes vermelhos de não pensar apenas nas roupas ou nas grifes, mas nos personagens e enredos dos filmes que os artistas estão divulgando ou concorrendo nas premiações -o chamado “method dressing”.
Os maiores exemplos do uso dessa tendência nos últimos tempos foram as atrizes Margot Robbie e Zendaya. A primeira fez uma espécie de desfile na divulgação de “Barbie”, aparecendo com looks rosa. Já a segunda furou a bolha cinematográfica e ajudou a impulsionar a tendência “tennis core”, que levou a estética das quadras de tênis para as ruas durante a promoção do filme “Rivais”.
Outros signos usados por Fernanda Torres indicam que ela adotou a linguagem da moda falada por Hollywood e que todos esperam ver nos tapetes vermelhos. Modelos da Chanel, Burberry, Bottega Veneta, The Row e Phoebe Philo -essas duas consideradas o auge da elegância e da sofisticação usadas por pessoas cultas-, além de um vestido da Dior desenhado só para ela, sinalizam sua posição ascendente de estrela internacional.
Com a improvável transformação de Torres em ícone fashion, ela foi convidada pela Chanel para ver da primeira fila o desfile da marca na Semana de Moda de Alta-Costura de Paris, em janeiro, ocasião em que usou um vestido-casaco da maison, marca de luxo símbolo da França. À altura, já tinha sido premiada com o Globo de Ouro de melhor atriz de drama.
Alcançar esse status parecia algo distante para uma atriz famosa até então por papéis de comédia desempenhados na TV -como Vani, de “Os Normais”, e Fátima, de “Tapas e Beijos”- e que não parecia ter uma relação íntima com a moda. Em uma das entrevistas após o Festival de Veneza, a atriz chegou a dizer que seu trabalho depois de “Ainda Estou Aqui” “virou maquiagem, cabelo e look”.
Para demarcar seu lugar, Torres e seu stylist fizeram escolhas estratégicas. Ela só desfilou estilistas brasileiros em duas ocasiões e, em ambas, o filme estava no começo de sua ascensão. Em setembro do ano passado, usou um vestido Alexandre Herchcovitch azul em Veneza, do qual o longa saiu com o prêmio de melhor roteiro. No Festival de Toronto, no mesmo mês, apareceu de vestido preto Reinaldo Lourenço.
Conforme o burburinho em torno do filme cresceu, o estilo da atriz se voltou totalmente para marcas internacionais, famosas no mundo todo, seja por quem compra moda de luxo, seja por quem só deseja. As grifes, claro, quiseram se associar a uma atriz de carreira sólida, premiada, que fala várias línguas, escreve livros e não teme discutir a ditadura militar em entrevistas, indicando que apreciam vestir uma profissional também reconhecida por seu intelecto.
Ela passou ainda a estampar capas de revistas. Além da Vogue brasileira, Torres foi capa da The Hollywood Reporter, uma dos principais nos Estados Unidos quando os assuntos são cinema e prêmios como o Oscar. “Fernanda Torres já ganhou”, dizia a manchete. A atriz ainda foi destaque na revista W Magazine, com direito a um ensaio fotográfico elegante.
Sua ascensão fashion faz sentido, levando em conta que as grifes de luxo precisam se vincular à arte e aos artistas para elevarem seus status de fazedores de roupa cara para ricos a participantes do debate cultural do momento. Também tem lógica do ponto de vista de mercado, porque uma aparição de segundos no Oscar atinge muito mais público do que anos de desfiles em semanas de moda.
Agora, às vésperas do prêmio máximo de Hollywood, Torres virou garota propaganda da Arezzo, uma das maiores marcas de calçados e acessórios femininos da América Latina. Em paralelo, há uma grande expectativa a respeito do que a atriz vai vestir no Oscar, no domingo.
Se for algum designer brasileiro, ela vai ter que explicar de quem se trata, caso seja questionada sobre seu look por algum entrevistador no tapete vermelho -uma pergunta comum aos convidados da cerimônia. Caso opte, como tem feito, pelo visual assinado por alguma das casas que moldaram a história da moda, todos saberão do que se trata.